STF firma teses sobre o fornecimento de medicamentos não incorporados pelo SUS
Teses foram fixadas pelas Súmulas Vinculantes nº 60 e 61
O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, em setembro de 2024, o julgamento do RE nº 1.366.243 e do RE nº 566.471, ambos com repercussão geral, que discutem, respectivamente, a legitimidade passiva da União nas demandas sobre o fornecimento de medicamentos registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas não incorporados no Sistema Único de Saúde (SUS); e o dever do Estado de fornecer medicamentos não incorporados no SUS, independentemente de seu valor.
Como resultado, foram firmadas as seguintes teses:
Recurso | Tese | Status |
RE nº 1.366.243 (Tema 1234) | O pedido e a análise administrativos de fármacos na rede pública de saúde, a judicialização do caso, bem ainda seus desdobramentos (administrativos e jurisdicionais), devem observar os termos dos três acordos interfederativos (e seus fluxos) homologados pelo Supremo Tribunal Federal, em governança judicial colaborativa, no tema 1.234 da sistemática da repercussão geral (RE 1.366.243) | Fixada pela Súmula Vinculante nº 60 |
RE nº 566.471 (Tema 6) | A concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, deve observar as teses firmadas no julgamento do Tema 6 da Repercussão Geral (RE 566.471) | Fixada pela Súmula Vinculante nº 61 |
Confira, abaixo, as considerações sobre o Tema 1234 e sobre o Tema 6:
Recurso Extraordinário n° 1.366.243 (Tema nº 1234)
A legitimidade passiva da União nas demandas sobre o fornecimento de medicamentos não incorporados pelo SUS já foi discutida, previamente, pelo STF no âmbito do RE 855.178 que resultou, em 16 de abril de 2020, no julgamento do Tema nº 793 que fixou a tese de repercussão geral de que: “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”.
Neste contexto, o julgamento do RE nº 1.366.243 discute a repartição de competências entre o Estado de Santa Catarina e a União para o fornecimento de medicamento não incorporado no SUS, sendo determinado, por meio do Tema nº 1234, também de repercussão geral, a tese de que:
- Para medicamento não incorporado no SUS, a Justiça Federal é competente quando o valor do tratamento anual for igual ou superior a 210 salários-mínimos. Nesse caso, os respectivos custos deverão ser integralmente assumidos pela União. Na hipótese de condenação dos Estados e do Distrito Federal, a União deverá ressarci-los, via repasses Fundo a Fundo;
- Já para os medicamentos incorporados no SUS, a competência judicial e a forma de ressarcimento observarão o fluxo administrativo e judicial negociado nos termos de acordo celebrado entre os Entes Federativos;
- Para fins de análise e de resolução administrativa e de controle judicial, os Entes Federativos, em conjunto com o Poder Judiciário, implementarão uma plataforma nacional que centralizará todas as informações relativas às demandas administrativas e judiciais de acesso aos medicamentos incorporados e não incorporados no SUS.
Importante mencionar que o Tema nº 1234 não abarcou na discussão o fornecimento de produtos de saúde, tais como órteses e próteses e equipamentos médicos, bem como procedimentos terapêuticos, em regime domiciliar, ambulatorial e hospitalar.
Em 20 de setembro de 2024, foi publicada no Diário Oficial da União a Súmula Vinculante nº 60:
“O pedido e a análise administrativos de fármacos na rede pública de saúde, a judicialização do caso, bem ainda seus desdobramentos (administrativos e jurisdicionais), devem observar os termos dos três acordos interfederativos (e seus fluxos) homologados pelo Supremo Tribunal Federal, em governança judicial colaborativa, no tema 1.234 da sistemática da repercussão geral (RE 1.366.243)”.
Recurso Extraordinário nº 566.471 (Tema nº 6)
O RE nº 566.471 discutia, inicialmente, o dever do Estado de fornecer medicamento de alto custo a portador de doença grave que não possui condições financeiras para comprá-lo. No entanto, a discussão foi ampliada para o dever do Estado de fornecer medicamento não incorporado pelo SUS independente de seu valor.
Sobre essa mesma temática, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 04 de maio de 2018, já havia decidido, por meio do Tema Repetitivo nº 106, que a concessão dos medicamentos não incorporados pelo SUS exige o cumprimento cumulativo dos seguintes requisitos:
- Comprovação, por meio de laudo médico, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia do tratamento;
- Incapacidade financeira do paciente;
- Existência de registro do medicamento na Anvisa.
No mesmo sentido, agora no âmbito do RE nº 566.471, que resultou no Tema nº 6, o STF definiu a tese de repercussão geral no sentido de que, excepcionalmente, é possível a concessão judicial de fornecimento de medicamento não incorporado no SUS, desde que observada, cumulativamente, as seguintes exigências:
- Negativa do fornecimento do medicamento por meio da via administrativa;
- Ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec);
- Impossibilidade de substituição do tratamento por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas;
- Comprovação da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do medicamento, com base em evidências (isto é, ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise);
- Imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo médico;
- A incapacidade financeira do paciente.
Em 03 de outubro de 2024, foi publicada no Diário Oficial da União a Súmula Vinculante nº 61:
“A concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, deve observar as teses firmadas no julgamento do Tema 6 da Repercussão Geral (RE 566.471)”.
Implicações das teses do STF
O julgamento do Tema 1234 foi encerrado em 14 de setembro de 2024, e o julgamento do Tema 6 foi encerrado em 26 de setembro de 2024.
Foram opostos embargos de declaração em 23 de setembro de 2024 para o Tema 1234, e ainda cabem embargos de declaração para o Tema 6.
O entendimento fixado pelo STF terá aplicação direta às partes envolvidas nos processos julgados, bem como terá caráter vinculante por serem julgados com repercussão geral.
Os efeitos práticos desses julgamentos deverão ser acompanhados, em especial, a aplicação das mencionadas teses nas ações judiciais que tramitam sobre esses temas.
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