Dano social consumerista por cobrança reiterada dos juros abusivos é reconhecida por TJ-SP
O acórdão reconhece a modalidade de indenização para ações coletivas de consumo e determina a expedição de ofícios a diversas autoridades fiscalizadoras
O acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), que julgou o recurso de apelação n° 1031794-84.2021.8.26.0196, publicado em 28 de julho de 2023, entendeu que a cobrança habitual de juros tidos como exorbitantes representa “indícios efetivos da ocorrência do denominado dano social”.
O termo dano social foi proposto pelo professor Antonio Junqueira de Azevedo no artigo “por uma nova categoria de dano na responsabilidade civil: o dano social”, publicado na Revista Trimestral de Direito Civil, v. 5, n. 19, p. 211-218, jul./set. 2004, e refere-se a uma categoria de dano na responsabilidade civil que corresponde a “lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança – quanto por diminuição de sua qualidade de vida”. Para o professor Junqueira, a reparação a esse dano tem duas perspectivas: punição, em razão de o agente ter agido com dolo ou culpa grave, e dissuasão, para que não haja a repetição do ato ilícito, tanto pelo agente quanto por terceiros.
Para além da teoria do professor Junqueira, o TJ-SP invocou como fundamento do acórdão o Enunciado 456 da V Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, segundo o qual “A expressão “dano” no art. 944 abrange não só os danos individuais, materiais ou imateriais, mas também os danos sociais, difusos, coletivos e individuais homogêneos a serem reclamados pelos legitimados para propor ações coletivas.”
Tem-se, portanto, que o dano social compreende a violação aos valores de determinada coletividade e tem natureza indenizatória e dissuasória em razão da diminuição da qualidade de vida e do patrimônio imaterial dos membros da sociedade. Ao aplicar o instituto, a 22ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP, por unanimidade de votos, ressaltou que a “reiteração do mesmo comportamento lesivo aos legítimos direitos e interesses do consumidor direciona os contornos da fattispecie para a configuração de lesão ao patrimônio da sociedade” e, como consequência, estariam caracterizados indícios de dano social consumerista.
O desembargador relator Roberto Mac Cracken mencionou a existência de 50 processos que tramitaram perante o TJ-SP com tema análogo ao julgado, envolvendo cobrança de taxas de juros remuneratórios com percentual igual ou superior a 20% ao mês, para concluir que a “exorbitância e impropriedade na taxa mensal de juros cobrados na adimplência, afronta a denominada ordem social e econômica reproduzindo, na realidade, indícios do denominado dano social”. Isso porque a conduta da instituição financeira teria ocorrido de forma difusa, atingindo “valores sociais insuperáveis” e fazendo incidir a teoria do dano social.
Apesar do reconhecimento do dano social, o acórdão não fixou indenização correspondente, dada a inexistência de pedido nesse sentido. Em contrapartida, o Tribunal determinou a expedição de ofícios à Senacon, PGJ-SP, MP-SP, DP-SP, Nudecon/SP, Procon/SP e Banco Central, para que “se assim entenderem, dentro da sua plena liberdade de convencimento e nas suas áreas de competências próprias, tomem as providências que entenderem como adequadas”. Os ofícios foram expedidos em 4.8.2023.
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*Com a colaboração de Maria Carolina Vitorino Lopes.