Cade publica Guia Análise de Atos de Concentração Não Horizontais
Documento sistematiza a prática decisória do Cade e traz maior segurança jurídica
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O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) publicou, no último dia 17 de abril, a versão final do Guia de Análise de Atos de Concentração Não Horizontais (Guia V+). Uma minuta do Guia V+ esteve sob consulta pública ao longo do ano passado e, como esperado, o conteúdo definitivo é similar ao da minuta preliminar.
Em que pese não ter caráter vinculante, o Guia V+ fornece uma base para entender os processos e critérios utilizados pelo Cade na avaliação das operações não horizontais, trazendo uma maior segurança jurídica para as partes. Vale relembrar que operações não horizontais são aquelas em que as partes atuam em níveis distintos da cadeia produtiva (integrações verticais), ou em que as partes têm atividades relacionadas (fusões conglomerais).
Segundo o Guia V+, o procedimento para a análise de concentrações não horizontais passa por cinco etapas (muito embora a análise de boa parte dos casos se encerre na terceira): definição do(s) mercado(s) relevante(s);determinação dos market shares e índices de concentração; análise do potencial lesivo à concorrência; análise dos benefícios líquidos decorrentes da operação; e remédios antitruste.
Com relação à análise do potencial lesivo de uma operação não horizontal, o Guia V+ manteve a metodologia delineada na minuta preliminar. Tal análise passa por verificar a capacidade das partes de exercer poder de mercado, a existência de incentivos econômicos para que a nova entidade resultante da operação engaje em estratégias de fechamento de mercado em desfavor de concorrentes, e a ocorrência de efeitos anticompetitivos.
Alterações relevantes trazidas na versão final do Guia V+
- No que diz respeito à capacidade de exercício de poder de mercado, um ponto importante foi o reconhecimento de que o poder de mercado de um agente que atua no mercado a jusante está mais relacionado ao seu poder de compra do insumo do que à sua participação nas vendas dos produtos no mercado a jusante. Tradicionalmente, o Cade considera as participações das partes nos mercados de venda de seus produtos (tanto a jusante, quanto a montante, por exemplo, no caso de fusões verticais), e presume-se que uma operação não horizontal não gera preocupações concorrenciais quando as suas respectivas participações de mercado estão abaixo de 30%. Houve, portanto, importante indicação pelo Cade de que a análise tradicional de market share no mercado a jusante pode não ser a melhor métrica de análise do potencial lesivo de uma operação não horizontal.
- Em termos de incentivos para exercer poder de mercado, o Guia V+ deixou claro que essa análise trata de incentivos econômicos. Destaca-se também que o Guia V+ expressamente reconheceu que as estruturas de incentivos econômicos para o fechamento do mercado (ou outras teorias de dano) variam conforme o percentual de participação acionária adquirida. Isso ocorre porque, em hipóteses de aquisições parciais, o alinhamento de incentivos não é unilateral e, portanto, deve ser considerado adequadamente.
- Sobre efeitos, o Guia V+ expandiu a discussão sobre as operações não horizontais permitirem acesso a informações sensíveis de concorrentes. Essa preocupação decorreria do fato de que uma empresa integrada poder ser fornecedora (através de sua atuação no elo a montante) de algum concorrente no elo a jusante e, por meio dessa relação de fornecimento, ter acesso a informações relevantes sobre esse concorrente.
Além disso, a versão final do Guia V+ também incluiu a discussão sobre poder de portfólio em fusões conglomerais. De acordo com o documento, o poder de portfólio poderia dificultar a entrada de novos concorrentes e prejudicar a rivalidade. Em mercados de economias de escopo, empresas com portfólios maiores teriam vantagens de custo de produção, ao mesmo tempo em que permitiriam a redução dos custos de transação para os clientes.
De outro lado, tais vantagens poderiam resultar em dificuldades de acesso aos clientes por parte das empresas menores. Por fim, segundo o Guia V+, um portfólio extenso também permitiria o oferecimento de subsídios cruzados e causaria impactos em estratégias de marketing, uma vez que a promoção da marca automaticamente leva à promoção de todos os seus produtos.
Segundo o Cade, um dos objetivos do Guia V+ é conceder maior transparência à análise feita pela autarquia, fornecendo diretrizes claras para a condução da análise de atos de concentração não horizontais e, com isso, pautando a tomada de decisões em negócios.
Para mais informações sobre o tema, conheça a prática de Direito concorrencial do Mattos Filho.