Coronavírus e aspectos tributários: alternativas para enfrentar a crise nas empresas
Diante do cenário de calamidade pública, empresários podem postular medidas, no âmbito judicial ou administrativo, para atenuar os problemas financeiros
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Com o aumento de casos confirmados do novo coronavírus (Covid-19) no Brasil, as medidas adotadas até o momento podem se mostrar insuficientes para impedir os inevitáveis efeitos colaterais gerados pelo atual cenário de calamidade pública.
Nesse contexto de intensa comoção social, é intuitivo que o cumprimento das mais diversas obrigações tributárias poderá ser prejudicado, sujeitando os contribuintes à perda de prazos administrativos e aplicação de penalidades. É também previsível que a diminuição da atividade econômica afetará a geração de receitas das empresas, igualmente comprometendo o adimplemento das obrigações tributárias.
Com base nesse cenário, entendemos ser possível à empresa postular, em juízo ou administrativamente:
1. Suspensão de prazos de processos administrativos tributários: a legislação processual determina que o processo judicial é suspenso por motivo de força maior. Embora a União tenha publicado a Portaria RFB 543/2020, em 23 de março de 2020, suspendendo os prazos dos processos administrativos até 29 de maio de 2020, alguns Estados e Municípios continuam a dar andamento a tais procedimentos, o que pode ser objeto de questionamento.
2. Suspensão dos prazos de encaminhamento de débitos para inscrição em Dívida Ativa e CADIN: dentre as recentes medidas adotadas para a suspensão de atos de cobrança, não houve qualquer menção à suspensão dos prazos de encaminhamento de débitos para inscrição em Dívida Ativa e CADIN; situações que têm o condão de impactar sensivelmente o valor dos débitos e comprometer a regularidade fiscal do contribuinte.
3. Afastamento das penalidades e encargos em razão do atraso no pagamento de tributos e cumprimento de obrigações acessórias: a jurisprudência dos Tribunais Superiores sinaliza que evento decorrente de força maior é hipótese excludente de responsabilidade tributária, o que poderia ser arguido para diferimento das obrigações tributárias principal e acessória e afastamento de penalidades.
4. Compensação de créditos oriundos de períodos anteriores ao e-Social com débitos previdenciários posteriores ao e-Social: créditos de períodos anteriores ao e-Social decorrentes de ação judicial (como de exclusão do ICMS da base de cálculo dos PIS/COFINS) tornam-se certos, líquidos e exigíveis com o trânsito em julgado. A interpretação menos restritiva da regra em momento de retração da arrecadação mostra-se viável à luz da razoabilidade, do interesse público e do não confisco.
5. Reconhecimento do direito de não recolhimento do IPTU durante a imposição de restrições ao funcionamento dos estabelecimentos comerciais: a incidência do IPTU deveria ser afastada neste período, uma vez que o requisito do uso/gozo relativo à propriedade em sua plenitude (materialidade do tributo) estaria prejudicado, conforme já reconhecido pelos Tribunais Superiores.
6. Afastamento de tributos incidentes sobre a remuneração em caso de ausência de prestação de serviços: por razões de força maior ou por imposições das autoridades públicas, trabalhadores estão afastados, mas continuam recebendo total ou parcialmente suas remunerações. A incidência das contribuições sobre rendimentos do trabalho, nas hipóteses de afastamento parcial ou total do trabalhador, poderia ser questionada, especialmente nos casos de licença remunerada com pagamento de 100% das remunerações (hipótese distinta das recém vinculadas na Medida Provisória 927/2020, que prevê hipóteses de afastamento sem remuneração ou com remuneração parcial).
7. Reconhecimento do direito de não retenção do IR/Fonte e IOF no resgate de aplicação financeira: situação aplicável para empresa que possua crédito acumulado de outros tributos passíveis de compensação. A legislação não veda a possibilidade de compensação de tributos retidos na fonte, seja o IR/Fonte ou até mesmo o IOF.
8. Desoneração de bens e serviços indiretamente relacionados com o combate do coronavírus: a União desonerou bens de uso médico-hospitalar do imposto de importação e do imposto sobre produtos industrializados. Outros bens e serviços contratados pelas empresas, tais como serviços de tecnologia para home office, também mereceriam igual desoneração.
9. Apropriação de créditos escriturais de PIS/COFINS no contexto do coronavírus: em razão da nova realidade, determinados insumos passaram a evidenciar com mais intensidade os requisitos da essencialidade e relevância, tais como o marketing eletrônico e serviços de tecnologia, o que justificaria a apropriação dos respectivos créditos.
10. Levantamento de depósitos judiciais e/ou sua substituição por outras modalidades de garantia: em regra, o levantamento de depósitos judiciais só é permitido após o trânsito em julgado da respectiva ação judicial. No entanto, existem precedentes permitindo o levantamento de depósitos antes do desfecho da ação, em hipóteses de grave situação econômica do contribuinte. A atual crise pode ser fundamento importante para se formular tal pedido, considerando os graves efeitos econômicos advindos desse cenário de calamidade pública.
11. FAP/CAT: desobrigar empresas da emissão de CAT por afastamento por Covid-19, dado que muitas estão fechadas. Não permitir que afastamento por Covid-19 impacte o FAP, dado que não é mal causado pelo trabalho.
12. Revisão de PLR: revisar planos de PLR para adequar metas e assim manter possível pagamento a empregados, ou rever os termos para garantir que exista cláusula de força maior que permita ajustes.
13. Revisão de Incentivos de Curto e Longo Prazo de Executivos: revisar metas e condições de pagamento dos incentivos, para adequar ao novo cenário, alongando-se períodos de apuração e pagamento.
O escritório Mattos Filho acompanha de perto todas as medidas que estão sendo implantadas durante o período de pandemia, e nossos sócios da prática Tributária estão à disposição para informações adicionais.