O atual cenário do superendividamento no Brasil e as iniciativas das autoridades
O programa Desenrola Brasil deu força às ações e à aplicabilidade da lei do superendividamento e ao enfrentamento do tema pelas autoridades
O superendividamento é um fenômeno mundial que decorre do modo como o mercado de consumo é operado atualmente. No Brasil, a situação do superendividamento se agravou durante a pandemia. De acordo com o Mapa de Inadimplência elaborado pelo Serasa, em maio de 2021, 60 milhões de pessoas estavam inadimplentes, totalizando R$249,6 bilhões em dívidas contraídas. Esse cenário fomentou a promulgação, há três anos, da Lei 14.181/2021 (Lei do Superendividamento), que buscou aperfeiçoar a disciplina sobre a oferta de crédito ao consumidor e estabelecer diretrizes para a prevenção e tratamento do superendividamento.
Desde então, as autoridades de consumo voltaram as atenções para a resolução deste problema. Em junho de 2023, foi editada a Medida Provisória (MP) nº 1.176/2023, que instituiu o programa Desenrola Brasil, idealizado pelo Governo Federal, que, com o apoio da Febraban, possibilitou a renegociação de dívidas de natureza privada, para combater a inadimplência no país e auxiliar os consumidores a retomarem o controle de sua vida financeira.
Entre julho e dezembro de 2023, foram negociados 3,33 milhões de contratos. Até março de 2024, 14 milhões de consumidores já tinham sido beneficiados pelo Desenrola Brasil. Ao todo, houve a renegociação de R$ 50 bilhões em dívida.
Superendividamento e o programa Desenrola Brasil
Diante do sucesso do programa, o Governo Federal editou, em março de 2024, uma nova MP nº 1.211/2024, para prorrogar a oferta do programa emergencial de renegociação de dívidas de pessoas físicas inadimplentes até 20 de maio de 2024.
A implementação do programa Desenrola Brasil deu força à aplicabilidade da Lei do Superendividamento e às ações para o combate deste problema. Tanto é que em outubro de 2023, próximo ao início do programa, o Deputado Afonso Motta, propôs o Projeto de Lei (PL) nº 1.409/2023, que amplia o conceito de superendividamento, para incluir, além das dívidas próprias das relações de consumo, dívidas civis em geral, como dívidas tributárias, contratuais e decorrentes de decisões judiciais.
Apesar do referido projeto ainda aguardar parecer do relator na Comissão de Defesa do Consumidor na Câmara dos Deputados, a propositura de um PL, para ampliação do escopo da Lei do Superendividamento, demonstra a disposição do poder legislativo de enfrentar o tema.
Tanto é que, em março de 2024, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com o apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública, atualizou a Recomendação CNJ nº 125/2021, que trata de mecanismos de prevenção ao superendividamento, para determinar que as audiências para renegociação de dívidas possam ocorrer no âmbito dos Procons e que os juízes coordenadores dos Centros de Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) ficarão responsáveis pela homologação dos referidos acordos.
A fim de que a medida seja efetiva, referidos órgãos se comprometeram a capacitar os agentes dos Procons, por meio de curso de formação que ficará hospedado no site da Escola Nacional de Defesa do Consumidor (ENDC) e, ao final, será concedido um certificado expedido pela Universidade de Brasília (UnB), aos participantes.
O CNJ também sinalizou parceira com a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), para criação de uma rede permanente de renegociação de dívidas, nos termos autorizados pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). Isso está em linha com as diretrizes de atuação da Senacon para 2024, pois, na 33ª Reunião entre os órgãos do Sistema Nacional do Consumidor (Sindec), ocorrida nos dias 7 e 8 de março, o Secretário Nacional Wadih Damous, sinalizou que uma das pautas recorrentes, da Senacon, para 2024 é a questão do superendividamento nas relações de consumo.
Portanto, passados três anos da vigência da Lei do Superendividamento, as autoridades brasileiras seguem focando esforços no combate ao problema do endividamento nas relações de consumo e implementando medidas para reforçar a aplicação da lei e para retirar o consumidor do limbo econômico e social.
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