Letras de Risco de Seguro: aprovado o novo marco regulatório
Resolução tem o objetivo de regulamentar a recém-promulgada Lei nº 14.430
Após a realização da Consulta Pública nº 12/2022, que foi objeto de conteúdo publicado no Único em outubro de 2022, o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) publicou, em 19 de dezembro de 2022, a Resolução CNSP nº 453, que dispõe sobre a emissão de Letras de Risco de Seguro (LRSs) por meio de Sociedades Seguradoras de Propósito Específico (SSPEs).
A nova resolução tem o objetivo de regular, no campo do mercado de (res)seguros, a recém-promulgada Lei nº 14.430, de 3 de agosto de 2022, que criou as LRSs a serem emitidas por SSPEs para financiamento e transferência de riscos de seguros, previdência complementar, saúde suplementar, resseguro ou retrocessão a investidores do mercado de capitais.
A partir de sua entrada em vigor, em 2 de janeiro de 2023, a nova regra revogou a Resolução CNSP nº 396, de 11 de dezembro de 2020, que regulava o Instrumento Ligado a Seguro ou ILS, instrumento de dívida que foi substituído pela LRS quando da promulgação da Lei nº 14.430/2022.
A Resolução CNSP nº 453/2022 foi aprovada com poucas modificações em relação aos termos da Consulta Pública. Confira os principais destaques do novo normativo:
Emissão e distribuição de LRSs
De acordo com o novo normativo, cada contrato de transferência de risco deverá estar vinculado a um único tipo de risco (seguro, resseguro, previdência privada ou saúde) e a uma única LRS.
Uma importante mudança introduzida pela nova resolução foi a previsão de prazo máximo de dez anos para vencimento das LRSs. A proposta inicial apresentada na Consulta Pública contemplava prazo de vencimento menor, de cinco anos. A regra nova ainda endereça uma preocupação do mercado, exigindo a determinação de prazo máximo para comunicação dos sinistros igual ou inferior à data de vencimento dos LRS.
Além disso, a resolução cria uma limitação para que somente investidores profissionais, conforme definidos na regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), adquiram LRSs. Ressalta-se que a regra não vincula a restrição de público-alvo apenas às LRSs objeto de oferta pública. O referido normativo ainda delegou às SSPEs a responsabilidade por verificar o cumprimento desta limitação, além de atribuir à Superintendência de Seguros Privados (Susep) poderes para supervisionar as operações de securitização, naquilo que lhe compete. Esta delegação não impede ou limita os deveres de suitability e responsabilidades de instituições intermediárias de ofertas públicas de LRSs, tampouco os poderes de supervisão e fiscalização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) com relação a distribuições públicas.
Independência patrimonial
A nova resolução reforça a independência patrimonial de cada transferência de riscos e emissão de LRS, de modo que cada operação realizada por determinada SSPE será independente em relação às demais por ela contratadas e à própria SSPE.
Por outro lado, a referida norma flexibiliza a independência entre a SSPE e as operações de transferência de risco ao prever que o patrimônio de tais sociedades poderá responder, de forma subsidiária, pelo cumprimento dos compromissos assumidos com contrapartes da operação de securitização. Ademais, caso o patrimônio independente da operação não seja suficiente para assegurar a remuneração garantida pela SSPE aos investidores titulares, nos termos acordados na LRS, a SSPE deverá complementá-lo.
Por esse motivo, a SSPE deverá constituir provisão técnica de insuficiência (PTI) em valor igual à soma dos valores de insuficiência patrimonial de cada operação de securitização e provisão de garantia de rentabilidade (PGR), relativa ao valor presente dos compromissos assumidos pela SSPE relacionados à garantia de rentabilidade determinada na LRS.
Para fazer frente às responsabilidades descritas no parágrafo anterior, a resolução prevê que as SSPEs deverão manter capital mínimo requerido equivalente ao maior valor entre o capital base e o capital de risco, este último calculado segundo a regra prevista na própria resolução. No caso específico do capital base, este será a soma entre a parcela fixa de R$ 1.200.000,00, e a parcela variável de R$ 100.000,00 por operação de securitização vigente, limitado ao capital base aplicável às sociedades seguradoras autorizadas a operar em todo o território nacional.
Autorização para constituição e funcionamento das SSPEs
Em linha com a equiparação entre SSPEs e sociedades seguradoras, conforme estabelecida na Lei nº 14.430/2022, a resolução estende àquelas os mesmos critérios, condições e requisitos aplicáveis à obtenção junto à Susep de aprovação prévia e/ou homologação, conforme o caso.
Governança da SSPE e segmentação prudencial
De acordo com a resolução, as SSPEs serão administradas por seus diretores, entre os quais deverão ser distribuídas as duas funções regulatórias previstas na referida norma (diretor responsável técnico e diretor responsável pela contabilidade). Tais sociedades também poderão constituir um Conselho de Administração, o qual será eleito e empossado em observância às regras aplicáveis à eleição e posse de administradores de sociedades seguradoras.
Além disso, a nova resolução estende às SSPEs a aplicação proporcional da regulamentação prudencial, de acordo com a segmentação atribuída à SSPE ou seu grupo prudencial, na forma da Resolução CNSP nº 388, de 8 de setembro de 2020. Por conta disto, com base na redação atual do normativo, as SSPEs enquadradas nos níveis de segmentação prudencial S1 e S2 poderão ser obrigadas a constituir um Comitê de Auditoria estatutário.
De outro lado, a resolução esclarece que as SSPEs que não possuam Comitê de Auditoria deverão designar um diretor responsável pelo acompanhamento, supervisão e cumprimento das normas e procedimentos de auditoria contábil independente (observando-se, neste caso, as restrições existentes sobre acúmulo de funções).
Mitigação de conflito de interesse e restrição de partes relacionadas
O novo normativo ainda exige que os administradores da SSPE não sejam:
- Titulares das LRSs por ela emitidas;
- Diretor ou empregado de contrapartes da SSPE, titulares de LRSs ou suas respectivas controladoras, controladas, coligadas ou sociedades em controle comum;
- Cônjuge, parente em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e por afinidade, até o segundo grau das pessoas indicadas no item anterior.
Demonstrações financeiras
As SSPEs deverão elaborar e submeter à Susep demonstrações financeiras próprias, acompanhadas de demonstrações individualizadas para cada operação de securitização, na mesma periodicidade e seguindo os mesmos requisitos aplicáveis às sociedades seguradoras.
Assim, as SSPEs enquadradas nos segmentos prudenciais S1 e S2 deverão elaborar demonstrações financeiras em bases semestrais e as sociedades enquadradas nos segmentos S3 e S4 deverão elaborar demonstrações financeiras anuais.
Integração entre setores da economia
A resolução representa mais um passo importante para viabilizar a integração entre, de um lado, os mercados de (res)seguros, de saúde suplementar e de previdência complementar (aberta e fechada) e, de outro, o mercado de capitais pela criação de meios alternativos para o financiamento e a pulverização de riscos.
Para os investidores, este tipo de investimento diferenciado poderá ser uma alternativa atraente de diversificação, considerando-se que os riscos subjacentes não são necessariamente correlacionados a variáveis macroeconômicas.
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