

Reforma do Código Civil: impactos do novo PL sobre as relações familiares e patrimoniais
Projeto de lei traz alterações no direito de família e sucessões que afetam significativamente as pessoas físicas
Foi publicado pelo Senado Federal, em 31 de janeiro de 2025, o Projeto de Lei (PL) nº 4/2025, que tem como objetivo atualizar e introduzir alterações no Código Civil. O PL inaugura o processo legislativo para deliberação e possível aprovação de lei que pode resultar em quase 900 modificações e na inclusão de 300 novos dispositivos ao Código Civil.
Dentre tais proposições, as quais abrangem diversos ramos do direito civil, como contratos, direito empresarial e direitos reais, são especialmente relevantes para as pessoas físicas aquelas relacionadas a aspectos familiares e sucessórios.
Veja abaixo algumas das principais mudanças contidas no PL relativas ao tema:
Contratualização de questões sucessórias
- Passam a ser permitidos, por não serem considerados contratos trazendo disposição sobre herança de pessoa viva, os documentos firmados entre herdeiros necessários conjuntamente, para dispor sobre colação de bens, partilha de participações societárias e doações inoficiosas; e cônjuges ou conviventes, com o objetivo de renunciar à condição de herdeiro;
- A análise acerca da nulidade de uma doação (por exemplo, se ela ultrapassa ou não a metade que o doador poderia dispor se estivesse fazendo seu testamento) será realizada com base no valor nominal do excesso no momento de sua ocorrência, corrigido monetariamente até a data da restituição, e não no momento da morte do doador;
- É considerada válida a promessa de alienação ocorrida antes da partilha, por qualquer herdeiro, de bem singular que compõe a herança, mas tal promessa apenas produzirá efeitos se o bem for atribuído ao quinhão do herdeiro que prometeu aliená-lo.
Regime de bens
- É autorizada a celebração de pactos conjugais ou convivenciais antes ou depois de celebrado o casamento ou constituída a união estável, sendo vedada a atribuição de efeitos retroativos ao regime, inclusive com a previsão de alteração automática em função de tempo. Em termos práticos e exemplificativamente, o pacto poderá prever que os primeiros cinco anos do casamento serão regidos pela separação total de bens e que, a partir do 6º ano, o casamento será regido pela comunhão parcial sem que haja necessidade de ação judicial para alteração de regime de bens;
- É prevista, no regime da comunhão parcial de bens, a comunicabilidade da valorização das participações societárias ocorrida na constância da relação, em decorrência, por exemplo, de melhoria na performance da sociedade ou do aumento de seu capital social; e da valorização das participações societárias em decorrência da capitalização (reinvestimento) de lucros na sociedade ocorrida na constância da relação – ainda que a aquisição das participações tenha ocorrido antes do casamento;
- São revogados os dispositivos referentes aos regimes da participação final nos aquestos e da separação obrigatória de bens;
- Admite-se, no regime da separação total de bens, a divisão de bens adquiridos com a contribuição comum dos cônjuges ou conviventes, respeitada sua proporcionalidade.
Pensão alimentícia compensatória
- As espécies de pensão alimentícia são divididas em: alimentos devidos ao nascituro e à gestante; alimentos devidos ao(à) cônjuge/companheiro(a); e alimentos compensatórios que serão devidos ao(à) cônjuge/companheiro(a) que sofrer com queda brusca em seu padrão de vida por ocasião do divórcio ou dissolução da união estável, nas hipóteses em que houver desequilíbrio econômico entre as partes;
- No que se refere aos alimentos compensatórios, supera-se discussões antigas na doutrina e na jurisprudência sobre o tema, para firmar entendimento no sentido de que, no divórcio ou dissolução da união estável sob o regime da separação total de bens, o juízo competente poderá fixar alimentos compensatórios em benefício do(a) cônjuge/companheiro(a) que trabalhou na residência e nos cuidados da família e, portanto, sofreria prejuízo em suas condições financeiras.
Herança digital
- Passa a ser expressamente previsto que os bens digitais integram a herança do falecido quando têm valor econômico apreciável, a exemplo de senhas, perfis em redes sociais, vídeos e fotos. As mensagens privadas do falecido, por sua vez, não poderão ser acessadas por seus herdeiros, exceto se o acesso a tais comunicações for previsto pelo falecido em manifestação de última vontade ou autorizado pelo juízo competente.
Quem tem direito à herança?
- São incluídos no rol os filhos do falecido gerados por técnica de reprodução humana post mortem e excluídos da sucessão os herdeiros que tiverem deixado de prestar assistência material ou tiverem abandonado afetivamente, de forma voluntária e injustificada, o falecido;
- É alterada a ordem de participação dos herdeiros necessários na porção legítima, com exclusão do cônjuge na hipótese de descendentes ou ascendentes vivos, determinando-se que a sucessão legítima se defere na seguinte ordem: descendentes; ascendentes; cônjuge ou convivente sobrevivente; e colaterais até o quarto grau.
- Cônjuge e companheiro são afastados do rol de herdeiros que não podem ser afastados da herança, sendo reconhecidos como herdeiros necessários os descendentes e os ascendentes;
- É assegurado ao herdeiro com quem o falecido conviveu e que agiu com zelo e cuidado em seu favor o direito ao recebimento imediato de 10% de sua participação na herança.
Liberdade do testador para impor gravames sobre a herança
- É afastada a exigência de indicação de justificativa pelo testador ao estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade sobre os bens da legítima.
Agilidade no processo de inventário
- É permitido ao juízo do inventário, na ausência de disposição testamentária, a atribuição preferencial, na partilha, a pedido do interessado: de participações societárias ao herdeiro que já figure como sócio ou administrador na sociedade, com pagamento do saldo aos demais; ou de imóvel ao herdeiro que já o utiliza para fins residenciais ou profissionais.
Diante das diversas atualizações propostas – que, se aprovadas pelo Senado Federal, entrarão em vigor no prazo de um ano após a data de sua publicação –, é necessário se revisar de forma detalhada os mecanismos de planejamento patrimonial e sucessório atualmente adotados pelas famílias, a fim de compatibilizá-los com a reforma da lei e assegurar maior estabilidade e segurança às relações e ao patrimônio.
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