Nova Lei de Licitações: entenda as mudanças em contratações públicas e reserva de vagas
Cargos para pessoas com deficiência e reabilitados da Previdência Social devem ser reservados até o fim da vigência do contrato
Assuntos
A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei Federal nº 14.133/2021), em vigor desde o dia 1º de abril de 2021, congrega temas que ainda devem gerar importantes discussões ao longo dos próximos anos. Apesar de muitos vislumbrarem o novo dispositivo somente como um compilado de legislações e práticas pré-existentes, a nova lei apresenta inovações que podem trazer impactos significativos nas contratações públicas.
Dentre muitos pontos, a questão da reserva de cargos para pessoas com deficiência (PcDs) e reabilitados da Previdência Social merece destaque. A novidade é clara: as empresas licitantes deverão comprovar sistematicamente o cumprimento de tais reservas, sob o risco de inabilitação e sanções estabelecidas pela nova lei, bem como pelas normas específicas que regulam o assunto.
Legislação específica
A Lei Federal 8.213/1991 instituiu uma política afirmativa para inserção de PcDs e pessoas reabilitadas pela Previdência Social no mercado de trabalho à razão da força de trabalho das empresas com 100 ou mais empregados, conforme os números estabelecidos no art. 93. Neste sentido, as empresas devem preencher de 2% a 5% de seus quadros com empregados com deficiência.
Vale ressaltar que o término do contrato de trabalho por prazo determinado de trabalhador com deficiência, ou a rescisão imotivada de contrato de trabalho por prazo indeterminado, só deve ocorrer após a empresa contratar trabalhador em igual condição (art. 93, § 1º) ou caso a empresa esteja cumprindo a cota legal.
Reserva de vagas como requisito de habilitação
Enquanto a lei anterior utiliza o cumprimento de reserva de cargos como critério de desempate (art. 3º, § 2º, V da Lei Federal 8.666/1993), a nova lei determina que, na fase de habilitação, a licitante deverá apresentar declaração de que cumpre as exigências de reserva de cargos para pessoa com deficiência e para reabilitado da Previdência Social. Se na Lei Federal 8.666/1993 tratava-se de questão secundária, na Lei Federal 14.133/2021, o tema passa a ser requisito formal de habilitação no procedimento licitatório (art. 63, IV).
O que agora é regra geral para todas as licitações, antes já era uma prática em certames de pregão eletrônico no portal de compras do Governo Federal (Comprasnet), uma vez que os processos exigem em campo eletrônico específico o preenchimento de declaração de atendimento a tais termos, sob risco de inabilitação da empresa que declarar o não cumprimento da reserva de cargos.
Nos últimos anos, discussões acerca da função horizontal das licitações vem ganhando expressividade. Não obstante seja a aquisição de bens e serviços a função primária da contratação administrativa, sendo os critérios de menor preço e melhor técnica alçados a uma posição de relevo, de acordo com o tipo de licitação, a Administração Pública pode se utilizar do seu poder de compra para promover outras questões que geralmente estão relacionadas à ideia de desenvolvimento nacional sustentável. As vertentes podem ser muitas, levando-se em conta aspectos como industriais, sociais ou ambientais. Logo, percebe-se que esse tema é mais um aceno para o ideal de que as contratações públicas podem ser, também, um instrumento para a promoção de objetivos de cunho social.
Penalidades em razão de eventual descumprimento
Além do risco de inabilitação para licitantes que não apresentarem a declaração sobre cumprimento da reserva de cargos, os contratados deverão, necessariamente, cumprir com a reserva de cargos ao longo de todo o período de vigência do contrato. Sempre que solicitado pela Administração, a empresa deverá apresentar provas do cumprimento da reserva dos respectivos cargos (art. 116 da Lei Federal 14.133/2021).
Eventual descumprimento durante a execução contratual pode constituir motivo para a extinção do contrato, assegurado o direito de defesa.
Isso tende a gerar problemas para empresas que participam de certames públicos, dada a dificuldade que muitas companhias encontram na busca, atração, contratação e retenção de PcDs, especialmente quando há exigência de alto nível de qualificação dos profissionais. Nessa linha, além de ser tema fiscalizado no âmbito da legislação trabalhista, a questão também ficará em evidência nas licitações e pode se tornar crítico, sobretudo para empresas cuja parcela relevante de faturamento advém de contratos celebrados com entes públicos.
Em suma, mesmo diante do interregno dos próximos 2 anos, nos quais os órgãos públicos poderão optar entre utilizar as normas antigas ou a nova lei, as empresas, desde já, devem atentar-se à questão da reserva de cargos, haja vista que ela será determinante tanto para o sucesso na habilitação no âmbito de certames como para a regularidade da execução contratual.
E, se as empresas se depararem com uma dificuldade de contratação e manutenção de postos de trabalho preenchidos por empregados PcDs, diante da escassez dessa mão de obra em determinadas regiões do país, ou mesmo em razão da necessidade da alta especialização desses trabalhadores, devem buscar alternativas legais que poderão envolver uma análise multidisciplinar, com vistas a evitar o risco de inabilitação como licitantes ou mesmo o encerramento do contrato público.
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