Trusts no Brasil: Projeto de Lei propõe introduzir o regime de fidúcia na legislação doméstica
PL deve trazer inovação à jurisdição e proporcionar maior segurança jurídica na administração de bens de terceiros
O Projeto de Lei 4.758/2020 (PL), de autoria do Deputado Enrico Misasi (PV), propõe a introdução do contrato de fidúcia no ordenamento jurídico brasileiro por meio da criação de um regime geral de administração de bens de terceiros. Em trâmite na Câmara dos Deputados, a proposta busca trazer um instrumento análogo às estruturas de trust, muito comuns em jurisdições como Reino Unido e Estados Unidos da América.
Podendo ser utilizado para diversos tipos de bens, o mecanismo básico do trust pressupõe a transferência da propriedade de bens a um administrador. A relação é, de fato, “de confiança”, e possui como finalidade a gestão do patrimônio em benefício de terceiros, indicados pelo proprietário original dos bens, mediante a observação de determinadas condições.
Não existe no Brasil uma relação fiduciária correspondente ao trust. Em verdade, os trusts atualmente não são contemplados pela legislação brasileira, uma vez que não há previsão correspondente em lei. Desta forma, para que brasileiros constituam trusts, é inevitável que os façam no exterior.
A inovação dos trusts à legislação brasileira
Nesse contexto, o PL apresentado é promissor. Além de trazer inovação à jurisdição doméstica, possibilitando que mais brasileiros possam se utilizar da fidúcia enquanto instrumento de planejamento patrimonial e sucessório, também proporciona maior segurança jurídica a estrangeiros e nacionais que já estão familiarizados com trusts no exterior.
Um dos aspectos mais relevantes do projeto é a categórica separação entre os patrimônios do fiduciante (aquele que transfere bens ou direitos) e do fiduciário (aquele que os recebe e administra em favor de terceiro ou do próprio fiduciante). Trata-se de sólida proteção aos bens transferidos e aos interesses dos beneficiários, uma vez que, como consequência, a propriedade dos bens é distanciada do fiduciante ou beneficiário.
O PL prevê também regras genéricas para o contrato de fidúcia, como o fato de as partes poderem ser pessoas físicas ou jurídicas e a necessidade de a titularidade fiduciária ser levada a registro em cartório. É previsto, inclusive, que o patrimônio detido e administrado pelo fiduciário não será submetido aos efeitos de recuperação judicial ou falência, permanecendo vinculado à sua finalidade.
Possíveis tributações sobre regime de fidúcia
Apesar de o PL não trazer previsões relativas aos efeitos fiscais decorrentes da propriedade fiduciária, é importante se atentar ao fato que a transmissão de patrimônio e a percepção de renda são eventos sujeitos à tributação no Brasil. Desta forma, considerando a possível aprovação do projeto, deverá ser percebida também a necessidade de regulamentação da cobrança de impostos no que diz respeito às operações necessárias para a constituição e o funcionamento do novo instrumento.
De toda forma, é inegável que a proposta, caso aprovada, trará mais liberdade e possibilidades inéditas para o planejamento patrimonial no Brasil, principalmente para fins sucessórios. Resta aguardar, portanto, a tramitação do PL no Congresso Nacional. Caso aprovada na Câmara, a proposta segue para o Senado e, após, à sanção presidencial.
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