Letras de Risco de Seguro: nova resolução regulamentará o marco da securitização
Minuta tem o intuito de regular a Lei nº 14.430 quanto à securitização de riscos de seguros e afins
O Conselho Diretor da Superintendência de Seguros Privados (Susep) publicou, em 29 de setembro de 2022, o edital da Consulta Pública nº 12/2022 para coletar sugestões e comentários do mercado sobre a minuta da nova resolução a ser editada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP).
O objetivo da minuta é regular, no campo do mercado de (res)seguros, a recém-promulgada Lei nº 14.430, de 3 de agosto de 2022, que criou as Letras de Risco de Seguro (LRSs) a serem emitidas por Sociedades Seguradoras de Propósito Específico (SSPEs) para financiamento e transferência de riscos de seguros e resseguros a investidores do mercado de capitais. A partir de sua entrada em vigor, a nova resolução substituirá a Resolução CNSP nº 396, de 11 de dezembro de 2020, que regula o Instrumento Ligado a Seguro ou ILS, instrumento de dívida que foi substituído pela LRS quando da promulgação da Lei nº 14.430/2022.
Confira abaixo as principais novidades trazidas pela minuta de resolução:
Emissão e distribuição de LRSs
Para garantia dos riscos transferidos às SSPEs, estas deverão captar, via emissão de LRSs, recursos suficientes à cobertura de tais riscos.
Vale destacar que, de acordo com a minuta de resolução, cada contrato de aceitação de risco deverá estar vinculado a um único tipo de risco (seguro, resseguro, previdência privada ou saúde) e a uma única LRS. A minuta de resolução, além disso, introduz uma importante modificação em relação à Resolução CNSP nº 396/2020, reduzindo de dez para cinco anos o prazo máximo de vencimento das LRSs.
Além disso, a minuta de resolução cria uma limitação para que somente investidores qualificados (conforme definidos na regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários – CVM) adquiram LRSs. O referido normativo ainda foi além e delegou às SSPEs a responsabilidade de verificar o cumprimento da limitação aqui descrita, além de atribuir à Susep poderes para supervisionar as operações de securitização, naquilo que lhe compete.
Independência patrimonial
Por um lado, a minuta de resolução reforça a independência patrimonial de cada transferência de riscos e emissão de LRS, de modo que cada operação realizada por determinada SSPE será independente em relação às demais por ela contratadas e à própria SSPE.
Por outro lado, a referida minuta flexibiliza a independência entre a SSPE e as operações de transferência de risco ao prever que o patrimônio de tais sociedades poderá:
- Responder de forma subsidiária, pelo cumprimento das obrigações assumidas por tal sociedade no respectivo contrato de aceitação de risco;
- Garantir o retorno do investidor, caso os ativos que lastreiam operação, após a liquidação de todos os sinistros, não sejam suficientes para assegurá-lo, nos termos da LRS.
Para fazer frente às responsabilidades descritas no parágrafo anterior, a minuta de resolução propõe que:
- O capital mínimo regulatório das SSPEs seja, pelo menos, equivalente ao capital base aplicável às sociedades seguradoras (R$ 15.000.000,00 para sociedades enquadradas nos níveis de segmentação S1 e S2 que atuem no território nacional);
- As SSPEs mantenham provisão contábil para garantir o valor presente dos compromissos assumidos pela SSPE em relação à rentabilidade prevista na respectiva LRS.
Autorização para Constituição e Funcionamento das SSPEs
Em linha com a equiparação entre SSPEs e sociedades seguradoras estabelecida na Lei nº 14.430/2022, a minuta de resolução estende às SSPEs os mesmos critérios, condições e requisitos aplicáveis à obtenção junto à Susep de aprovação prévia e homologação, conforme o caso, para:
- A constituição e funcionamento de sociedades seguradoras;
- A eleição de pessoas para cargos estatutários;
- Aumentos de capital social.
A minuta de resolução ainda exige que os administradores da SSPE não sejam:
- Titulares das LRS emitidas por tal sociedade;
- Diretor ou empregado de contrapartes da SSPE, titulares de LRS ou as suas respectivas controladoras, controladas, coligadas ou sociedades em controle comum;
- Cônjuge, parente em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e por afinidade, até o segundo grau das pessoas indicadas no segundo item.
Governança da SSPE e segmentação prudencial
De acordo com a minuta de resolução, as SSPEs serão administradas por seus diretores, entre os quais deverão ser distribuídas as duas funções regulatórias previstas na referida norma (diretor responsável técnico e diretor responsável pela contabilidade). Tais sociedades também poderão constituir um Conselho de Administração, o qual será eleito e empossado em observância às regras aplicáveis à eleição e posse de administradores de sociedades seguradoras.
Além disso, a referida minuta de resolução também estende às SSPEs a aplicação proporcional da regulamentação prudencial, de acordo com a segmentação atribuída à SSPE ou seu grupo prudencial, na forma da Resolução CNSP nº 388, de 8 de setembro de 2020. Por conta disto, com base na redação atual do normativo, as SSPEs enquadradas nos níveis de segmentação prudencial S1 e S2 poderão ser obrigadas a constituir um Comitê de Auditoria Estatutário (por força da Resolução CNSP nº 432, de 12 de novembro de 2021).
De outro lado, a minuta esclarece que as SSPEs que não possuam o referido órgão deverão designar um diretor responsável pelo acompanhamento, supervisão e cumprimento das normas e procedimentos de auditoria contábil independente observando-se, neste caso, a restrição para que tal diretor acumule outras funções relativas à gestão, de caráter executivo ou operacional, ou que impliquem na assunção de riscos relevantes ao negócio da SSPE, na forma da Resolução CNSP nº 416, de 20 de julho de 2021.
Demonstrações financeiras
A minuta de resolução determina que as SSPEs deverão elaborar e submeter à Susep demonstrações financeiras próprias, acompanhadas de demonstrações individualizadas para cada operação de emissão de LRS) na mesma periodicidade e seguindo os mesmos requisitos aplicáveis às sociedades seguradoras.
Assim, de acordo com a Circular SUSEP nº 648, de 12 de novembro de 2021, as SSPEs enquadradas nos segmentos prudenciais S1 e S2 deverão elaborar demonstrações financeiras em bases semestrais, ao passo que as sociedades enquadradas nos segmentos S3 e S4 deverão elaborar demonstrações financeiras anuais.
Considerações finais
A Consulta Pública nº 12/2022 representa mais um passo importante para viabilizar a integração entre os mercados de (res)seguros, de saúde suplementar e de previdência complementar fechada e o mercado de capitais pela criação de meios alternativos para o financiamento e a pulverização de riscos.
Para os investidores, esse tipo de investimento diferenciado poderá ser uma alternativa atraente de diversificação, considerando-se que os riscos subjacentes não são diretamente correlacionados a variáveis macroeconômicas (o que poderá ter ainda maior importância, em um cenário de maior incerteza político-econômica).
É importante que todos os mercados afetados se posicionem em relação à proposta de resolução. As sugestões e comentários poderão ser enviados até 28 de outubro de 2022, devendo ser utilizado o quadro padronizado específico disponível no site da Susep.
Para mais informações sobre o tema, conheça a prática de Seguros, resseguros e previdência privada e de Financiamento e Dívida do Mattos Filho.