CVM passa a exigir divulgação de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade
A CVM editou a Resolução nº 193 que uniformiza o relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade aos padrões internacionais do ISSB, tornando-o obrigatório a partir de 2026
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou, em 20 de outubro de 2023, a Resolução CVM nº 193, que entra em vigor em 1 de novembro de 2023. Em postura pioneira, a CVM torna o Brasil o primeiro país a adotar os padrões do International Sustainability Standards Board (ISSB) para elaboração e divulgação de relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade, pelas companhias abertas, fundos de investimento e companhias securitizadoras.
Com o intuito de tornar práticas brasileiras alinhadas com as mais sofisticadas práticas internacionais de divulgação de informações de sustentabilidade, a CVM elenca na própria norma os princípios que nortearam sua edição, sendo os principais a importância e necessidade de:
- Aumento da transparência, confiabilidade, consistência e comparabilidade das informações divulgadas;
- Estabelecimento de medidas para dar transparência aos riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade que afetam às entidades no mercado de capitais, de forma a contribuir para o desenvolvimento de uma economia sustentável e regenerativa;
- Elaboração de normas para a divulgação das políticas e procedimentos adotados pelas entidades para o enfrentamento e mitigação dos impactos das mudanças climáticas, dos riscos sociais e ambientais.
O ISSB foi criado pela IFRS Foundation, organização internacional responsável por desenvolver os padrões contábeis mais amplamente aceitos no mundo, em novembro de 2021, na ocasião da COP26, com o objetivo de elaborar uma referência global e de alta qualidade para divulgações de sustentabilidade focadas nas necessidades dos investidores e dos demais agentes dos mercados financeiros. Em junho de 2023, o ISSB divulgou os seus primeiros standards, o IFRS 1 (padrão para divulgação de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade) e o IFRS 2 (padrão para divulgação de informações relacionadas ao clima), construídos sobre as já conhecidas recomendações da Task Force on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD) e os standards da Sustainable Accounting Standards Board (SASB).
A CVM, mesmo antes da efetiva internalização e compatibilização do IFRS 1 e IFRS 2 com a regulamentação brasileira, atualmente em curso pelo Comitê Brasileiro de Pronunciamento de Sustentabilidade (CBPS), ao aprovar a Resolução nº 193 estabelece a data de divulgação, forma e público-alvo de tais obrigações.
Entretanto, para fins de análise de impacto regulatório sobre as novas obrigações, conforme previsto no Decreto nº 10.411/2022, a CVM realizará consulta pública quanto às normas do ISSB, a serem traduzidas e aprovadas pelo CBPS no âmbito da sua incorporação ao ordenamento pátrio, com o objetivo de coletar informações sobre os efeitos, desafios e benefícios de sua adoção. A consulta pública ainda não tem data definida, mas deverá iniciar em breve, tendo em vista os prazos de adoção dos padrões conforme previstos na Resolução nº 193.
A nova regra acompanha recente recomendação da International Organization of Securities Commissions (IOSCO), que busca harmonizar a divulgação de informações de sustentabilidade, principalmente no que trata da avaliação de riscos e oportunidades, promovendo um arcabouço global efetivo e proporcional e um ambiente internacional de interoperabilidade.
Critérios de adoção e início da divulgação
A adoção desse padrão será facultativa a partir dos exercícios sociais iniciados em, ou após, 1 de janeiro de 2024, pelas companhias abertas, fundos de investimento e companhias securitizadoras, ficando autorizada a utilização das flexibilizações (reliefs) previstas pela norma internacional neste período. Especificamente para companhias abertas, seja na categoria A ou B, a divulgação de relatórios em português, adequados aos padrões emitidos pelo ISSB, torna-se obrigatória a partir dos exercícios sociais iniciados em, ou após, 1 de janeiro de 2026.
No caso de adoção voluntária dos padrões ISSB, deve ser divulgado comunicado ao mercado indicando o exercício social de início da sua observância. Para companhias abertas, deve ser indicado o exercício social de início da adoção voluntária, preferencialmente até 31 de maio de 2024, limitada esta opção, ou sua revisão, até 31 de dezembro de 2024. Para fundos de investimento e companhias securitizadoras, a opção deve ser declarada até o final do exercício social anterior à primeira elaboração e divulgação do relatório adequado aos padrões ISSB.
A entidade que optar pela adoção voluntária, deve utilizar as normas de divulgação de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade, conforme emitidas na língua inglesa pelo ISSB, até que o processo de internalização das referidas normas na jurisdição brasileira seja concluído.
Periodicidade e forma de divulgação
A Resolução nº 193 prevê, também, que a periodicidade de reporte do relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade deve ser, no mínimo, igual a das demonstrações financeiras de encerramento de exercício social. Dessa forma, a divulgação deve ser realizada: na adoção voluntária e no primeiro exercício social de adoção obrigatória, na mesma data de entrega do Formulário de Referência; e a partir do segundo exercício social de adoção obrigatória, em até três meses contados do encerramento do exercício social ou na mesma data de envio das demonstrações financeiras, o que ocorrer primeiro.
Apesar de o ISSB ter sido elaborado para divulgação no mesmo pacote de reporte das demonstrações financeiras, a Resolução nº 193 estabelece que o relatório com base no padrão do ISSB deve ser apresentado de forma segregada das demais informações da entidade e das demonstrações financeiras, e arquivado por meio de sistema eletrônico disponível na página da CVM na rede mundial de computadores.
Asseguração por auditor independente
A Resolução nº 193, por fim, prevê que o relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade deve ser objeto de asseguração por auditor independente registrado na CVM, em conformidade com as normas emitidas pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), sendo que, até o final do exercício social de 2025, aplica-se a asseguração limitada, e, a partir dos exercícios sociais iniciados em, ou após, 1 de janeiro de 2026, a asseguração razoável, que exige um processo mais criterioso pelos auditores.
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