Projeto de Lei sobre sequestro geológico e temporário de carbono avança no Senado Federal
PL será analisado pela Comissão de Meio Ambiente e, caso promulgado, representará passo importante para transição de uma economia de baixo carbono
A Comissão de Infraestrutura do Senado Federal aprovou, em 6 de junho de 2023, o Projeto de Lei n° 1425/2022 (PL), que disciplina a exploração da atividade de armazenamento permanente de dióxido de carbono de interesse público, em reservatórios geológicos ou temporários, e seu posterior reaproveitamento.
O PL foi apresentado no Senado Federal, em 31 de maio de 2022, e tem por objetivo promover a descarbonização no Brasil, regulamentando os mecanismos de sequestro geológico de carbono, conhecido como “CCS” (sigla do original em inglês Carbon Capture and Storage).
A proposta visa criar um arcabouço jurídico para a gestão e controle do armazenamento de CO2, considerando os impactos ambientais e os potenciais benefícios dessa prática. O projeto estabelece diretrizes, procedimentos e requisitos técnicos para a atividade, com o objetivo de assegurar a segurança, eficiência e sustentabilidade do armazenamento de CO2.
Após parecer favorável da Comissão de Infraestrutura, o PL será encaminhado à Comissão de Meio Ambiente, em decisão terminativa, ou seja, sem necessidade de votação no Plenário. Em seguida, prosseguirá para a Câmara dos Deputados, também com rito terminativo, e, por fim, será enviado para sanção presidencial.
O PL tem como um dos seus princípios o estímulo à pesquisa, ao desenvolvimento, inovação, implementação e utilização de tecnologias apropriadas para qualidade da atividade em bases de eficiência, redução dos custos, e adequado aproveitamento dos recursos humanos. Caso o PL se torne lei, o Brasil terá o primeiro marco regulatório sobre CCS e dará passo importante em direção à transição energética e ao cumprimento das metas nacionais de redução das emissões de gases causadores do efeito estufa.
Visão geral
O projeto disciplina a captura de CO2 de fontes estacionárias, incluindo a captura direta, e estabelece que o armazenamento permanente deverá ocorrer em formações geológicas selecionadas e avaliadas. Já o não-permanente, para fins comerciais e de reuso, será realizado em reservatórios acima da superfície, atendidas a especificações de segurança. O projeto prevê a criação de mecanismos de monitoramento, controle e responsabilização dos empreendimentos de armazenamento de CO2, bem como a definição de critérios para a obtenção de licenças e autorizações para a realização dessa atividade.
O PL pretende promover mudanças nos artigos 2º, 7º e 8º da Lei do Petróleo para estabelecer como competência do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e apresentar políticas para a adoção progressiva da captura de carbono (seja por armazenamento ou reaproveitamento) ao Presidente; e delega à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) a função de órgão regulador e fiscalizador do armazenamento geológico de CO2.
A ANP pode vir a ter a competência para regular e fiscalizar a matéria, bem como elaborar os editais e promover as licitações para a concessão de exploração, desenvolvimento e produção, incluindo mecanismos de captura de carbono em atendimento às diretrizes do CNPE, celebrando os contratos delas decorrentes e fiscalizando a sua execução.
Outorga de exploração dos reservatórios geológicos
As atividades de armazenamento permanente de CO2 serão exercidas mediante ao Termo de Outorga Qualificada do Poder Executivo, que terá prazo de 30 anos, prorrogável por igual período, caso seja necessário o cumprimento de condicionantes. Se houver impossibilidade de desenvolvimento simultâneo com as atividades de exploração mineral, exploração e produção de hidrocarbonetos, recursos hídricos em bloco objeto de contrato ou autorização celebrado anteriormente, a nova atividade dependerá de anuência do titular do direito preexistente.
A outorga poderá ser revogada se:
- Não houver o cumprimento das condicionantes previstas no Termo de Outorga Qualificada;
- O nível de operação, após iniciada a atividade, for inferior ao mínio estipulado no Termo de Outorga para atividade de armazenamento, por três anos consecutivos, ou por dez anos somados durante a vigência do Termo de Outorga Qualificada;
- Necessária a prevenção ou mitigação de grave degradação ambiental;
- Essencial o uso prioritário por interesse coletivo sem fontes alternativas.
Cumpre destacar que a outorga não dispensa o licenciamento ambiental previsto na Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981) ou licenças correlatas aplicáveis.
O Poder Executivo divulgará a relação de reservatórios geológicos passíveis de outorga nos termos da lei, após dois anos da data de publicação. Os “Operadores”, definidos como pessoas jurídicas responsáveis pela injeção ou retirada de CO2 em formações geológicas para armazenamento, podem solicitar o Termo de Outorga Qualificada para armazenar CO2 em reservatórios não divulgados pelo Poder Executivo, desde que apresentem estudos sobre a capacidade de armazenamento de CO2 do bloco em questão. Poderá ser realizada uma consulta pública para receber propostas e manifestações de interesse em relação ao Bloco de Armazenamento.
Obrigações e responsabilidades do operador
São obrigações do operador garantir que o armazenamento ou reaproveitamento de CO2 ocorra de forma segura e eficaz com base no Plano de Monitoramento e Plano de Contingência, ou licenciamento ambiental pertinente às operações de armazenamento temporário. Além do manter sempre os dados relacionados à operação de armazenamento permanente de CO2 atualizados, o Operador deverá realizar inventário de armazenamento e vazamento de CO2, comparando a quantidade de armazenamento e o vazamento previsto e realizado para aferir a eficácia do projeto aprovado; garantir o cumprimento das obrigações previstas; e certificação de crédito de carbono.
O Operador é objetivamente responsável por quaisquer danos causados pelo projeto, proporcionalmente ao volume de CO2 capturado e armazenado, sem prejuízo da responsabilidade solidária dos consorciados. Quando o Operador estiver a serviço de agente emissor ou reaproveitar de CO2 ou de terceiro interessado, a responsabilidade será entre eles compartilhada.
Monitoramento e gestão das atividades
As atividades de monitoramento e gestão do armazenamento permanente de CO2 durarão até 20 anos após cessada a atividade de forma permanente, contados a partir do Termo de Outorga Qualificada. O artigo 19, parágrafo 2º, prevê que esse período pode ser reduzido para até cinco anos, desde que atendidos os requisitos essenciais à certificação da segurança e da estabilidade do reservatório.
O parágrafo único dos artigos 13 e 14 mostra a disciplina da comunicação imediata à autoridade competente em caso de irregularidades no local de armazenamento, dando destaque a vazamentos. O PL, ainda, prevê as hipóteses em que os Planos de Monitoramento e de Contingência deverão ser atualizados e encaminhados para homologação da autoridade de regulação competente.
Gestora de Ativos de Armazenamento (GAA)
O projeto institui a GAA, entidade privada, sem fins lucrativos, destinada a monitorar e a gerir os ativos de armazenamento quando cessado os 20 anos de monitoramento, logo atuará como órgão intermediário entre operador e União. Devolvido o ativo, poderá ficar sob gestão da GAA por até 35 anos.
A transferência dos ativos entre operador e a GAA deverá ser precedida de anuência da autoridade de regulação competente.
Acesso à infraestrutura de armazenamento e transporte de CO2
Em relação ao acesso à infraestrutura essencial para transporte de CO2, o agente responsável pela etapa de transporte deve manter suas operações com independência e autonomia em relação aos agentes participantes da captura, reaproveitamento e estocagem de CO2. O risco do transporte será compartilhado entre os operadores da infraestrutura essencial e o solicitante.
Atividades sujeitas à regulamentação
As atividades de armazenamento permanente prevista no PL, incluindo o descomissionamento e o encerramento da infraestrutura de injeção de dióxido de carbono serão reguladas e fiscalizadas pela autoridade de regulação competente, não podendo exercer a função de outorga do Termo de Outorga Qualificada.
Cabe ressaltar que o projeto de lei pode passar por modificações ao longo do processo legislativo.
Para mais informações sobre o tema, conheça a prática de Infraestrutura e Energia do Mattos Filho.