

O próximo passo no combate aos vieses inconscientes de gênero no ambiente trabalho
Sub-representação de mulheres em cargos de liderança e desigualdade nas oportunidades de carreiras são alguns dos reflexos desses padrões de pensamento
Falar sobre vieses inconscientes, especialmente sobre os de gênero, está longe de ser uma novidade e, possivelmente, já é uma pauta bastante conhecida e discutida por profissionais no âmbito corporativo, acadêmico e midiático. Mesmo assim, ainda hoje, segue sendo uma agenda prioritária e necessária para a estratégia das organizações que buscam sua sustentabilidade no longo prazo.
Resgatando o termo, vieses inconscientes são padrões de pensamento que influenciam nossa tomada de decisões e comportamentos quando atuamos de maneira automática e, muitas vezes, sem que os percebamos. São moldados por nossa cultura, experiências de vida, crenças e preconceitos, entre outros fatores.
Uma de suas manifestações é o viés de gênero, que, como dito, está presente em muitas empresas e organizações de todo o mundo. Ele se manifesta de diversas formas, incluindo a falta de igualdade em oportunidades de carreiras para mulheres, diferença salarial entre os gêneros para mesma função, pela sub-representação de mulheres em cargos de liderança e com poder de decisão. Um dos principais desafios enfrentados pelas mulheres em organizações é a cultura patriarcal, que resulta em falta de diversidade em cargos de liderança, ausência de políticas eficazes de conciliação entre trabalho e vida pessoal e uma percepção de que mulheres não são tão capazes quanto homens.
Há, também, o viés de afinidade, que nos aproxima de pessoas que se parecem conosco ou com quem temos algo em comum. Isso pode levar a decisões injustas pela falta de conhecimento de outras realidades, como contratar profissionais com quem temos afinidade em vez de selecionar as pessoas mais qualificadas para uma determinada posição. Nesse sentido, em ambientes que tradicionalmente foram ocupados por homens, a falta de referência de mulheres em posição de destaque acaba contribuindo com a perpetuação dos vieses.
Na mesma linha, também temos o viés de estereótipo, que nos leva a formar opiniões preconcebidas sobre grupos de pessoas com determinadas características ou particularidades. Esse viés gera comportamentos discriminatórios com base em gênero, como a tendência de atribuir qualidades diferentes a homens e mulheres, como ser assertivo ou emocional ou, ainda, de assumir que certos trabalhos são mais adequados para uns e não para outras. Além disso, as mulheres são frequentemente avaliadas pela sua aparência física e submetidas a padrões mais rígidos de comportamento do que os homens.
Vieses inconscientes em ambientes corporativos
Nos ambientes corporativos, a atenção ao tema é necessária durante todo o ciclo de vida de carreira, desde a atração, seleção, contratação, desenvolvimento, trajetória profissional, processos sucessórios até os de saída, seja por aposentadoria ou outros fatores que levam ao desligamento.
Em processos seletivos ou sucessórios, algumas boas práticas, como garantir que ao menos uma candidata esteja entre as finalistas para posições de liderança, são recomendadas e podem ajudar a quebrar estereótipos e aumentar a contratação de mulheres. No entanto, o desafio de desenvolvimento e retenção ao longo da trilha de carreira parece ser ainda maior, visto que, atualmente, com frequência encontramos uma proporção maior de mulheres em universidades e cursos profissionalizantes, isto é, possivelmente uma maior quantidade de mulheres qualificadas em processos seletivos. Vale dizer que, em nossa sociedade, ainda existe uma visão que faz com que mulheres tenham maiores conflitos entre a vida pessoal (principalmente o trabalho do cuidado, seja doméstico, de crianças pequenas e de idosos) e as perspectivas de carreira – o que não ocorre com homens.
Avaliação de desempenho e carreira
Especialmente sobre o tema de avaliação de desempenho e carreira, práticas como adoção de avaliação 360º anônimas, que garantem a contribuição de profissionais em diferentes níveis de senioridade e gêneros, tendem a gerar avaliações menos subjetivas, bem como possibilitar ao avaliador uma visão integral acerca do desenvolvimento da profissional.
Outra recomendação para a quebra dos vieses inconscientes é a implementação de comitê decisório sobre avaliação e progressão de carreira, composto por profissionais de ambos os gêneros e, sempre que possível, com acesso aos resultados das avaliações 360º. Esse tipo de metodologia busca criar uma cultura com mais segurança psicológica aos profissionais da organização, demonstrando que a visão de um grupo diverso de pessoas é mais valiosa do que a de um avaliador único. Contudo, neste modelo, faz-se importante uma atenção redobrada à comunicação e à tomada de decisões consistentes, inclusive sobre gestão da consequência, que são imperativos para que o processo de avaliação de desempenho como um todo seja bem-sucedido.
Como combater vieses inconscientes
O combate aos vieses inconscientes faz-se necessário, pois as consequências de tomadas de decisões influenciadas por eles podem ser graves na medida em que podem limitar as oportunidades de indivíduos, com base em sua identidade de gênero, e reforçar desigualdades já existentes.
Para evitar os vieses inconscientes, é importante estar ciente de sua existência e adotar medidas individuais e organizacionais para minimizá-los. Isso pode incluir a busca por informações de diversas fontes, atualmente disponibilizadas em livros e artigos científicos, de fácil acesso e alta confiabilidade, bem como o questionamento de nossas próprias crenças e preconceitos, a avaliação objetiva de dados e fatos e, por fim, o desenvolvimento de habilidades de empatia e compaixão.
Empresas interessadas em combater vieses inconscientes em seus ambientes de trabalho devem adotar uma abordagem abrangente e multifacetada, com a implementação de políticas amplas de diversidade, equidade e inclusão. Como sugestão de possíveis iniciativas, a realização de treinamentos para conscientizar e eliminar tais vieses e, também, a promoção de discussões aprofundadas sobre desempenho, que considerem a existência de vieses frente ao menor número de mulheres na liderança, se comparadas aos homens.
O avanço desse assunto em nossa sociedade, que passou a estar presente na mídia que consumimos, nos meios sociais que transitamos e no ambiente corporativo, demonstra a sua extrema relevância para a justa igualdade de gênero entre homens e mulheres. Ela já existe na teoria. Vamos dar o próximo passo e contribuir para praticá-la em nosso dia a dia?
Esse conteúdo integra a série Mulheres e Negócios, de autoria do grupo de afinidade 4Women, que faz parte do programa de Diversidade, Equidade e Inclusão do Mattos Filho.
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- A diversidade como valor corporativo
- A voz feminina na era digital
- O impacto da maternidade na inserção plena das mulheres no mercado de trabalho
- Liderança feminina nos temas climáticos
*Por Mariana Venceslau Moreno.