Reservas de previdência aberta e capitalização regulamentadas como garantia de crédito
CMN e CNSP divulgaram os procedimentos e informações que devem ser adotados e compartilhados entre as instituições para operacionalização da garantia em operações de crédito
Foi publicada no Diário Oficial da União, em 30 de setembro de 2024, a Resolução Conjunta n° 12/2024, aprovada pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Conselho Nacional de Seguros Privados, regulamentando a Lei nº 14.652/2023, e dispondo sobre o direito de resgate dos participantes de planos de previdência complementar aberta, dos segurados de seguros de pessoas em regime de capitalização e dos titulares de títulos de capitalização como garantia de operação de crédito.
Com 1,5 trilhão de reais em reservas, segundo dados de agosto da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida, e com cerca de 1 trilhão de reais disponíveis para utilização, a medida deve impactar o mercado através da redução de taxas de juros e aumento do acesso ao crédito.
A Resolução entrou em vigor na data de sua publicação, com exceção das regras sobre o sistema de troca de informações que deverá ser adotado pelas instituições financeiras e as seguradoras, entidades abertas de previdência complementar ou sociedades de capitalização, que entram em vigor após um ano de sua publicação.
De forma geral, o texto aprovado estabelece requisitos para as Operações que poderão utilizar esses recursos como garantia e define procedimentos, prazos e obrigações para a realização destas com eficiência e segurança para os clientes.
Elegibilidade
Poderão ser utilizados como garantia das Operações o direito de resgate dos seguintes tipos de produto:
- Planos de previdência complementar aberta estruturados na modalidade de contribuição variável – PGBL e similares;
- Planos de seguros de pessoas com cobertura por sobrevivência estruturados na modalidade de contribuição variável – VGBL e similares, excluídos os planos do tipo dotal;
- Títulos de capitalização estruturados na modalidade tradicional.
Direito de Resgate
O direito de resgate disponível para utilização é aquele composto somente por valores passíveis de serem resgatados, de acordo com as regras do plano, no momento da concessão da garantia. No caso das contribuições efetuadas pelos participantes, inclui também valores que não estejam imediatamente disponíveis em razão de regras de carência.
Desta forma, ficam excluídos os valores:
- Em planos coletivos, contribuídos por instituidor ou estipulante-instituidor, antes de cumprida a carência;
- Em planos coletivos, que não tenham cumprido as regras de vesting;
- Que estejam garantindo outras operações de crédito ou de assistências financeiras;
- Que estejam indisponíveis para resgate em razão de ordem judicial;
- De títulos de capitalização que não permitam resgate parcial e já tenham sido dados em garantia.
Concessão
Para a concessão da garantia, o cliente deverá formalizar a sua intenção de utilizar seu Direito de Resgate junto à Instituição Financeira na qual busca o crédito, que ficará responsável por obter o consentimento deste para o compartilhamento dos dados necessários à realização da Operação e por contatar as Reguladas SUSEP para obter informações sobre o Direito de Resgate, conforme definidas no art. 4º da norma.
Além da limitação da disponibilização apenas do Direito de Resgate, o valor estabelecido pela Instituição Financeira para a garantia do crédito deve “guardar racionalidade econômica com o risco que se pretenda mitigar da operação de crédito” e o prazo da Operação não pode ultrapassar o período de acumulação do plano. No caso dos títulos de capitalização, será possível a utilização de títulos com vigência inferior ao prazo de vencimento, caso o cliente concorde previamente com a reaplicação em outro(s) título(s) até o vencimento da Operação.
O exercício do Direto de Resgate como garantia deve ser devidamente formalizado em um instrumento contratual de garantia e qualquer alteração no contrato da Operação que impacte a garantia deverá ser previamente comunicada à Operadora, que deverá, se for o caso, informar à Instituição Financeira sobre novos valores elegíveis. Qualquer alteração na garantia deverá ser realizada por meio de aditamento do instrumento contratual da garantia.
Bloqueio do Valores
Com a formalização da garantia, a Operadora deverá bloquear o respectivo valor, que só poderá ser desbloqueado, total ou parcialmente, por solicitação da Instituição Financeira, que terá o dever de informar previamente ao cliente sobre:
- As restrições ao valor bloqueado (e., impossibilidade de resgate, portabilidade, alteração de fundo, ou concessão de renda enquanto não houver a sua liberação);
- Os custos e consequências do atraso no pagamento, incluindo a disponibilidade do Direito de Resgate em favor da Instituição Financeira;
- A impossibilidade de cancelamento do plano ou a antecipação do final do período de acumulação, até a liberação da garantia.
Havendo quitação do crédito, a Instituição Financeira deve, em até dois dias úteis, solicitar a liberação total da garantia junto à Operadora. Poderá ainda o devedor solicitar a liberação parcial da garantia nos casos em que houver redução do saldo devedor, situação na qual a Operadora terá cinco dias úteis para avaliar a solicitação e informar o cliente de seu resultado, devendo, em caso de liberação do saldo, fazê-lo em até dois dias úteis.
Sistema de Troca de Informações
Para operacionalizar o fluxo de informações e documentos necessários para a formalização das operações, as Instituições Financeiras e as Reguladas SUSEP deverão utilizar sistemas eletrônicos, que serão administrados por infraestrutura do mercado financeiro autorizada a exercer atividade de registro de ativos financeiros pelo Banco Central do Brasil, a qual não poderá cobrar das Reguladas SUSEP quaisquer tarifas relacionadas à realização deste serviço.
O sistema, dentre outros requisitos, deverá garantir transparência sobre as Reguladas SUSEP participantes, assegurar condições isonômicas a todas as Instituições Financeiras e dar acesso ao Banco Central do Brasil e à Superintendência de Seguros Privados às informações necessárias para suas atribuições legais.
As regras aplicáveis ao sistema de troca de informações entrarão em vigor somente em setembro de 2025, porém até que ele esteja plenamente funcional, as Reguladas SUSEP devem, em até noventa dias contados da data de publicação da norma, apresentar em seus sites a forma pela qual será operacionalizada a concessão em garantia dos direitos de resgate, que deve ser padronizada, sem distinção de procedimentos entre diferentes Instituições Financeiras.
Liquidação da Garantia
A Instituição Financeira pode solicitar a liquidação da garantia conforme as regras do contrato da Operação e/ou do contrato de garantia, após um período mínimo de inadimplemento de noventa dias (período este que poderá ser menor, caso a solicitação de liquidação da garantia parta do cliente). A liquidação deverá ser feita pela Operadora, que resgatará o valor em nome do cliente e efetuará o pagamento diretamente à Instituição Financeira, descontando eventuais impostos e carregamento postecipado.
Por último, considerando o atual cenário jurisprudencial e os projetos de alteração legislativa em discussão que tratam de temas envolvendo aspectos fiscais associados aos produtos de previdência, vale destacar a importância de, previamente à concessão, como garantia de Operações, do Direito de Resgate dos planos de previdência e de seguro de pessoas, ponderar potenciais impactos fiscais e sucessórios dessas movimentações, especialmente para avaliar se tal medida poderia impactar em eventuais discussões envolvendo a descaracterização da natureza securitária dos referidos planos para fins fiscais (e dos correspondentes aspectos tributários e sucessórios aplicáveis).
A aguardada Resolução Conjunta nº 12/2024 vem em boa hora e representa um avanço significativo na regulamentação do uso de direitos de resgate como garantia de crédito, oferecendo novas oportunidades para clientes, Reguladas SUSEP e Instituições Financeiras, com grande potencial para atrair novos negócios em ambos os setores.
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