STF em destaque: retrospectiva de 2023 e perspectivas para 2024
Confira a análise das decisões marcantes e as tendências que moldarão o ano no Brasil
Assuntos
O ano de 2023 foi marcado por decisões emblemáticas do Supremo Tribunal Federal (STF), que abordou questões cruciais para o cenário jurídico brasileiro. A seguir, destacamos alguns casos de grande relevância que foram objeto de julgamento ao longo do ano passado:
Constitucionalidade da previsão de medidas atípicas para assegurar o cumprimento de ordens judiciais
Em fevereiro, a Suprema Corte julgou a ADI nº 5.941 e as considerou constitucionais, desde que respeitados os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os valores especificados no próprio ordenamento processual, em especial os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, as medidas atípicas previstas no Código de Processo Civil (CPC)/2015 destinadas a assegurar a efetivação dos julgados.
Possibilidade da requisição direta de dados feita por autoridades nacionais a provedores no exterior
Ainda em fevereiro, o STF analisou a ADC nº 51, definindo que as empresas de tecnologia que operam aplicações de internet no Brasil sujeitam-se à jurisdição nacional e, como tal, devem cumprir as determinações das autoridades nacionais do Poder Judiciário, inclusive as requisições feitas diretamente quanto ao fornecimento de dados eletrônicos para a elucidação de investigações criminais, ainda que parte de seus armazenamentos esteja em servidores localizados em países estrangeiros.
Foro para julgar ações contra estados e Distrito Federal
Em abril, o STF julgou as ADIs nº 5.492 e 5.737, declarando inconstitucional a regra de competência do Código de Processo Civil que permite que os estados e o Distrito Federal possam responder a ações em qualquer comarca do país. Também foi derrubada a obrigatoriedade de depósitos judiciais e requisições de pequeno valor (RPVs) serem feitos somente em bancos públicos.
Ordem dos Advogados do Brasil e o dever de prestar contas ao Tribunal de Contas da União
Também no mês de abril, foi julgado o Tema nº 1.054 (RE nº 1.182.189), que resultou na seguinte tese: “O Conselho Federal e os Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil não estão obrigados a prestar contas ao Tribunal de Contas da União nem a qualquer outra entidade externa”.
Fatos supervenientes e a possibilidade da apresentação do voto do ministro sucessor
Em junho, ao analisar a Questão de Ordem no INQ nº 3.515, a Corte entendeu que a superveniência de fatos novos configura circunstância excepcional que permite que o ministro que atualmente ocupa a cadeira profira voto, ainda que seu antecessor já tenha votado. Assim, a preservação do voto do ministro sucedido só deve ocorrer quando as condições e circunstâncias levadas a julgamento permanecerem as mesmas.
Restrições ao pagamento de precatórios
Em novembro, o Supremo analisou as ADIs nº 7.047 e 7.064 e, por maioria de votos, derrubou alterações implementadas em 2021 no regime constitucional de precatórios (Emendas Constitucionais 113 e 114), dentre elas, a que impunha um teto para o pagamento dessas despesas entre 2022 e 2026.
Desconstituição da coisa julgada nos juizados especiais federais
Ainda em novembro, o Plenário Virtual, fixou a seguinte tese no Tema 100 da repercussão geral: “1) é possível aplicar o artigo 741, parágrafo único, do CPC/73, atual art. 535, § 5º, do CPC/15, aos feitos submetidos ao procedimento sumaríssimo, desde que o trânsito em julgado da fase de conhecimento seja posterior a 27.8.2001; 2) é admissível a invocação como fundamento da inexigibilidade de ser o título judicial fundado em ‘aplicação ou interpretação tida como incompatível com a Constituição’ quando houver pronunciamento jurisdicional, contrário ao decidido pelo Plenário do STF, seja no controle difuso, seja no controle concentrado de constitucionalidade; 3) o art. 59 da Lei 9.099/95 não impede a desconstituição da coisa julgada quando o título executivo judicial se amparar em contrariedade à interpretação ou sentido da norma conferida pela Suprema Corte, anterior ou posterior ao trânsito em julgado, admitindo, respectivamente, o manejo de impugnação ao cumprimento de sentença ou de simples petição, a ser apresentada em prazo equivalente ao da ação rescisória”.
Validade dos juros moratórios aplicáveis nas condenações da Fazenda Pública, em virtude da tese firmada no RE 870.947 (Tema 810), na execução de título judicial que tenha fixado expressamente índice diverso
Em dezembro, ao analisar o Tema nº 1.170 (RE nº 1.317.982), a Suprema Corte fixou a seguinte tese: “É aplicável às condenações da Fazenda Pública envolvendo relações jurídicas não tributárias o índice de juros moratórios estabelecido no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, na redação dada pela Lei n. 11.960/2009, a partir da vigência da referida legislação, mesmo havendo previsão diversa em título executivo judicial transitado em julgado”.
Ao julgar esses casos, o STF reafirma o seu papel fundamental na definição de precedentes que moldam a jurisprudência nacional, deixando um legado de decisões que impactarão diretamente a política nacional.
Perspectivas para 2024
O ano de 2024 também promete ser marcado por decisões cruciais ao país, sendo um dos desafios a implantação do juiz de garantia. A seguir, destacamos casos de grande relevância que poderão ser julgados ao longo desse ano:
A imposição do regime de separação de bens para pessoas com mais de 70 anos
Em fevereiro, a Corte retomou as discussões iniciadas em 2023 no ARE 1.309.642 e fixou a seguinte tese: “O regime obrigatório de separação de bens envolvendo pessoas com mais de 70 anos, pode ser alterado pela vontade das partes, o Plenário entendeu ainda que manter a obrigatoriedade da separação de bens, prevista no Código Civil, desrespeita o direito de autodeterminação das pessoas idosas”.
Revisão da vida toda
Há ainda a previsão de julgamento do RE 1.276.977 (Tema 1102), que trata da “revisão da vida toda” para aposentadorias e benefícios de quem contribuía para a previdência antes de 29/11/1999. A proposta sugere o recálculo da aposentadoria, considerando todos os salários contribuídos e tem gerado muitas dúvidas. A decisão tem uma enorme implicação para aposentados de todo o país.
Fixação de honorários advocatícios por equidade
O julgamento do Tema nº 1255 (RE nº 1412069) também é previsto. Com repercussão geral reconhecida em agosto de 2023, o recurso versa sobre a possibilidade de fixação de honorários de sucumbência por equidade quando os valores da condenação, da causa ou do proveito econômico da demanda forem elevados. A discussão provém de decisão do STJ que, em 2022, vetou a fixação de honorários por equidade em causas de proveito econômico elevado. A Corte Infraconstitucional estabeleceu que nesses casos deveriam ser seguidos os percentuais já previstos no CPC.
Regime de recuperação judicial
Poderá ser julgado o RE nº 1.24.9945, que analisa se o regime de recuperação judicial de empresas privadas seria aplicável às empresas públicas.
Alterações introduzidas no CPC
Também pende de análise a ADI nº 7.005, ajuizada pelo PSDB contra alterações introduzidas no CPC por meio da Lei nº 14.195/2021 (oriunda de emendas parlamentares incluídas durante a tramitação da Medida Provisória nº 1.040/2021). Tais alterações trouxeram, como regra, a citação por meio eletrônico e mudanças no regime prescricional durante o processo de execução e cumprimento de sentença. A lei determina que a citação ocorra através de endereços eletrônicos indicados pelas partes ao Poder Judiciário e que a prescrição intercorrente na execução comece a correr da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens. As mudanças estão sendo contestadas. Segundo o partido, a matéria objeto das mudanças não poderia ser tratada por medida provisória e há irregularidade na maneira como ela foi introduzida no Congresso.
Regras de divisão dos royalties do petróleo
Ainda deverão ser analisadas as ADIs nº 4916, 4917, 4918 e 5038, que tratam da validade das regras de divisão dos royalties do petróleo explorado em estados e municípios, tornando a partilha mais igualitária entre produtores e não produtores.
Moderação de conteúdo na internet
A Suprema Corte também poderá julgar o Tema nº 987 (RE nº 1.037.396), que discute a constitucionalidade do art. 19 do Marco Civil da Internet, tratando de moderação de conteúdo. O artigo estabelece as circunstâncias em que um provedor de aplicações de internet, como as redes sociais, poderá ser responsabilizado civilmente por danos causados por conteúdos publicados por terceiros. O recurso discute a exigência prévia e específica de ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil de provedor de internet, websites e gestores de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros. Ainda, na mesma toada, o RE 1.057.258 questiona o dever de empresa hospedeira de sítio na internet fiscalizar o conteúdo publicado e de retirá-lo do ar quando considerado ofensivo, sem intervenção do Judiciário. Em 2023, foi marcada uma audiência pública para debater o tema.
Para mais informações sobre os temas elencados, conheça a prática de Contencioso e Arbitragem do Mattos Filho.