

Governo Federal ajusta IOF por decreto e altera tributação financeira via MP
Decreto nº 12.499 e MP nº 1.303 ajustam IOF e redefinem tributação financeira, impactando investimentos, incluindo renda fixa, bolsa, fundos, criptoativos e JCP
Assuntos
O Governo Federal publicou, na noite de 11 de junho de 2025, o Decreto nº 12.499 e a Medida Provisória nº 1.303, trazendo relevantes alterações nas regras tributárias brasileiras.
O decreto revogou e substitui o texto nº 12.466, de 22 de maio de 2025 e nº 12.467, de 23 de maio de 2025, que tratavam das regras de cálculo do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), reproduzindo a maior parte de seus dispositivos, com algumas mudanças pontuais.
Já a Medida Provisória nº 1.303 estabelece um novo marco para a tributação sobre rendimentos financeiros, tratando de diversos temas como aplicações em renda fixa, ganhos líquidos em bolsa, fundos de investimentos, derivativos, títulos incentivados, criptoativos, além de majorar a tributação aplicável para instituições de pagamento e para a distribuição de juros sobre o capital próprio (JCP).
As medidas foram inicialmente anunciadas pelo Governo Federal como contrapontos para compensar os efeitos orçamentários de um possível recuo na majoração do IOF publicada no final de maio. No entanto, nota-se que o recuo na majoração do IOF não foi integral e houve nova majoração de IOF/Títulos para aportes em FIDC que não havia sido contemplada no decreto anterior. Por sua vez, as medidas compensatórias foram bastante extensas e de grande impacto.
Confira abaixo algumas das principais mudanças trazidas por estes dispositivos:
Decreto 12.499: revogações e alterações nas regras do IOF
- Alíquota Adicional do IOF sobre Operações de Crédito – redução da alíquota adicional aplicável no caso de operações de crédito para pessoas jurídicas, de 0,95% para 0,38%. No entanto, foi mantida a alíquota diária de 0,0082%, mesmo patamar que já era previsto nas operações com pessoas físicas, mas o dobro das alíquotas previstas para as pessoas jurídicas que, anteriormente ao Decreto 12.466, eram de 0,0041%;
- Forfait ou Risco Sacado – foi mantida a previsão de incidência do IOF/Crédito sobre operações de antecipação de pagamentos a fornecedores (“forfait” ou “risco sacado”), que é passível de discussão judicial. No entanto, tais operações passam a ser isentas da alíquota adicional de 0,38%, ficando sujeitas apenas à alíquota diária de 0,0082%. Adicionalmente, foi retirada a previsão de que o contribuinte do imposto seria o “devedor”, sendo mantida apenas a responsabilidade de recolhimento pela instituição financeira, o que parece deslocar para o fornecedor/ cedente do crédito o papel de contribuinte antes atribuído impropriamente ao devedor/ sacado;
- Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) – foi introduzida a cobrança de IOF/Títulos à alíquota de 0,38% sobre a aquisição primária de cotas de FIDC, inclusive por instituições financeiras, excetuando aquisições realizadas até 13 de junho de 2025 e operações no mercado secundário.
- Operações de Câmbio – estabelecida alíquota zero de IOF/Câmbio para liquidações de câmbio para retorno de recursos investidos por investidor estrangeiro em participações societárias no país, que estavam sujeitas à alíquota de 0,38% até a publicação do Decreto 12.466, que as havia majorado para 3,5%, seguindo a regra geral da alíquota aplicável aos câmbios para remessas de recursos ao exterior. No entanto, foi mantida a majoração de todas as demais alíquotas, incluindo a alíquota geral para a remessa de recursos para o exterior, e a alíquota aplicável ao ingresso recursos para empréstimos externos com prazo inferior a 364 dias, ambas fixadas em 3,5%;
- Seguros de Vida com Cobertura por Sobrevivência – foram estabelecidos novos limites e critérios para isenção do IOF/Seguros para as pessoas físicas nos aportes em VGBL. Aportes realizados por pessoa física, entre 11 de junho de 2025 e 31 de dezembro de 2025, ficam isentos até o limite de R$ 300.000,00 (em uma mesma seguradora); e, a partir de 1º de janeiro de 2026, passa a valer o limite anual de aportes de até R$ 600.000,00 (ainda que em seguradoras distintas). Acima desses limites, aplica-se a alíquota de 5%. Aportes feitos por empregador pessoa jurídica para custeio de planos de seguro de vida de empregados permanecem isentos. O Decreto 12.466 havia majorado de 0% para 5% a alíquota aplicável aos aportes superiores a R$ 50.000,00 por mês, ainda que em planos de seguradoras distintas;
- Vigência – as novas regras entram em vigor na data da sua publicação.
MP 1.303 – alterações na tributação da renda sobre rendimentos financeiros e outros
Pessoas Físicas – rendimentos de aplicações financeiras
-
- Tributação: passam a ser tributados à alíquota geral de 17,5% pelo Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), sendo informadas de forma segregada na Declaração de Ajuste Anual (DAA). Com isso, a MP revoga a sistemática de alíquotas regressivas de 22,5% a 15% conforme o prazo da aplicação e o sistema de tributação exclusivo de fonte atualmente vigentes. Embora na sistemática proposta o IRRF passa a ser uma antecipação do imposto devido na DAA, tais rendimentos passam a ser declarados de forma segregadas e sujeitos ao IRPF à alíquota de 17,5%. Adicionalmente, a alíquota de 17,5% passa a ser aplicável também às aplicações financeiras no exterior e às aplicações em ativos virtuais;
- Compensação de perdas: perdas comprovadas em aplicações financeiras podem ser compensadas com outros rendimentos da mesma natureza, dentro da DAA, por até cinco anos. Perdas realizadas até 31 de dezembro de 2025 seguem a legislação anterior. Por fim, não é permitida a compensação de perdas em operações de mútuo de recursos financeiros.
Pessoas Físicas – ganhos líquidos em bolsa e balcão organizado
- Ganhos líquidos: o regime de ganhos líquidos permanece aplicável às operações realizadas em bolsa ou no mercado de balcão organizado, tendo sido esclarecido que tais operações devem ser consideradas como aquelas cursadas em “sistemas centralizados de negociação que possibilitem o encontro e a interação de ofertas de compra e venda de valores mobiliários e garantam a formação pública de preços, administrados por entidade autorizada pela Comissão de Valores Mobiliários”;
- Operações realizadas no mercado de liquidação futura fora de bolsa, permanecem sujeitas ao regime de ganhos líquidos. Operações de Swap passam a se sujeitar à sistemática de ganhos líquidos deixando de ser tributadas pelas mesmas regras aplicáveis a operações de renda fixa;
- Adicionalmente a MP incorpora em seu texto muitas previsões constantes em instrução normativa, incluindo a interpretação corrente da Receita Federal no sentido de que as operações realizadas em bolsa envolvendo títulos de renda fixa não estão sujeitas à sistemática de ganhos líquidos;
- Majoração da Alíquota: passam a ser tributados à alíquota geral de 17,5%, com apuração trimestral, tendo sido mantida a isenção para vendas de ações em bolsa até R$ 60.000,00 por trimestre, simplificando a apuração em comparação ao regime atual que é mensal, com isenção para operações de até R$ 20.000,00;
- Compensação de perdas: perdas permanecem integralmente compensáveis no período de apuração em que realizadas, tendo sido instituído um limite de compensação para os cinco períodos de apuração posteriores. A MP inova ao permitir que as perdas apuradas a partir de 1º de janeiro de 2026 que não possam ser compensadas com ganhos nas operações de mesma espécie sejam compensadas com outros rendimentos de aplicações financeiras. Perdas realizadas até 31 de dezembro de 2025 seguem regras antigas e só podem ser compensadas com ganhos líquidos da mesma natureza.
Empréstimo de títulos e valores mobiliários
Novas Regras: a MP aperfeiçoa as regras aplicáveis às operações de empréstimos de ações e outros títulos e valores mobiliários, ajustando assimetrias e imperfeições presentes nas regras atuais.
Tributação de ativos virtuais
- Aplicação: ganhos líquidos auferidos em operações com ativo virtual, incluindo operações em que os ativos virtuais estejam sob custódia do próprio contribuinte residente no país, com chaves ou códigos que possibilitem, sem intermediário, acesso ao seu controle; bem como operações com ativos virtuais legalmente enquadrados como aplicações financeiras no exterior;
- Pessoas físicas: ganhos e rendimentos tributados à alíquota de 17,5%, com apuração trimestral e possibilidade de compensação de perdas em até cinco períodos anteriores. Perdas realizadas a partir de 2026 só podem ser compensadas com ganhos em ativos virtuais, não com outros rendimentos financeiros;
- Pessoas jurídicas no lucro real, presumido ou arbitrado: ganhos integram a base de cálculo do IRPJ e CSLL, vedada a dedução de perdas.
Aplicações incentivadas
Majoração de alíquota – rendimentos produzidos por títulos como LCI, CRI, CRA, CDA/WA, CDCA, LCA, CPR, LIG, LCD, debêntures incentivadas (projetos de infraestrutura prioritários), bem como s rendimentos nas aplicações em FI-Infra, FIP-IE, FII/FIAGRO (isentos), quando pagos para investidores pessoas físicas, que atualmente estão sujeitos ao IRRF à alíquota zero, passam a ser tributados à alíquota de 5%. A majoração de alíquota aplica-se apenas para rendimentos produzidos por títulos (inclusive cotas de fundos de investimento) emitidos e integralizados a partir de 31 de dezembro de 2025, tendo sido preservada a alíquota zero para o estoque.
Fundos de investimento
- Regra geral – os rendimentos auferidos pelos cotistas em aplicações em fundos de investimento ficam sujeitos ao IRRF à alíquota de 17,5%. Esta alíquota é aplicável de maneira uniforme aos fundos sujeitos ou não ao regime de come-cotas. Com isso, a alíquota aplicável aos rendimentos distribuídos por FIP, FIDC, FIA e ETF foi majorada para 17,5%, enquanto os fundos sujeitos ao come-cotas, deixaram de ser tributados pelas alíquotas regressivas de 22,5% a 15%, a depender da composição de carteira e prazo do investimento e passaram a se sujeitar ao IRRF à alíquota uniforme de 17,5%, mantida a tributação periódica em maio e novembro;
- Fundos Imobiliários (FII) e Fundos do Agronegócio (Fiagro) – os rendimentos distribuídos aos cotistas pessoas físicas residentes por FII e Fiagro, cujas cotas sejam negociadas exclusivamente em bolsa ou mercado de balcão organizado, ficam sujeitos à retenção de IRRF à alíquota de 5%, desde que o fundo possua, no mínimo, 100 cotistas. Não se aplica a alíquota de 5% ao cotista pessoa física titular de cotas que representem 10% ou mais do total do fundo, ou que receba mais de 10% do total de rendimentos, nem ao conjunto de pessoas físicas ligadas que detenham 30% ou mais das cotas ou recebam mais de 30% dos rendimentos. O fundo tem até 180 dias da primeira integralização para atingir o número mínimo de cotistas e, caso perca esse requisito, tem 30 dias para regularizar. Tais requisitos são os atualmente aplicáveis para a isenção do cotista pessoa física e passam a ser aplicáveis para a tributação pelo IRRF de 5%, ao invés da alíquota uniforme de 17,5%;
- Fundos de Índice de Renda Fixa (ETFs de Renda Fixa) – rendimentos de fundos cujos regulamentos determinem que suas carteiras sejam compostas, no mínimo, por 75% de ativos financeiros que integrem o índice de renda fixa de referência, sujeitam-se à incidência do IRRF à alíquota de 20%. No caso de rendimentos de fundos cuja carteira seja composta exclusivamente por ativos incentivados (como LCI, LCA, CRI, CRA, dentre outros) são tributados à alíquota de 7,5%, quando o cotista for pessoa física;
- Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE) em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (FIP-PD&I) – os rendimentos auferidos no resgate de cotas, inclusive por liquidação, ficam sujeitos à alíquota de 17,5%. No caso de cotistas pessoas físicas, aplica-se a alíquota 0% para cotas emitidas e integralizadas até 31 de dezembro 2025, e 5% para cotas emitidas após essa data. Cotistas não residentes permanecem sujeitos à alíquota zero;
- Fundos de investimento e investidores residentes ou domiciliados no exterior – os rendimentos ficam sujeitos à incidência do IRRF à alíquota de 17,5%, ou à alíquota de 25% no caso de residentes em jurisdição de tributação favorecida. No entanto, fica mantida a alíquota zero para rendimentos auferidos por investidores residentes ou domiciliados no exterior, fora de jurisdição de tributação favorecida, em FIPs que observem normas e condições estabelecidas pelo Bacen, pela CVM e pelo CMN.
Investidor não residente
- Mudança de Regime: a MP altera o regime especial aplicável aos investidores não residentes nas aplicações realizadas nos mercados financeiro e de capitais, majorando a alíquota atualmente aplicável de IR de 15% para 17,5%, restringindo, anda, a isenção das operações realizadas em bolsa ou mercado de balcão organizado às negociações de ações, bônus de subscrição, recibos de subscrição e certificados de depósito de ações;
- Investidores não residentes permanecem sujeitos à alíquota zero nos ganhos e rendimentos decorrentes de aplicações em fundos de investimento em participação FIP (FIP e FIP-IE&PDI);
- Investidores residentes em Jurisdição de Tributação Favorecida que atualmente são tributados pelas mesmas regras aplicáveis às pessoas físicas no país passam a ser tributados, como regra geral, à alíquota de 25%;
- Conversão de modalidades de investimento: a conversão de investimento direto em investimento em mercado de capitais passa a ser formalmente sujeita à incidência de imposto de renda, calculado pela diferença do custo de aquisição e o valor de mercado na data da conversão. A conversão em sentido contrário será isenta de tributação.
Pessoas jurídicas – regras relevantes
- Aplicações financeiras passam a ser tributados à alíquota geral de 17,5% pelo IRRF, como antecipação do cálculo do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Perdas podem ser deduzidas conforme regras gerais de dedutibilidade;
- Cotas de Fundos de Investimento – avaliação patrimonial: o cotista pessoa jurídica tributada com base no lucro real poderá evidenciar em subconta a parcela do valor patrimonial da cota correspondente à avaliação, pelo valor patrimonial, de cotas ou ações de empresas controladas ou coligadas (no caso de FIA ou FIP) ou de bens imóveis (no caso de FII ou Fiagro) integrantes da carteira do fundo. O saldo da subconta será revertido e integrado à base de cálculo do IRPJ e CSLL no momento da alienação, pelo fundo, do ativo vinculado à subconta;
- Cotas de Fundos de Investimento – avaliação a valor justo: Se o investimento no fundo for reconhecido contabilmente como instrumento financeiro a valor justo, o cotista pode evidenciar em subconta a diferença entre o valor contábil do investimento (a valor justo) e o custo de aquisição da cota. Essa subconta ficará sujeita às regras vigentes de tributação de ganhos e perdas de avaliação de ativos e passivos a valor justo;
- Operações de Hedge com o exterior: perdas passam a ser dedutíveis em operações realizadas com contrapartes no Exterior, que atualmente são limitadas às operações realizadas em bolsa, desde que: sejam registradas em mercados de bolsa ou balcão no exterior, sejam realizadas em bases de mercado e nos casos em que o preço for formado em mercado respaldado por quantidade suficiente entre terceiros com o mesmo ativo subjacente, na forma a ser regulamentada pela RFB. Atendidas essas condições a alíquota 0% de IRRF, passa a ser aplicável de forma geral a todos os derivativos para fins de cobertura, independentemente do item objeto de hedge. Atualmente a alíquota zero é limitada às operações de hedge que tenham por objeto as variações de juros, paridade de moedas ou preços de mercadorias;
- Aumento da CSLL – instituições financeiras: foi majorada a alíquota da CSLL, de 9% para 15%, no caso de instituições de pagamento, bolsas de valores e de mercadorias e futuros; entidades de liquidação e compensação; e algumas outras sociedades que sejam consideradas instituições financeiras pelo CMN, tais como Sociedades de Crédito Direto (SCD) e Sociedades de Empréstimos entre Pessoas (SEP);
- Juros sobre capital próprio: foi majorada a alíquota do IRRF incidente sobre distribuições de Juros sobre Capital Próprio, de 15% para 20%;
- Apostas de quota fixa (“BETs”) – aumento de 6% na carga tributária das BETs. Do produto da arrecadação das apostas de quota fixa, após deduções específicas, 82% serão destinados à cobertura de despesas de custeio e manutenção do agente operador da loteria e demais jogos de apostas; 6% serão destinados à seguridade social, para ações na área da saúde; e 12% e manterão as destinações específicas que já estavam previstas em lei.
Vigência e eficácia
- Caso seja convertida em lei, a maior parte das novas regras entrará em vigor em 1º de janeiro de 2026. Como exceção, destacamos as regras de majoração da alíquota da CSLL para instituições de pagamento, e de destinação de produto de arrecadação de apostas de quota fixa, que passam a ser válidos a partir de 1º de outubro de 2025, em razão da anterioridade nonagesimal.
Caso a Medida Provisória nº 1.303 seja convertida em lei, ocasionará não apenas um grande impacto no regime tributário aplicável a rendimentos financeiros, mas também poderá levar a diversas discussões e disputas sobre a legalidade e constitucionalidade de algumas dessas alterações. Da mesma forma, algumas das alterações mantidas pelo Decreto nº 12.499 para a legislação do IOF tendem a continuar gerando discussões semelhantes.
Para mais informações sobre as alterações em questão e sobre as potenciais discussões envolvidas, conheça a prática de Tributário do escritório Mattos Filho.