Sanções Internacionais e o Setor Marítimo e Portuário
Sanções internacionais administradas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas e por países e blocos unilateralmente podem alcançar negócios no Brasil
No Brasil, a Lei nº 13.810/2019 (Lei de Sanções Internacionais) trata da aplicação e fiscalização das sanções impostas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) a países, entidades ou indivíduos, cujo objetivo primordial está relacionado à promoção da paz, proteção de direitos humanos e combate ao terrorismo.
Além do CSNU, alguns países e blocos econômicos adotam sanções internacionais e controles de exportações de forma unilateral, entre outros objetivos, com o propósito de dissuadir outros estados soberanos, organizações e pessoas de estreitar relacionamento ou negócios com o alvo de sanções.
As sanções podem ter modalidade e extensão distintas – pois variam de acordo com o alvo e o objetivo que se pretende atingir – podendo ser mais abrangentes, abarcando todo um território, um país ou um setor, ou direcionadas a pessoas, grupos empresariais e organizações específicas, inclusive aquelas desprovidas de personalidade jurídica como as organizações terroristas.
Sanções internacionais e impactos para o setor marítimo e portuário
As sanções do CNSU podem impor embargos de armas, congelamento de ativos, proibições de financiamento e comércio internacional, entre outros efeitos. Atualmente, há 14 regimes distintos de sanções internacionais vigentes no âmbito do CSNU e de seus comitês de sanções, com foco no suporte para resolução de conflitos políticos, não proliferação de armas destruição em massa e combate ao terrorismo. Entre os países e entidades sancionados, encontram-se, por exemplo, a Somália, o Estado Islâmico, a Al-Qaeda e o Iraque.
Passando à consideração das sanções unilaterais impostas por outros países, vale destacar que o Brasil não promulgou leis anti-sanções ou que limitem a eficácia de normas internacionais, conhecidas internacionalmente como blocking statutes.
No entanto, as legislações de sanções internacionais impostas por países soberanos e blocos econômicos, como pelos Estados Unidos e pela União Europeia, podem possuir um alcance extraterritorial capaz de causar impactos em empresas e pessoas brasileiras, com especial atenção ao setor marítimo e portuário.
A recente autorização emitida pela Marinha do Brasil para o atracamento de navios de guerra do Irã no porto do Rio de Janeiro representa um exemplo prático de um caso com potencial alcance de leis de sanções emitidas por países soberanos. Isso porque o Departamento de Tesouro dos Estados Unidos da América, por meio do seu Office of Foreign Assets Control (Ofac), mantém o Irã como um país sancionado, inclusive com instruções específicas para o setor marítimo e portuário. Nessa linha, o descumprimento das sanções pode gerar consequências civis e criminais para as pessoas e organizações sujeitas direta ou indiretamente às leis dos EUA.
O caso gerou grande repercussão, pois a embaixadora dos Estados Unidos no Brasil se manifestou contrariamente à permissão, justamente pela sensibilidade da relação diplomática dos Estados Unidos com o Irã e as sanções impostas. Apesar da posição contrária do governo dos EUA a tais eventos, a embaixadora reconheceu a soberania do Brasil para tomada de decisão. No entanto, representantes do Poder Legislativo norte-americano teceram duras críticas ao governo brasileiro e fizeram um alerta para as empresas e outros atores que colaborassem com os navios iranianos, sobre a violação das leis de sanções internacionais.
Em um caso como esse, parece importante redobrar a cautela e avaliar se as decisões tomadas pelas autoridades brasileiras levam em conta integralmente os potenciais riscos às empresas, empresários e outros colaboradores operando no setor marítimo e portuário. Em princípio, os atos da Administração Pública, como a permissão emitida pela Marinha do Brasil, podem não ser capazes de basear uma defesa e proteger efetivamente as pessoas físicas e jurídicas que firmem relações comerciais com países ou instrumentalidades que sejam alvos de sanções internacionais.
Leis internacionais e brasileiras
Sob o ponto de vista jurídico das leis brasileiras, as sanções do CSNU e as designações de seus comitês de sanção são imediatamente válidos e exequíveis para brasileiros e no território nacional.
Em relação às leis internacionais, devido à inexistência de leis anti-sanções que proíbam empresas e pessoas no Brasil de observar leis estrangeiras potencialmente aplicáveis, o caso dos navios iranianos ilustra riscos relacionados ao descumprimento de sanções internacionais para pessoas físicas e jurídicas internacionais operando em território brasileiro e de pessoas físicas e jurídicas brasileiras que tenham relacionamento comercial com empresas de países que estiverem sujeitos ao cumprimento das sanções.
Portanto, recomenda-se precaução às empresas do setor marítimo e portuário e que avaliem e monitorem suas relações comerciais com países ou pessoas com origem ou potencialmente afiliadas a países e territórios sancionados, a partir da sua exposição a leis nacionais e estrangeiras.
Para saber mais sobre o tema, conheça as práticas de Compliance e Ética Corporativa e Marítimo e Portuário do Mattos Filho.