TJ-SP declara inconstitucionais dispositivos do Código Municipal de Defesa do Consumidor de São Paulo
A procedência parcial das ADIs afasta o dever de observância de cláusulas e práticas elencadas como abusivas no Código Municipal de Defesa do Consumidor de São Paulo
O acórdão proferido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) que julgou conjuntamente as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) n°’s 2260724-88.2019.8.26.0000, 2188592-33.2019.8.26.0000 e 2152348-37.2021.8.26.0000, publicado em 22 de março de 2023, esclareceu que a matéria de relações de consumo e de direito do consumidor é de competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal e territórios, podendo haver suplementação por parte dos Municípios no tocante a assuntos de interesse local.
Inconstitucionalidade do Código Municipal de Defesa do Consumidor
Ao analisar a constitucionalidade do Código Municipal de Defesa do Consumidor de São Paulo (CDC Municipal), o TJ-SP decidiu na mesma linha do quanto decidido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) no julgamento da Representação de Inconstitucionalidade n° 0003013-36.2022.8.19.0000. Nesta ocasião, em novembro de 2022, o TJ-RJ também declarou a inconstitucionalidade de dispositivos similares do Código Municipal de Defesa do Consumidor do Rio de Janeiro. A identidade dos dispositivos dos dois Códigos Municipais de Defesa do Consumidor evidencia a ausência de interesse local, tratando-se de matéria de interesse geral e nacional, atingindo diferentes Estados e Municípios da federação.
O entendimento que prevaleceu foi o de que, em ambos os casos, as Câmaras Municipais de São Paulo e do Rio de Janeiro inovaram sobre as cláusulas e práticas consideradas abusivas, matérias claramente abarcadas como “normas gerais de direito do consumidor”, ou seja, não poderiam ser enquadradas como abusivas as práticas e cláusulas para além daquelas editadas pela União e elencadas nos artigos 39 e 51 da Lei Federal n° 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor).
Efetivação do Código de Defesa do Consumidor Municipal
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) Municipal entrou em vigor em 5 de junho de 2019. Contra dispositivos dessa lei, a Associação Brasileira de Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP), a Associação Nacional das Operadoras Celulares (Acel) e a Associação Brasileira de Concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado (Abrafix) propuseram as três ADIs alegando, sobretudo, violação aos princípios da livre iniciativa, da livre concorrência e da proporcionalidade, bem como a violação do pacto federativo, uma vez que que o Município de São Paulo teria tratado sobre matéria de competência concorrente sem que estivesse caracterizado interesse local.
O Desembargador sorteado como relator das ADIs, Damião Cogan, entendeu pela constitucionalidade dos dispositivos que incluíram novas cláusulas e práticas abusivas a serem observadas pelos fornecedores, pois, a seu ver, o CDC Municipal apenas reforçaria garantias dos consumidores previstas na legislação federal. Porém, aberta a divergência, foi declarado vencedor o voto do Desembargador Décio Notarangeli, designado para a redação do acórdão. Nos termos do voto vencedor, são inconstitucionais os artigos do CDC Municipal que elencam como cláusulas e práticas abusivas, dentre outras:
- A exigência de dois ou mais laudos da assistência técnica para a troca de produto viciado;
- O estabelecimento de limites quantitativos na venda dos produtos ofertados;
- O envio do nome do consumidor ou seus garantes a banco de dados e cadastros de consumidores sem notificação prévia por envio de carta simples e por meio eletrônico;
- A oferta publicitária que não informa sobre o prazo para entrega de mercadorias.
O mérito da tipificação dessas cláusulas e práticas como abusivas não chegou a ser analisado pelo TJ-SP, tendo o seu Órgão Especial se limitado a declarar, por maioria de votos, a inconstitucionalidade dos dispositivos do CDC Municipal por extrapolação de competência legislativa na matéria de direito das relações de consumo.
Foram declarados os votos dos desembargadores Damião Cogan e Luciana Bresciani, estando pendentes as declarações de voto dos demais desembargadores que participaram do julgamento das ADIs. Ainda cabem recursos do Prefeito Municipal de São Paulo e do Presidente da Câmara Municipal de São Paulo contra a decisão.
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*Com a colaboração de Maria Carolina Vitorino Lopes.