CVM divulga Ofício Circular Anual com esclarecimentos e orientações para companhias abertas, inclusive com relação a aspectos ESG
O Ofício, divulgado anualmente, visa minimizar desvios e reduzir a necessidade de formulação de exigências e aplicação de multas e penalidades às companhias abertas que não observem a regulamentação aplicável
A Superintendência de Relações com Empresas (SEP) da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), divulgou em 7 de março de 2024, o Ofício Circular Anual de 2024 (Ofício), através do qual orienta companhias abertas, estrangeiras e incentivadas nos procedimentos a serem observados no âmbito da divulgação de informações periódicas e eventuais, além de fomentar a divulgação de informações de forma alinhada às melhores práticas de governança corporativa e temas ambientais, sociais e de governança corporativa (ESG).
Pela primeira vez, a SEP incluiu o “Painel de Companhias com Aspectos ASG”, que detalha dados relacionados a aspectos ESG divulgados pelas companhias abertas na última versão entregue dos formulários de referência, relativos ao ano de 2023. Nesse sentido, parte das orientações trazidas pelo novo Ofício objetivam mitigar as dificuldades enfrentadas pelas companhias no primeiro ano de atualizações anuais sob o regime da Resolução CVM nº 80, conforme alterada pela Resolução CVM nº 59, em vigor desde maio de 2022.
Divulgações periódicas e eventuais, e demais orientações
Buscando nortear as companhias abertas, o Ofício compila decisões recentes e relevantes do colegiado da CVM, bem como reflete normativos editados pelo regulador ao longo do último ano. Exemplo disso foi a inclusão de capítulo específico com instruções sobre a regulamentação aplicável ao relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade, com base no padrão internacional emitido pelo International Sustainability Standards Board ‒ ISSB, nos termos da Resolução CVM nº 193, que se tornará obrigatório para todas as companhias abertas a partir de 1 de janeiro de 2026.
No âmbito de divulgações periódicas e eventuais, o Ofício abordou a comunicação sobre demandas societárias, nos termos do Anexo I da Resolução CVM nº 80, trazendo esclarecimentos ao mercado que a divulgação independe da avaliação da administração sobre a caracterização da informação como fato relevante, e tampouco se confunde com divulgação de informações a respeito de processos judiciais, administrativos ou arbitrais nos itens 4.4 a 4.6 do formulário de referência.
Quanto à divulgação periódica das negociações de valores mobiliários de emissão da companhia por seus administradores, nos termos do artigo 11 da Resolução CVM n° 44, o Ofício também esclareceu que, embora não exista previsão expressa na norma, entende-se que a obrigação estabelecida no referido artigo abrange todos os membros dos órgãos citados naquele cargo, inclusive titulares e suplentes.
Outro esclarecimento trazido pelo Ofício foi a inclusão de instruções quanto ao disclosure de políticas de clawback, mecanismo que prevê a recuperação de valores pagos a administradores e colaboradores em caso, por exemplo, de certas práticas antiéticas, violações a políticas ou não permanência pelo tempo acordado. Ressalte-se que a previsão de mecanismos de clawback requer análise também sob a perspectiva trabalhista, uma vez que a legislação prevê uma série de proteções relativas a valores pagos e que tenham natureza salarial.
No âmbito societário, o Ofício também incluiu orientações a respeito dos cuidados aplicáveis a casos em que um acionista que também seja administrador queira votar em proposta de propositura de ação de responsabilidade contra si, trazendo entendimentos do colegiado a partir de consulta sobre o tema. Também com base em decisão do colegiado, o Ofício esclarece que a possibilidade de suspensão de direitos de acionistas exige o cumprimento de três requisitos, quais sejam: ocorrência, em andamento, de descumprimento de obrigação imposta pela lei ou estatuto; possibilidade de cessação do descumprimento, com imediato retorno dos direitos suprimidos; e não ser o direito suprimido considerado essencial, nos termos do artigo 109 da Lei nº 6.404/76.
Ainda, o Ofício trouxe uma alternativa para o cumprimento do disposto no parágrafo 2 do artigo 37 da Resolução CVM nº 81, informando que o emissor pode divulgar a data prevista para a realização da Assembleia Geral Ordinária (AGO) em seu calendário de eventos corporativos, a ser divulgado também por meio do IPE Online, suprimindo a necessidade de comunicado específico, desde que este documento seja apresentado nos 15 primeiros dias do exercício social.
Formulário de referência
Em relação ao formulário de referência, a SEP também incluiu trechos no Ofício com orientações sobre o preenchimento de certos itens, especificamente aqueles trazidos pela Resolução CVM nº 59. Nesse sentido, a SEP esclareceu que, no disclosure relativo a contribuições financeiras a políticos, partidos ou para custear atividade de influência em políticas públicas (item 1.6 “d”), também devem ser consideradas as contribuições realizadas por administrador ou controladores, dado seu potencial de favorecer a respectiva companhia no futuro.
Outra instrução importante decorrente de decisão do colegiado sobre a divulgação de informações sobre processos judiciais, administrativos ou arbitrais (item 4.4) é a confirmação da necessidade de divulgação de processos ainda que em fase de inquérito. Também foram apresentados esclarecimentos adicionais sobre o correto preenchimento do item oito do formulário de referência, em relação à remuneração variável, visando o melhor atendimento aos objetivos de disclosure deste item.
Informações ESG
Além de reforçar os normativos ESG divulgados pela autarquia no último ano – em especial a Resolução CVM nº 193 e a Resolução CVM nº 198, pela primeira vez, a CVM incluiu um painel com informações consolidadas das companhias como anexo ao Ofício. No total, foram 684 companhias apresentando o formulário de referência sob regime de divulgação da Resolução CVM nº 80, sendo que 69,15% estão registradas na categoria “A” e 30,85% na categoria “B”. A partir disso, foram analisados dados relativos a 3,52 milhões de empregados, 3.678 membros de órgãos da administração e 849 membros do conselho fiscal.
De acordo com a CVM, os campos relativos à diversidade, seja cor, raça ou gênero, foram os principais a apresentar preenchimento inadequado e/ou incompleto. Nesse sentido, a SEP esclareceu que, em um primeiro momento, decidiu não questionar as companhias sobre os dados não informados, parcialmente apresentados ou inseridos de forma não estruturada, mas informou que, através de uma revisão da estrutura do FRE online, no sistema Empresas.Net, com a implementação de travas e avisos, alertará as companhias sobre o preenchimento inadequado. Com esse posicionamento, fica claro o olhar cada vez mais atento da CVM, ainda que primeiramente de forma educativa, para um disclosure correto e completo das informações obrigatórias relacionadas a aspectos ESG.
No mais, com o início da obrigatoriedade de divulgação do Relatório de Igualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios pelo Ministério do Trabalho e Emprego a partir de março de 2024, as companhias devem adotar uma visão abrangente sobre o tema de gênero e raça, evitando divergências em documentos contendo informações que se tornarão públicas.
Por fim, a SEP ainda fez uso do Ofício para estimular o envio facultativo das informações sobre pessoas com deficiência (PcD) já a partir de 2024, considerando que, nos termos da Resolução CVM nº 198, as inclusões entram em vigor com obrigatoriedade a partir de janeiro de 2025.
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