Publicada Instrução Normativa que regulamenta declaração e tributação de ativos no exterior
Ato da Receita Federal esclarece forma de declaração de ativos no exterior em 2024
A Instrução Normativa (IN) nº 2.180/2024 da Receita Federal do Brasil (RFB), publicada em 13 de março de 2024, regula a sistemática de tributação de ativos no exterior detidos por pessoas físicas residentes no Brasil, conforme regime previsto pela Lei nº 14.754/2023.
O texto publicado não se distancia das diretrizes promovidas pela Lei nº 14.754/2023, mas esclarece pontos importantes para fins de apresentação da Declaração de Ajuste Anual (DAA) do imposto sobre a renda da pessoa física (IRPF) referente ao exercício fiscal de 2023, que deverá ser feita entre 15 de março de 2024 e 31 de maio de 2024.
É importante ressaltar que essa é a primeira DAA a ser apresentada após a vigência da nova legislação, que definirá muitos elementos, alguns inclusive irreversíveis, a respeito da tributação aplicável aos ativos situados no exterior, o que faz com que este seja um momento de muita relevância e cautela para as pessoas físicas afetadas pelas novas regras.
Confira abaixo um quadro comparativo das regras inauguradas pela Lei nº 14.754/2023 e das diretrizes especificadas pela IN nº 2.180/2024 no que diz respeito a ativos situados no exterior:
Disposições gerais
Tema | Lei nº 14.754/2023 | IN nº 2.180/2024 |
Ativos detidos em condomínio | N/A | Cada condômino deverá cumprir individualmente suas obrigações em relação à parcela de que é titular. Não sendo possível identificar o valor atribuído a cada proprietário, o valor total deverá ser dividido igualmente entre os titulares |
Aplicações financeiras no exterior
Tema | Lei nº 14.754/2023 | IN nº 2.180/2024 |
Variação cambial da moeda estrangeira mantida em espécie | Isenção da tributação da variação cambial de moeda estrangeira em espécie até o limite de alienação de US$ 5.000,00. | Valores isentos deverão ser informados na ficha de Rendimentos Isentos e Não-Tributáveis da DAA |
Os ganhos de variação cambial na alienação de moeda estrangeira em espécie em valor superior a US$ 5.000,00 ficarão sujeitos à incidência do IRPF às alíquotas progressivas de 15% a 22,5%. | A IN apresenta de forma detalhada as métricas para a realização do cálculo do ganho de capital, dentre elas a utilização do custo médio e a necessidade de cálculo e pagamento do imposto serem realizados separadamente dos demais rendimentos tributáveis recebidos no mês. | |
Definição de aplicações financeiras no exterior | A lei trouxe um rol exemplificativo de aplicações financeiras, as quais são sujeitas à tributação quando haja disponibilização jurídica dos recursos aos investidores.
Dentre o rol exemplificativo a lei incluía as apólices de seguro cujo principal e cujos rendimentos sejam resgatáveis pelo segurado ou pelos seus beneficiários, bem como ativos virtuais e carteiras digitais. |
A IN trouxe um esclarecimento importante em relação às apólices de seguro, determinando que, se for permitido ao investidor definir ou influenciar a estratégia de investimento das apólices de seguro, esses produtos não serão tratados como aplicações financeiras no exterior, mas sim como entidades controladas no exterior.
A IN esclarece também que serão enquadrados como ativos virtuais as carteiras digitais e os arranjos financeiros com ativos virtuais com rendimentos que sejam a representação digital de outra aplicação financeira no exterior ou cuja natureza/caraterísticas os enquadre nessa definição. Para fins de aplicação de tal definição, ativos virtuais serão considerados localizados no exterior quando custodiados ou negociados por instituições localizadas no exterior, independentemente do local do emissor do ativo virtual e do arranjo. |
Compensação de perdas | Poderão ser compensadas as perdas com rendimentos auferidos em aplicações financeiras no mesmo período, com lucros e dividendos de entidades controladas apurados no mesmo período. Caso no final do prazo haja acúmulo de perdas não compensadas, essas poderão ser compensadas, em períodos posteriores, com rendimentos de aplicações financeiras. As perdas podem ser compensadas uma única vez. | IN esclarece que as perdas serão compensadas pelo seu valor nominal, sem correção ou atualização monetária ou de qualquer natureza. |
Imposto pago no exterior sobre aplicações financeiras | A lei permitiu que o investidor deduza do IRPF devido no Brasil o valor do imposto sobre a renda pago no país de origem dos rendimentos. A norma já estabelecia algumas condições e vedações gerais para a dedução como, por exemplo: a existência de acordo, tratado ou convenção internacional entre os países ou reciprocidade de tratamento. | A IN repete as condições e restrições trazidas pela lei, mas acrescenta alguns pontos como a determinação de que o imposto pago no exterior sobre determinada aplicação financeira não poderá ser utilizado para compensar o IRPF devido sobre outra aplicação financeira. A IN também trouxe a possibilidade de dedução do imposto sobre a renda pago pela entidade controlada declarada como transparente do IRPF devido pela pessoa física no Brasil. |
Entidades controladas no exterior
Tema | Lei nº 14.754/2023 | IN nº 2.180/2024 |
Classes de cotas ou ações com patrimônios segregados | Para fins da análise sobre o enquadramento de uma entidade controlada como sujeita às novas regras, a lei já estabelecia que, no caso de entidades com classes de cotas ou ações com patrimônios segregados, cada classe será considerada uma entidade separada para efeitos tributários. | IN esclarece que são tratadas como classe de cotas ou ações com patrimônio segregado as estruturas gerenciais, contratuais ou societárias que produzam efeito equivalente |
Enquadramento | Estarão sujeitas ao regime de tributação anual de lucros as entidades localizadas em jurisdição com tributação favorecida (JTF) ou beneficiária de regime fiscal privilegiado (RFP); e que apurem renda ativa própria inferior a 60% da renda total. | IN esclarece que o teste de renda ativa x renda passiva deverá ser realizado individualmente para cada controlada, direta ou indireta, e deverá ser feito anualmente. |
Tratamento contábil aplicável às entidades controladas | Os lucros das controladas serão apurados de forma individualizada em balanço anual da controlada, elaborado de acordo com os padrões internacionais de contabilidade – International Financial Reporting Standards (IFRS) ou aos padrões contábeis brasileiros.
Em tal apuração, serão excluídos dos resultados da controlada a parcela relativa à participação desta entidade controlada em outras controladas. |
IN esclarece que o balanço anual da controlada deverá ser assinado por contabilistas legalmente habilitados aos IFRS ou ao BR GAAP, que corresponde ao padrão contábil brasileiro.
O balanço deverá indicar os resultados apurados em decorrência das participações em outras controladas no exterior; e os resultados apurados em decorrência de participação em estruturas com controladas indiretas não enquadradas no conceito definido pela norma.
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Dedução de prejuízos | Poderão ser deduzidos do lucro da controlada os prejuízos por ela apurados em balanço, desde que referentes a períodos a partir de 01 de janeiro de 2024 e anteriores à data de apuração de lucros. | Para fins de dedução de prejuízos, a entidade controlada no exterior também deve se enquadrar no conceito definido pela norma no ano-calendário de apuração do prejuízo; e estar sujeita ao regime de tributação anual de lucro aplicável a tais entidades nos termos definidos pela norma.
Prejuízos acumulados pela entidade controlada a partir de 01 de janeiro de 2024, deverão ser registrados em conta específica do patrimônio líquido no balanço, de forma a possibilitar a sua dedução em exercícios futuros, na proporção da participação da pessoa física no período de apuração dos prejuízos. Caso contrário, os prejuízos acumulados não poderão ser compensados e deverão ser registrados em conta específica do patrimônio líquido no balanço. |
Lucro previamente tributado | Os lucros das controladas sujeitas ao regime de tributação anual de lucros serão incluídos na DAA, na ficha de Bens e Direitos, como custo de aquisição de crédito de dividendo a receber da controlada. | No momento de distribuição de dividendos baseados em lucros previamente tributados entre controladas sujeitas ao regime de tributação anual de lucros, o contribuinte deverá transferir o crédito de dividendo a receber de uma controlada para outra na DAA. |
Lucros apurados até 2023 | Serão tributados no momento da efetiva disponibilização para a pessoa física residente no Brasil os lucros apurados até 31 de dezembro de 2023 pelas entidades controladas no exterior que se enquadrem no conceito definido pela norma | Lucros acumulados até 31 de dezembro de 2023, deverão ser destacados em conta específica de reserva de lucros no balanço da entidade controlada – o que requer atenção especial na hora de apresentar as demonstrações contábeis do exercício encerrado em 31 dezembro de 2023. Caso esta detenha participação em controlada indireta, a parcela registrada no seu balanço correspondente ao lucro da controlada indireta também deverá ser destacada em conta específica de reserva de lucros.
A disponibilização de lucros acumulados entre controladas sujeitas ao regime de tributação anual de lucros não ficará sujeita ao IRPF. Porém, a disponibilização de lucros por uma entidade controlada indireta sujeita ao regime de tributação anual de lucros para outra controlada submetida ao regime da transparência fiscal por opção do contribuinte, será considerada como disponibilização de lucros para a pessoa física residente no Brasil, para fins de IRPF. |
N/A | O contribuinte poderá compensar com o IRPF devido mediante disponibilização o imposto retido no exterior sobre os dividendos distribuídos pela mesma entidade controlada. | |
Tributação sob o regime da transparência fiscal | O contribuinte que optar pelo regime de transparência fiscal deverá substituir, na ficha de Bens e Direitos da mesma DAA, a participação na entidade pelos bens e direitos subjacentes, alocando o custo de aquisição para cada um desses de acordo com a proporção de seu valor em relação ao valor total do ativo da entidade em 31 de dezembro de 2023. | São trazidas fórmulas para realização do cálculo para a realização de tal substituição, sendo que o somatório dos custos de aquisição dos bens e direitos atribuídos não poderá ser superior ao valor do custo de aquisição original declarado na DAA. |
O contribuinte que optar pelo regime de transparência fiscal deverá indicar sua opção na DAA a ser entregue até 31 de maio de 2024, produzindo efeitos retroativos a partir de 01 de janeiro de 2024. | Nos casos de participações adquiridas por sucessão, legado ou doação a partir de 01 de janeiro de 2024, o contribuinte poderá alterar a opção realizada na declaração de bens do de cujus ou do doador, desde que o valor total registrado na ficha de Bens e Direitos da DAA seja igual ao valor registrado na ficha de Bens e Direitos do sucedido. | |
N/A | Os valores pagos ou creditados pelas controladas sujeitas ao regime da transparência fiscal, a título de lucros ou decorrentes de baixa, liquidação ou devolução do capital investido que já tiverem sido tributadas no referido regime não serão tributadas novamente no momento do pagamento do crédito. |
Trust
Tema | Lei nº 14.754/2023 | IN nº 2.180/2024 |
Prazo para alteração da escritura do trust ou carta de desejos | É estabelecido o prazo de 180 dias, a contar da publicação da Lei, para que o instituidor do trust ou seus beneficiários alterem a escritura do trust ou a respectiva carta de desejos, para constar redação que obrigue, de forma irrevogável e irretratável, o atendimento, pelo trustee, das disposições previstas na Lei (art. 10, § 6º, da Lei). | IN prevê, expressamente, o dia 12 de dezembro de 2023 como termo inicial para contagem do prazo de 180 dias |
Atualização do valor de ativos no exterior
Tema | Lei nº 14.754/2023 | IN nº 2.180/2024 |
Possibilidade de exercício da opção pela atualização | Não poderão ser objeto de atualização, ativos não declarados na DAA entregue em 2023; ativos alienados, baixados ou liquidados em período anterior a 31 de maio de 2024, prazo para formalização da opção pela atualização e outros bens específicos, como moeda estrangeira em espécie, joias, obras de arte etc. | Não poderão ser objeto de atualização bens e direitos adquiridos no decorrer de 2023 ou localizados no Brasil.
A vedação à opção pela atualização de ativos não declarados na DAA entregue em 2023 não se aplica às controladas indiretas, quando a controlada direta tiver sido declarada na DAA relativa ao ano-calendário de 2023, ou na hipótese em que o contribuinte não estava obrigado a apresentar a DAA em 2023. Já a vedação à opção pela atualização de ativos alienados, baixados ou liquidados em período anterior a 31 de maio de 2024, a IN trouxe flexibilização importante para que o contribuinte possa pagar o IRPF considerando o custo de aquisição atualizado, desde que, após tal tributação, efetive a opção pela atualização e pague o imposto tempestivamente. |
Forma de exercício da opção pela atualização | A opção pela atualização do valor não era detalhada na lei. | A opção pela atualização do valor de ativos no exterior será exercida mediante a apresentação da Declaração de Opção pela Atualização de Bens e Direitos no Exterior (Abex) e pagamento integral do IRPF à alíquota de 8%, até 31 de maio de 2024. Cumpridos tais requisitos, produzirá efeitos a partir de 01 de janeiro de 2024, aplicando-se o novo custo de aquisição dos ativos atualizados inclusive aos fatos geradores ocorridos entre 01 de janeiro de 2024 e 31 de maio de 2024. Não produzirá efeitos a Abex desacompanhada do pagamento do imposto.
A Abex será elaborada em formato eletrônico, através do portal e-CAC, pelo contribuinte ou por representante, entre 15 de março de 2024 e 31 de maio de 2024, e poderá ser retificada até 31 de maio de 2024, prazo para pagamento do imposto apurado, sem aplicação de quaisquer deduções. Caso a Abex se refira a ativos ainda não declarados, em vez de seu valor na última DAA relativa ao ano-calendário de 2022, o contribuinte deverá indicar o seu custo de aquisição. Além disso, caso apresentada pelo espólio, deverá também indicar o CPF do meeiro e do inventariante. Já na hipótese de atualização de ativos detidos em condomínio ou por uma mesma entidade familiar, cada titular deverá apresentar uma Abex em relação à parcela de que é titular (art. 54, § 2º, da IN) ou em CPF próprio, na proporção de sua participação. Não sendo isso possível, o valor deverá ser distribuído igualmente entre os titulares. |
Apuração do imposto | N/A | Caso a entidade controlada possua classes diferentes de ações ou cotas com direito ao recebimento de lucros independentemente do seu percentual de participação no capital social, o valor do patrimônio líquido tributável na atualização será proporcional às participações da pessoa física no capital social e nos lucros. |
Como é possível identificar, a entrega da DAA deste ano será o ponto de partida para a nova sistemática e legislação que as pessoas físicas residentes no Brasil estarão sujeitas e determinará diversos aspectos fiscais aplicáveis aos investimentos no exterior, razão pela qual é de suma importância que os investidores avaliem com cautela os detalhes acerca da forma como serão declarados os ativos e apresentadas as informações contábeis dos investimentos em controladas no exterior.
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