A imprescritibilidade do dano ambiental
STF irá julgar existência de prazo prescricional para pedido de ressarcimento por danos ao meio ambiente
O Recurso Extraordinário nº 654833, que discute a existência de prazo prescricional para a pretensão de ressarcimento por dano ambiental, foi incluído em pauta para julgamento em plenário virtual do Supremo Tribunal Federal na sexta-feira, 10 de abril de 2020.
A questão desenvolveu-se nos autos de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, buscando a reparação de pretensos danos materiais, morais e ambientais decorrentes de extração ilegal de madeira em território de comunidade indígena, entre os anos de 1981 e 1987.
Após o trâmite nas instâncias ordinárias, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu pela imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento de dano ambiental, por se tratar de violação de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos – REsp nº 1120117-AC, rel. Ministra Eliana Calmon (DJe 19.11.2009).
Em razão do entendimento desfavorável, houve interposição de Recurso Extraordinário visando a anulação do acórdão do STJ, sob o argumento de que o Tribunal teria reconhecido a imprescritibilidade de ofício, sem ter sido suscitada pelos recorrentes nas razões de seu Recurso Especial, nem adotada no acórdão de julgamento da apelação. Os autos foram, então, remetidos ao Supremo Tribunal Federal, que reconheceu repercussão geral da questão em 26 de julho de 2018.
A tese da prescritibilidade
Em favor da tese de prescritibilidade da pretensão de ressarcimento dos danos ambientais, argumentou-se que os fatos são anteriores à promulgação da Constituição Federal de 1988. Por isso, deveria ser desconsiderada a lógica da imprescritibilidade nela prevista, e ser observado o prazo prescricional quinquenal previsto na Lei 4.717/1965, que regula a ação popular, também possível para tratar de responsabilidade ambiental, entre outros temas. Sustentou-se, também, que as Constituições anteriores regulavam contexto histórico-normativo radicalmente diverso do que se inaugurou a partir da Constituição atual, de modo que imprescritibilidade não poderia ser entendida indistintamente como regra no ordenamento jurídico.
Caso assim não se entendesse, pleiteou-se subsidiariamente o reconhecimento de imprescritibilidade apenas da reparação do dano ao meio ambiente, por se tratar de direito fundamental indisponível, afastando-se a tese quanto às pretensões de reparação de natureza patrimonial e moral associados ao problema ambiental.
A tese da imprescritibilidade
Em contrapartida, a Procuradoria Geral da República (PGR), em parecer da então Procuradora-Geral Raquel Dodge, defendeu que o direito ambiental se submete a regime próprio, diferente dos direitos civil e administrativo, de forma que os pedidos de reparação por dano ambiental devem ser considerados imprescritíveis. Segundo a PGR, a Constituição Federal estabelece que o meio ambiente é bem de uso comum, que deve ser preservado para as presentes e futuras gerações – tratando-se, portanto, de direito difuso de titularidade coletiva.
O julgamento virtual
O início do julgamento virtual está pautado para o dia 10.4.2020 e durante sete dias os Ministros deverão inserir seus votos no sistema, sendo finalizado o julgamento após o transcurso desse período. As partes poderão encaminhar arquivo digital com vídeo da defesa oral até 48 horas antes do início da sessão.
A importância do julgamento e os efeitos da repercussão geral
Ao reconhecer a repercussão geral, o Ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, apontou que é essencial “estabelecer balizas precisas e seguras sobre a incidência do instituto da prescrição nos peculiares casos envolvendo direitos individuais ou coletivos lesados, direta ou indiretamente, em razão de danos ambientais”.
Devido ao efeito multiplicador assegurado pelo instituto, o entendimento a ser fixado pelo STF nesse caso repercutirá sobre todos os processos que discutem a mesma questão e poderá impactar na resolução de centenas de casos sobre a mesma matéria no país.
A Repercussão Geral, pensada como meio de objetivação dos recursos extraordinários que chegam ao STF, atua principalmente como um instrumento de uniformização da interpretação constitucional, permitindo que o entendimento exarado em via recursal extraordinária seja válido também para outros casos.
O resultado desse julgamento impactará processos e condutas já praticadas, mas, também, a formação continuada da cultura do cidadão, empresário, administrador público ou investidor brasileiro. Todos os processos decisórios com potencial impacto ambiental levarão em consideração que eventuais danos ambientais poderão ser reclamados perpetuamente, durante toda a cadeia sucessória empresarial, inclusive.
Para mais informações, conheça os sócios das práticas de Direito Ambiental e Contencioso e Arbitragem do Mattos Filho.