STJ valida aproveitamento fiscal de ágio uma vez preenchidos exaurientes requisitos legais
Primeiro precedente de mérito de Tribunal Superior sobre a matéria deve impactar todos os casos que discutem o tema no país
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A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou, em 5 de setembro de 2023, por unanimidade e de forma favorável ao contribuinte, o Recurso Especial nº 2.026.473/SC, no qual se discutia, sob a legislação anterior à Lei nº 12.973/14, o aproveitamento fiscal de ágio em operações supostamente travadas entre partes relacionadas (“ágio interno”) e com a utilização de “empresa veículo”.
O recurso foi interposto pela União contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) também favorável ao contribuinte. A discussão deriva da cobrança de IRPJ e CSLL por amortização supostamente indevida de ágio decorrente da reorganização societária de grupo empresarial.
O entendimento do Tribunal foi pelo desprovimento do recurso fazendário para manter o reconhecimento quanto à possibilidade do aproveitamento fiscal do ágio em análise.
Sob a relatoria do Ministro Gurgel de Faria, a Primeira Turma do STJ concluiu que não haveria, na legislação vigente à época dos fatos, dispositivo que vedasse o aproveitamento fiscal de ágio gerado em operações entre partes relacionadas, o que, no entendimento do ministro, sequer se verificaria no caso concreto.
Também nesse sentido, o entendimento foi o de que não haveria vedação à utilização de empresa veículo. Ao contrário, a legislação autorizaria e incentivaria a criação de holdings com propósito específico. Sobre o propósito negocial, também não disciplinado em lei, nos termos do voto do ministro relator, tão somente o intuito de segregar as atividades empresariais já preencheria, em princípio, tal requisito, sem prejuízo de outras demonstrações nesse sentido.
Ainda, sobre a tese fiscal de que apenas o real adquirente – aquele que deteria originalmente os recursos financeiros para a aquisição societária – poderia aproveitar fiscalmente o ágio, foi consignado que a legislação de regência exigia tão somente a confusão patrimonial entre a pessoa jurídica que efetivamente adquiriu a participação societária e a sociedade adquirida para esse fim.
Enfim, de acordo com o voto do ministro relator, deveriam ser rechaçadas apenas aquelas operações nas quais tenha sido constatada e comprovada simulação ou atipicidade, o que não se verificaria no caso concreto, na medida em que sequer houve o agravamento das multas aplicadas ao patamar de 150%, postura que indicaria a existência de simulação, dolo ou fraude nas operações.
Em resumo, o entendimento do STJ foi no sentido da possibilidade do aproveitamento fiscal do ágio, uma vez preenchidos os exaurientes requisitos legais, quais sejam:
- A aquisição, pela pessoa jurídica, de participação societária adquirida com ágio;
- A absorção do patrimônio da investida em virtude de fusão, cisão e/ou incorporação;
- A fundamentação econômica do ágio fosse lastreada em expectativa de rentabilidade futura.
Nesse sentido, o voto do ministro relator foi densamente fundamentado, confirmando que não havia qualquer proibição na legislação tributária que impedisse o aproveitamento fiscal de “ágio interno”, tampouco a utilização de “empresa veículo”, supostamente sem “proposito negocial” por pessoa jurídica diferente daquela que dispôs inicialmente dos recursos para a aquisição societária. Ainda segundo a orientação expressa do STJ, foi a equivocada interpretação fiscal que criou essas restrições não previstas em lei.
A decisão configura sinalização inédita no âmbito dos Tribunais Superiores e, dado o seu teor, muito positiva aos contribuintes em um cenário jurisprudencial – a despeito de importantes vitórias dos contribuintes no âmbito dos Tribunais Regionais Federais – ainda indefinido no Judiciário. O julgamento do STJ faz ecoar argumentos há muito expendidos pelos contribuintes, essencialmente no sentido de que inexistia previsão legal que respaldasse os requisitos impostos pelo Fisco para viabilizar o aproveitamento fiscal do ágio.
Embora tal entendimento não seja vinculante, deve repercutir nos demais casos que versam sobre o aproveitamento fiscal de ágio, que igualmente enfrentam o restritivo entendimento fiscal sem amparo em lei. Ainda, aguarda-se a publicação do acórdão do julgamento.
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