

Empresas podem ser responsabilizadas pelo tráfego de caminhões com excesso de peso
A Primeira Seção do STJ afirma que o tráfego de caminhões com excesso de peso gera danos materiais e morais coletivos, mas não define os critérios para quantificação da indenização
Em 4 de dezembro de 2024, foi publicado o acórdão da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça que julgou o Tema nº 1.104/STJ, encerrando relevante debate jurídico que se estendia há anos a respeito da possibilidade de responsabilização de transportadoras e embarcadoras de carga por alegados danos materiais e morais causados pelo tráfego de caminhões com excesso de peso nas rodovias federais.
No julgamento, a Primeira Seção, por unanimidade, negou provimento ao Recurso especial 1.908.497-RN e deu provimento ao REsp. 1.913.392-MG, ambos afetados como representativos de controvérsia, para fixar a tese de que “o direito ao trânsito seguro, bem como os notórios e inequívocos danos materiais e morais coletivos decorrentes do tráfego reiterado em rodovias de veículos com excesso de peso autorizam a imposição de tutela inibitória e a responsabilização civil do agente infrator”.
O encaminhamento dado pelo Superior Tribunal de Justiça representa importante construção de consenso a respeito da configuração da responsabilidade civil nas hipóteses de descumprimento do disposto no art. 231, inc. V, do Código de Trânsito Brasileiro, e da inexistência de duplicidade de penas nos casos em que já houve a punição prévia da conduta na esfera administrativa.
De todo modo, a decisão ainda não é definitiva, já que em 11 de dezembro de 2024, foram opostos embargos de declaração contra o acórdão da Primeira Seção buscando a fixação de tese no sentido de que é inviável a responsabilização civil e fixação de multa administrativa pela simples incorrência em conduta de tráfego de veículo com excesso de peso em rodovia federal. Assim, em futuro breve, poderemos ter novos desdobramentos a respeito do Tema nº 1.104/STJ.
Entendimento do STJ
A conclusão do STJ, até o momento, é a de que, à luz dos princípios da inafastabilidade da jurisdição e da independência das instâncias punitivas, não se exclui da apreciação do Poder Judiciário o descumprimento reiterado da legislação de trânsito, sobretudo quando houver desproporcionalidade entre a sanção administrativa e o benefício auferido pelo infrator reincidente.
Nos termos do voto do Ministro relator, “a sanção administrativa prevista pelo Código de Trânsito Brasileiro não afasta as demais formas de resposta estatal previstas pelo Ordenamento para prevenir, reparar e reprimir o tráfego de veículo de carga com excesso de peso nas rodovias”, inclusive via ajuizamento de ação civil pública.
Ainda assim, a Primeira Seção do STJ compreendeu que caberá às instâncias ordinárias a fixação dos patamares para a apuração do valor devido. Dessa forma, o julgamento não resolve, na prática, a ausência de critérios a serem observados para a quantificação das indenizações.
Como consequência, está mantida a inexistência de métrica – técnica ou definida pelo Poder Judiciário – para identificar os eventuais prejuízos diretamente causados às rodovias pelo tráfego de veículos com excesso de peso.
Conforme abordado em texto anteriormente publicado no Único sobre o tema, isso torna extremamente difícil a tarefa dos julgadores e traz insegurança aos jurisdicionados, pois apesar de a Primeira Seção ter concluído que é fato notório (que não depende de provas, portanto) que o tráfego de caminhões com excesso de peso provoca danos materiais às vias públicas, há uma série de fatores externos que fogem completamente da ingerência das transportadoras e embarcadoras que concorrem para o desgaste dos pavimentos asfálticos das rodovias federais e devem ser considerados no processo de quantificação das indenizações.
Logo, ainda que o julgamento do Tema nº 1.104/STJ represente importante marco jurisprudencial sobre a matéria, ainda há muito a se definir para que seja resolvida a totalidade das disputas relativas à matéria.
Será necessário acompanhar, na prática, o tratamento a ser conferido à tese pelos Tribunais Regionais nas ações civis públicas que estavam sobrestadas e deverão voltar a tramitar em breve.
Além disso, há de se aguardar eventuais movimentações do Ministério Público Federal em procedimentos administrativos ou em novas ações civis públicas a serem distribuídas para compreender o efetivo impacto macrofinanceiro que o julgamento do Tema nº 1.104/STJ exercerá no mercado de transporte de cargas.
Para mais informações e atualizações sobre o tema, acompanhe a prática de Contencioso e Arbitragem do Mattos Filho.