Congresso Nacional aprova o Marco Legal dos Ativos Virtuais
PL ainda está sujeito à sanção presidencial e as prestadoras de serviços de ativos virtuais em atividade têm, no mínimo, seis meses para se adequarem às disposições apresentadas
Assuntos
O Projeto de Lei nº 4.401/2021 (Marco Legal dos Ativos Virtuais), aprovado pelo Congresso Nacional em 29 de novembro de 2022, dispõe sobre diretrizes a serem observadas na prestação de serviços de ativos virtuais e prevê aspectos para a regulamentação das prestadoras de serviços de ativos virtuais.
O texto em questão ainda altera: o Código Penal, para prever o crime de fraude na prestação de serviços com ativos virtuais; a Lei dos Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional (Lei nº 7.492/1986), para equiparar as prestadoras de serviços de ativos virtuais a instituições financeiras e a Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro (Lei nº 9.613/1998), para incluir as prestadoras de serviços de ativos virtuais no rol de suas disposições.
Até o presente momento, não havia legislação específica para regular as atividades no mercado de ativos virtuais, de modo que o Marco Legal dos Ativos Virtuais apresenta mudanças no arcabouço normativo, especialmente, sob aspectos regulatórios, compliance, consumeristas e penais.
Aspectos regulatórios
Ativo virtual
O Marco Legal dos Ativos Virtuais conceitua ativo virtual como a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para a realização de pagamentos ou com o propósito de investimento, não incluídos: moeda nacional e moedas estrangeiras; a moeda eletrônica, nos termos da Lei nº 12.865/2013, que dispõe sobre o Sistema de Pagamentos Brasileiro; instrumentos que provejam ao seu titular acesso a produtos ou serviços especificados ou a benefício proveniente desses produtos ou serviços, a exemplo de pontos e recompensas de programas de fidelidade; e representações de ativos cuja emissão, escrituração, negociação ou liquidação esteja prevista em lei ou regulamento, a exemplo de valores mobiliários e de ativos financeiros.
Vale destacar, ainda, que o disposto no Marco Legal dos Ativos Virtuais não se aplica aos ativos representativos de valores mobiliários sujeitos ao regime da Lei nº 6.385/1976, e caberá ao Poder Executivo, por meio da indicação de entidade e mais órgãos da Administração Pública Federal, estabelecer quais serão os ativos financeiros regulados, para fins do Marco Legal dos Ativos Virtuais.
Prestadora de serviços de ativos virtuais
Para fins do Marco Legal dos Ativos Virtuais, considera-se que a prestadora de serviços de ativos virtuais é a pessoa jurídica que executa, em nome de terceiros, ao menos uma das seguintes atividades: troca entre ativos virtuais e moeda nacional e estrangeira; troca entre um ou mais ativos virtuais; transferência de ativos virtuais; custódia ou administração de ativos virtuais ou de instrumentos que possibilitem controle sobre ativos virtuais; ou participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais.
Diretrizes
O Marco Legal dos Ativos Virtuais dispõe sobre diretrizes a serem observadas na prestação de serviços de ativos virtuais e na regulamentação das prestadoras de serviços de ativos virtuais.
Segundo as disposições, a prestação de serviço de ativos virtuais e regulamentação devem observar as seguintes diretrizes: livre iniciativa e concorrência; boas práticas de governança e abordagem baseada em riscos; segurança da informação e proteção de dados pessoais; proteção e defesa de consumidores e usuários; proteção à poupança popular; solidez e eficiência das operações e prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, além da proliferação de armas de destruição em massa, em alinhamento com os padrões internacionais.
Indicação de regulador e competências
O Marco Legal dos Ativos Virtuais não designa, expressamente, órgão responsável pela regulamentação dos ativos virtuais e dos prestadores de serviços de ativos virtuais, mas indica que o Poder Executivo atribuirá a um ou mais órgãos da Administração Pública Federal a disciplina dos ativos virtuais regulados, bem como do funcionamento e supervisão das prestadoras de serviços de ativos virtuais. Apesar de não haver a previsão expressa no texto aprovado, há a expectativa de que o Banco Central seja o órgão indicado como supervisor desse setor.
O regulador indicado terá as competências, com relação às prestadoras de ativos virtuais, para: autorizar seu funcionamento e a realização de reorganizações societárias; estabelecer condições para o exercício de cargos em órgãos estatutários e contratuais em prestadora de serviço de ativos virtuais e autorizar a posse e o exercício de pessoas para cargos de administração; supervisionar as suas atividades, incluindo a aplicação das regras previstas na Lei n° 13.506/2017, que dispõe sobre o processo administrativo sancionador; aplicar penalidades; cancelar a autorização para funcionamento de ofício ou mediante pedido; e dispor sobre as hipóteses em que suas atividades ou operações serão incluídas no mercado de câmbio.
Autorização para funcionamento
As prestadoras de serviços de ativos virtuais somente poderão funcionar no país mediante prévia autorização do regulador indicado, o qual, também, estabelecerá as hipóteses e os parâmetros em que a autorização poderá ser concedida mediante procedimento simplificado.
Cumulação de atividades por instituições autorizadas pelo Banco Central do Brasil
As instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil poderão prestar exclusivamente o serviço de ativos virtuais, ou cumulá-lo com outras atividades, na forma da regulamentação a ser editada pelo regulador indicado.
Aspectos de Compliance
As prestadoras de serviços de ativos virtuais foram incluídas no rol de entidades sujeitas às obrigações e mecanismos de controle de prevenção à lavagem de dinheiro, de modo passam a assumir obrigações relacionadas às práticas de identificação e manutenção de registros dos clientes (know your client), manutenção de registros de operações e transações as quais envolvam o manejo de ativos virtuais, bem como comunicação de atividades suspeitas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Além disso, eleva penalidades em caso do cometimento reiterado de crimes por meio da utilização de ativos virtuais.
Adicionalmente, a nova norma prevê, por meio de alterações à Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro, a criação do Cadastro Nacional de Pessoas Expostas Politicamente (CNPEP), a ser disponibilizado pelo Portal da Transparência além de instituir, para os órgãos e entidades de quaisquer Poderes da União, dos estados, Distrito Federal e municípios, a obrigação de encaminhar ao gestor designado do CNPEP informações atualizadas sobre seus integrantes ou ex-integrantes, classificados como pessoas expostas politicamente na legislação e regulação vigentes.
Ainda com relação ao recém-criado CNPEP, instituiu-se a obrigação de que pessoas obrigadas ao cumprimento da Lei de Prevenção à Lavagem consultem o respectivo cadastro entre os procedimentos necessários para cumprimento das obrigações e mecanismos de controle da Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro, sem prejuízo da condução de outras diligências exigidas na forma da legislação.
Aspectos consumeristas
O Marco Legal dos Ativos Virtuais prevê expressamente que, nas operações conduzidas no mercado de ativos virtuais, no que couber, deve ser aplicado as disposições do Código Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990).
Aspectos penais
O novo Marco Legal dos Ativos Virtuais altera o Código Penal para criar o crime de “fraude com a utilização de ativos virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros” (art. 171-A). O novo delito incorpora elementos do crime de estelionato (art. 171), aplicando-se especificamente a condutas relacionadas à organização, gestão, oferta em carteiras ou intermediação de operações envolvendo ativos digitais, com a finalidade de obtenção de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro mediante artifícios ou outros meios fraudulentos. As penas são de reclusão, de quatro a oito anos, e multa.
Diante das penas previstas, os indivíduos acusados não poderão firmar acordos de natureza penal com o Ministério Público, como a transação penal, a suspensão condicional do processo ou o acordo de não persecução penal.
O Marco Legal dos Ativos Virtuais também altera a Lei dos Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional. Foram acrescidas ao rol dos sujeitos equiparados a instituições financeiras as pessoas jurídicas ou físicas que ofereçam serviços vinculados a operações com ativos virtuais, incluindo-se sua intermediação, negociação ou custódia. Com isso, diversos crimes já previstos nessa lei passam a alcançar, também, situações que envolvam ativos virtuais.
O Marco Legal dos Ativos Virtuais ainda modifica a Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro para aumentar as penas de 1/3 a 2/3 aos indivíduos que utilizam ativos digitais para, reiteradamente, lavarem capitais.
Disposições Gerais
Importante notar que o regulador indicado estabelecerá condições e prazos, não inferiores a seis meses, para as prestadoras de serviços de ativos virtuais em atividade se adequarem às disposições do Marco Legal dos Ativos Virtuais.
O Marco Legal dos Ativos Virtuais está sujeito à sanção presidencial. Caso o presidente não se manifeste em até 15 dias, o Marco Legal dos Ativos Virtuais será considerado sancionado.
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