TRF-3 reforça jurisprudência de vedação de duplo registro em conselhos profissionais
Apelação formulada pelo CREA-SP contra sentença que declarou a inexistência de relação jurídica entre o conselho profissional e empresa do setor alimentício foi desprovida por unanimidade
Em acórdão publicado em 7 de fevereiro de 2023, a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) negou provimento, por unanimidade, à apelação cível interposta pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo (CREA-SP) contra sentença de primeira instância que declarou a inexistência de relação jurídica entre o conselho profissional e empresa do setor alimentício.
A sentença recorrida atendeu o pedido da empresa para reconhecer a inexigibilidade de inscrição junto ao CREA-SP e de contratação de responsável técnico, tornando, por conseguinte, inexigível também qualquer contribuição ao referido conselho profissional. O juízo de primeiro grau ordenou que o CREA-SP se abstivesse de realizar tais exigências, incluindo eventual cobrança de anuidade.
Fundamentação do acórdão
Em sede de apelação, o TRF-3 alegou a inexistência de prestação de serviços próprios da profissão de engenheiro, uma vez que a atividade principal da empresa seria a fabricação de sucos concentrados, atrelada à área química.
Além disso, foi destacada a vedação à duplicidade de registros em conselhos profissionais, a qual se caracterizaria no caso concreto pois a empresa já possuía inscrição perante o Conselho Regional de Química, assim como profissional a ele vinculado.
Como fundamento legal, o acórdão destaca o disposto na Lei nº 6.839/1980, segundo a qual o registro empresarial é obrigatório nas entidades competentes para a fiscalização do exercício da respectiva profissão, em função da atividade básica da empresa.
Precedentes
Apesar de recorrente, especialmente diante do órgão federal e de órgãos regionais competentes sobre a profissão de engenheiros (Sistema CONFEA/CREAs), a discussão acerca da vedação à duplicidade de registro em conselhos profissionais encontra-se consolidada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O STJ possui interpretação em linha com o disposto na Lei nº 6.839/1980, atribuindo a obrigatoriedade de inscrição ao conselho competente sobre a atividade básica ou atividade-fim da empresa interessada.
Considerando que as atividades empresariais contemporâneas podem se filiar a mais de uma área do conhecimento, o STJ também adota o conceito de atividade preponderante, exigindo inscrição no conselho competente para fiscalizar os serviços que sejam da essência da atividade da empresa. Desse modo, atividades meramente acessórias não ensejam inscrição no respectivo conselho profissional.
Em outro julgamento, o STJ assentou que, ainda que atividades internas da empresa exijam qualificação técnica de trabalhadores sujeitos a determinado conselho profissional, a pessoa jurídica em si não fica vinculada a tais órgãos. No caso concreto, uma empresa que demandava engenheiros em sua linha de montagem não estaria obrigada a se registrar junto ao conselho regional da profissão, uma vez que não se destinava à prestação de serviços próprios de engenheiros.
Igualmente aplica-se a tese para as obrigações decorrentes do registro profissional, tais como o pagamento de anuidade. Segundo o STJ, o pagamento de anuidade, enquanto consequência da inscrição em conselho profissional, é também determinado pela atividade básica da empresa.
Aplicação prática no Sistema CONFEA/CREAs
O entendimento do STJ é reconhecido em âmbito administrativo no Sistema CONFEA/CREAs. O Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA) já se pronunciou no sentido de que a vedação à exigência do duplo registro está consolidada em jurisprudência.
O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de Minas Gerais (CREA-MG), por sua vez, afirmou ser entendimento pacificado do STJ que a atividade básica da empresa é o critério utilizado para a obrigatoriedade de registro no conselho profissional e de sujeição à sua fiscalização. Todavia, em decisões esparsas, órgãos do Sistema CONFEA/CREAs relativizam o entendimento consolidado do STJ em função de circunstâncias específicas dos casos concretos.
Um exemplo é quando uma empresa autuada por ausência de registro empresarial no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA) promove a inscrição em outro conselho profissional após a data de constatação de infração pelo Sistema CONFEA/CREAs, hipótese em que a autuação é mantida.
Além disso, órgãos do Sistema CONFEA/CREAs podem interpretar que o objeto social da empresa contém tarefas sujeitas à sua competência e, nesse sentido, exigir o registro empresarial junto à instituição. Por exemplo, no caso de transporte de produtos perigosos, há entendimentos de que a determinação da classe dos produtos e os cuidados envolvidos dependeriam de conhecimentos técnicos da área de engenharia.
No mesmo sentido, há decisão do CREA-MG postulando que a autuada, empresa do ramo da indústria química, ainda que registrada perante o conselho profissional pertinente ao ramo da química, deveria estar registrada perante o CREA em função de suas atividades incidirem sobre procedimentos industriais, complexos por natureza, extrapolando o exercício da química puramente.
É possível também encontrar decisão que adota critério em sentido oposto ao decidido pelo STJ. O CONFEA já entendeu que, havendo atividades pertinentes à fiscalização do Sistema CONFEA/CREAs no objeto social ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) da empresa, ainda que como atividades secundárias, o registro seria necessário.
Considerações finais
Apesar de a decisão da Terceira Turma do TRF-3 estar em linha com o disposto em lei e o entendimento consolidado do STJ sobre o tema, a análise da implementação prática na esfera administrativa do Sistema CONFEA/CREAs demonstra que outros critérios costumam ser adotados no caso a caso para relativizar a regra reconhecida legal e jurisprudencialmente.
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