STJ decidirá sobre revisão de medidas de indisponibilidade de bens em ações de improbidade
A tese a ser firmada terá caráter vinculante e deverá ser reproduzida pelos órgãos do Poder Judiciário
Em vigor há quase três anos, a interpretação sobre as mudanças promovidas pela Lei nº 14.230/2021 no regime de responsabilização por atos de improbidade administrativa regulado pela Lei nº 8.429/1992 ainda não é pacífica nos tribunais nacionais. Não são raros os exemplos de controvérsias judiciais que surgiram em razão dessas mudanças. A mais recente delas está relacionada à afetação do tema nº 1.257 pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidirá sobre “a possibilidade ou não de aplicação da nova lei de improbidade administrativa (Lei 14.230/2021) a processos em curso, iniciados na vigência da Lei 8.429/1992, para regular o procedimento da tutela provisória de indisponibilidade de bens, inclusive a previsão de se incluir, nessa medida, o valor de eventual multa civil”.
Em sua redação original, a Lei n° 8.429/1992 fazia menção à possibilidade de decretação judicial de indisponibilidade de bens dos réus por atos de improbidade administrativa, estabelecendo que a medida recaia “sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito” (art. 7º, parágrafo único). O texto legal não era explícito sobre os limites e requisitos da medida de indisponibilidade de bens — sobretudo se ela também poderia abranger a multa civil.
Ainda à luz da legislação antiga, o STJ enfrentou essas questões, fixando entendimento pela possibilidade de que a indisponibilidade de bens abrangesse o valor de eventual multa civil aplicável, bem como pela desnecessidade de comprovação de risco de dilapidação ou ocultação patrimonial para o deferimento da medida (temas nº 701 e 1.055 dos recursos especiais repetitivos).
Com a amadurecimento do regime de responsabilização por atos de improbidade administrativa, o legislador decidiu aprimorar o regramento legal aplicável, o que foi feito por intermédio da Lei nº 14.230/2021. Assim, a Lei nº 8.429/1992 passou a estabelecer que a medida de indisponibilidade de bens somente pode ser deferida “mediante a demonstração no caso concreto de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo, desde que o juiz se convença da probabilidade da ocorrência dos atos descritos na petição inicial com fundamento nos respectivos elementos de instrução, após a oitiva do réu” (art. 16, § 3º). Ainda, previu que a ordem de indisponibilidade fica limitada aos “bens que assegurem exclusivamente o integral ressarcimento do dano ao erário, sem incidir sobre os valores a serem eventualmente aplicados a título de multa civil ou sobre acréscimo patrimonial decorrente de atividade lícita” (art. 16, § 10).
Divergências no STJ
Essas inovações podem ser interpretadas como uma intenção do legislador de promover a superação do entendimento jurisprudencial até então adotado pelo STJ. Promulgada a lei que introduziu essas inovações, o STJ passou a se deparar com casos nos quais os réus defenderam a aplicação retroativa da Lei nº 14.230/2021, o que exigiria a revisão de ordens de indisponibilidade de bens deferidas sob a égide da redação antiga da Lei nº 8.429/1992. A jurisprudência divergiu. Alguns julgados negaram a “retroatividade quanto às normas de cariz processual alteradas pela Lei nº 14.230/2021” (AgInt no REsp n. 2.035.380/PR), ao passo que outros decidiram que “a norma mencionada deve ter aplicação imediata ao processo em curso” (AgInt no AREsp n. 2.272.508/RN ).
Agora, com a afetação do tema nº 1.257, o STJ deve uniformizar seu entendimento sobre a matéria. A tese a ser firmada terá caráter vinculante e deverá ser seguida pelos demais instâncias ordinárias, incluindo Tribunais de Justiça e Regionais Federais — inclusive com a possibilidade de revisão dos temas nº 701 e 1.055. A tese será fixada pela 1ª Seção do STJ. O relator, ministro Afrânio Vilela, determinou a suspensão do processamento de todos os processos, individuais ou coletivos, nos quais tenha havido a interposição de recurso especial ou de agravo em recurso especial sobre o tema e que estejam em tramitação no segundo grau ou no STJ.
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