

Novo decreto define parâmetros e avaliação de programas de integridade na Lei de Licitações
As mudanças indicam caminhos para a implementação da cultura de compliance e integridade a ser adotada pelas empresas privadas, especialmente em contratos com a administração pública
O Decreto nº 12.304/2024 publicado, em 9 de dezembro de 2024, estabelece os critérios para a avaliação dos programas de integridade tratada pela Lei nº14.133, de abril de 2021 (Lei de Licitações e Contratações Públicas).
A Lei de Licitações e Contratações Públicas incentiva a implementação e o desenvolvimento dos programas de integridade pelos licitantes ao prever que será requisito obrigatório ao licitante vencedor de contratações para realização de obras de grande vulto (acima de R$ 239 milhões); fator de desempate entre duas ou mais propostas; condição para a reabilitação de licitante ou contratado, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Essas previsões visam mitigar riscos associados a fraudes e a corrupção.
Com o intuito de dispor concretamente sobre os requisitos aplicáveis aos programas de conformidade, o Decreto nº 12.304/2024 sanou pontos controvertidos e indicou caminhos para a implementação da cultura de compliance e integridade a ser adotada pelas empresas privadas, especialmente em contratos com a administração pública.
Vale lembrar ainda que, a interpretação e a avaliação dos programas de integridade também são tratados no Decreto nº 11.129, de julho de 2022 (Decreto Anticorrupção), o qual define que o programa de integridade consiste “no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes, com o objetivo de prevenir, detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira e fomentar e manter uma cultura de integridade no ambiente organizacional”.
Além disso, o Decreto Anticorrupção elenca quinze parâmetros que devem ser observados na avaliação dos programas de integridade nas hipóteses em que forem aplicáveis as sanções da Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013 (Lei Anticorrupção). Os mesmos 15 parâmetros foram replicados no Decreto nº 12.304/2024, havendo como única adição, o inciso IX, que exige mecanismos específicos para assegurar o respeito aos direitos humanos e trabalhistas, bem como a preservação do meio ambiente. Essa adição também está alinhada às diretrizes da Controladoria-Geral da União (CGU), que tem voltado a atenção para os princípios ESG (Environmental, Social and Governance) nas práticas corporativas.
Outro fator comum entre o Decreto nº 12.304/2024 e o Decreto Anticorrupção é a previsão de que o programa de integridade deve ser estruturado, aplicado e atualizado de acordo com as características e os riscos atuais das atividades de cada pessoa jurídica, a qual, por sua vez, deve garantir o constante aprimoramento e a adaptação do referido programa, visando garantir sua efetividade.
Aspectos práticos esclarecidos pelo Decreto nº 12.304/2024
O Decreto nº 12.304/2024 ainda esclarece alguns aspectos práticos que não estiveram bem definidos na Lei de Licitações e Contratações Públicas, como por exemplo que os aditivos acima de R$ 239.624.058,14 serão enquadrados como contratação de grande vulto e que a comprovação do programa de integridade deverá ser apresentada a partir da assinatura do aditivo e que, na hipótese de contrato firmado por pessoas jurídicas em consórcio, todas as consorciadas comprovarão a implantação do programa de integridade em até seis meses da assinatura do contrato.
No contexto de desempate de propostas em processos licitatórios, o Decreto nº 12.304/2024 estabelece que os licitantes devem apresentar, no momento da proposta no processo licitatório, a declaração de que possuem um programa de integridade implementado. A regulamentação do modelo dessa declaração será feita por ato próprio do Ministro da CGU. Em situações de empate, será assegurada a preferência sucessivamente, aos bens e serviços produzidos ou prestados por:
- Empresas estabelecidas no território do Estado ou do Distrito Federal do órgão ou entidade da Administração Pública estadual ou distrital licitante ou, no caso de licitação realizada por órgão ou entidade de Município, no território do Estado em que este se localize;
- Companhias brasileiras;
- Empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País, e que comprovem a prática de mitigação.
Para reabilitação quanto à sanção o licitante ou o contratado deve apresentar, quando o pedido de reabilitação for submetido, uma documentação hábil a comprovar a implantação ou o aperfeiçoamento do programa de integridade, considerada a adoção das medidas de remediação em face dos fatos que ensejaram a aplicação da sanção.
Papel da CGU e procedimentos de avaliação no decreto
O Decreto nº 12.304/2024 dispõe que a CGU foi definida como a autoridade que terá um papel ativo para realizar as atividades de natureza preventiva (orientação, supervisão e avaliação) e as atividades repressivas (ocorrerão por meio dos processos de responsabilização).
Uma vez realizada a avaliação do programa de integridade, a CGU encaminhará o relatório de avaliação à unidade de gestão de contratos, ou área equivalente, do órgão ou da entidade contratante, para adoção das providências pertinentes. Quando concluída a avaliação sobre o desenvolvimento ou o aperfeiçoamento do programa de integridade, o atestado será válido pelo prazo de vinte e quatro meses.
A CGU poderá dispensar a obrigação de submissão da documentação do programa de integridade e a avaliação quando a pessoa jurídica que tiver sido aprovada e com reconhecimento ainda vigente em programa específico de fomento à ética e à integridade privada, como por exemplo o Pró-Ética. A CGU ainda pode reconhecer a avaliação realizada por outro ente público; emitir solicitação de informe ou regularização, para que sejam adotadas as providências necessárias por parte do licitante ou do contratado nas situações que demandem encaminhamento; propor plano de conformidade, que estabelecerá objeto, prazos, medidas a serem adotadas pelo licitante ou pelo contratante, critérios e formas de acompanhamento, nas hipóteses em que a avaliação do programa de integridade concluir que não houve a implantação, o desenvolvimento ou o aperfeiçoamento adequados.
Na atividade repreensiva, o licitante ou o contratado poderá ser responsabilizado administrativamente quando praticar as seguintes infrações:
- Deixar de entregar ou, injustificadamente, entregar fora do prazo a documentação referente ao programa de integridade;
- Omitir ou se recusar a prestar, injustificadamente, informações ou documentos necessários à comprovação da implantação, do desenvolvimento ou do aperfeiçoamento do programa de integridade;
- Descumprir, injustificadamente, os prazos e as medidas estabelecidos em plano de conformidade;
- Dificultar a atuação da CGU;
- Atuar de forma fraudulenta quanto aos documentos e às informações que comprovem a implantação, o desenvolvimento ou o aperfeiçoamento do programa de integridade; ou
- Apresentar declaração falsa para fazer jus ao critério de desempate previsto no art. 60 da Lei de Licitações e Contratos Públicos.
As infrações de que trata o Decreto nº 12.304/2024, quando também corresponderem a atos lesivos tipificados na Lei Anticorrupção, serão apuradas e julgadas conjuntamente, nos mesmos autos, e seguirão o procedimento nela previsto por meio de processos administrativos de responsabilização (PAR) conduzido pela CGU e que observará os procedimentos previstos pelo Decreto Anticorrupção e pela IN 13/2019.
Por fim, na hipótese de ser concluído que houve infração, a empresa será passível de sanção de advertência; e/ou multa, de, no mínimo, 1% a no máximo 5%, do valor da licitação ou do contrato e/ou declaração de inidoneidade para licitar ou contratar. Ainda, se o descumprimento das obrigações também implicar na aplicação da Lei Anticorrupção, serão aplicáveis as sanções previstas no art. 6º daquela lei.
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