Lei que cria a Sociedade Anônima do Futebol é sancionada
Conheça as principais regras criadas para a SAF e os vetos em análise no Congresso Nacional
Assuntos
A Lei n° 14.193, sancionada, com vetos, em 06 de agosto de 2021, criou a Sociedade Anônima do Futebol (SAF) e dispõe sobre as regras de constituição, governança, financiamento, obrigações e iniciativas sociais para clubes de futebol no Brasil.
O novo diploma legal é fruto de um intenso debate sobre o desenvolvimento de um mercado que movimenta, anualmente, valores relevantes no país. As regras aplicáveis à SAF buscam criar um ambiente cada vez mais profissionalizado e atrativo para novos investimentos.
Constituição da sociedade anônima do futebol
Uma SAF pode ser constituída de três maneiras:
- Através da transformação do clube original em SAF;
- Pela cisão do clube original, com transferência do patrimônio relacionado ao futebol para uma SAF;
- Por iniciativa de pessoa natural, jurídica ou de fundo de investimento.
Nas duas primeiras hipóteses, a SAF surge a partir de um clube já existente, sendo, portanto, uma alternativa para instituições já existentes. Em tais casos, a SAF assumirá o direito do clube de participar de campeonatos, nas mesmas condições em que o clube se encontrava, bem como nos direitos, deveres e contratos vinculados à atividade do futebol profissional, em especial, os de propriedade intelectual.
A criação de uma SAF sem relação com nenhum clube de futebol é, por sua vez, a alternativa para participar deste mercado sem vinculação a instituições já existentes.
Estrutura e divulgação de informações
Em linha com boas práticas de governança corporativa, a SAF deverá cumprir diversas regras relacionadas à sua estrutura, administração e divulgação de informações aos investidores e ao público em geral.
Em relação à estrutura, a SAF deverá emitir, obrigatoriamente, ações ordinárias de classe A para subscrição exclusiva pelo clube ou pessoa jurídica original que a constituiu. Tais ações conferirão determinados direitos especiais ao clube ou pessoa jurídica em questão, como a necessidade de aprovação destes em relação a temas relevantes, tais como a alteração da denominação e signos identificativos da SAF, bem como a mudança de sua sede para outro município.
A depender da quantidade de ações detidas, os clubes e pessoas jurídicas originais poderão ter direito semelhante em relação a matérias adicionais relacionadas à SAF, tais como:
- Diversas formas de alienação ou transferência de qualquer bem imobiliário ou de direito de propriedade intelectual que tiver sido conferido para a formação do capital social;
- Reorganizações societárias;
- Dissolução;
- Liquidação;
- Extinção;
- Participação em ligas regionais ou nacionais.
A forma de integralização das ações da SAF a serem detidas pelo clube ou pela pessoa jurídica original poderá ser feita, sem limitação, por meio da transferência de seus ativos, como nome, marca, dísticos, símbolos, propriedades, patrimônio e ativos imobilizados e mobilizados.
A pessoa jurídica que detiver participação igual ou superior a 5% no capital social da SAF, deverá, ainda, prestar informações sobre a pessoa natural que seja beneficiária final ou controladora de forma direta ou indireta.
A SAF deverá manter, ainda, um site para divulgação de informações societárias e financeiras, que deverá ser atualizado mensalmente, respondendo pessoalmente os administradores no caso de descumprimento.
Passivos
A Lei nº 14.193/2021 inovou ao prever que a SAF não responderá pelas obrigações do clube ou pessoa jurídica original que a constituiu, exceto quanto às atividades específicas do seu objeto social. Assim, o clube ou a pessoa jurídica original permanecerão responsáveis pelas obrigações anteriores à constituição da SAF.
A nova lei também dispõe que não haverá constrição do patrimônio ou receitas da SAF enquanto estiver cumprindo suas obrigações, assegurando maior previsibilidade sobre as receitas disponíveis à entidade.
Por fim, a nova lei prevê três regimes diferentes para quitação das obrigações de uma SAF:
- Concurso de credores, por meio de Regime Centralizado de Execuções;
- Recuperação judicial;
- Recuperação extrajudicial.
Captação de recursos
Outro tema importante foi a criação das “debêntures-fut”, título de dívida cujo uso é restrito à SAF e que poderão ser emitidas para financiamento de suas atividades. As principais características de tais títulos são:
- Remuneração, que deverá ser superior à poupança;
- Pagamento periódico de rendimentos;
- Prazo mínimo de 2 anos;
- Vedação à recompra pela SAF ou parte relacionada;
- Registro em sistema autorizado pelo Banco Central do Brasil e pela Comissão de Valores Mobiliários.
Os recursos captados por meio das debêntures-fut deverão ser, obrigatoriamente, alocados no desenvolvimento de atividades ou no pagamento de gastos, despesas ou dívidas relacionadas à SAF e às suas atividades.
O texto final do projeto de lei enviado para sanção presidencial previa, ainda, a possibilidade expressa de que a SAF poderia emitir quaisquer títulos ou valores mobiliários admitidos pela Comissão de Valores Mobiliários. Esse dispositivo foi vetado, sob justificativa de que diversos títulos e valores mobiliários existentes não poderiam, na prática, ser emitidos pela SAF (uma vez que são restritos a determinados tipos de sociedade ou a certas atividades). No entanto, o veto a tal dispositivo não significa, necessariamente, que a SAF esteja impedida de emitir valores mobiliários cujo uso seja permitido por qualquer tipo de sociedade por ações (por exemplo, ações emitidas no âmbito de uma oferta pública).
Medidas sociais e fiscalização
A Sociedade Anônima do Futebol deverá manter determinadas iniciativas sociais, a serem realizadas em conjunto com o futebol, no âmbito do denominado Programa de Desenvolvimento Educacional e Social (PDE). O PDE consiste no fomento e promoção, em convênio com instituições públicas de ensino, do desenvolvimento da educação por meio do futebol e o desenvolvimento do futebol por meio da educação.
Para efetivação de seus objetivos, os investimentos no âmbito do PDE poderão ser direcionados a diversas iniciativas, tais como a reforma ou construção de escola pública e manutenção de quadra ou campo de futebol, a alimentação de alunos e a aquisição de equipamentos, materiais e acessórios necessários à prática do futebol.
Importante notar que, no âmbito do PDE, a SAF deverá oferecer oportunidades para alunas matriculadas em escolas públicas, demonstrando atenção com o direito de meninas terem acesso ao esporte e com a promoção do futebol feminino.
Regras tributárias
Com o veto aos artigos que regulavam o Regime de Tributação Específica do Futebol (TEF), restou, na Lei nº 14.193/2021, a previsão de que o clube ou pessoa jurídica original com passivos tributários anteriores à constituição da SAF, desde que não incluídos em programas de refinanciamento do governo federal, poderão apresentar proposta de transação, nos termos da legislação aplicável.
Pontos em reanálise após veto
No contexto da análise presidencial, foram vetados alguns pontos relevantes do Projeto de Lei nº 5.516/2019.
Em relação às disposições sobre o financiamento da SAF, foram vetadas as regras que tratavam de benefícios fiscais que seriam concedidos no investimento em debêntures-fut, da possibilidade de emissão de quaisquer títulos e valores mobiliários pela SAF e da autorização para a captação de recursos incentivados em todas as esferas de Governo.
Foi vetada, ainda, a totalidade das regras referentes à criação do Regime de Tributação Específica do Futebol (TEF), que, embora transitório, traria uma simplificação do regime tributário e a redução das alíquotas aplicáveis à SAF. Esse era apontado como um dos principais estímulos para a transição dos clubes de futebol para o novo regime.
Os vetos presidenciais estão, atualmente, em apreciação pelo Congresso Nacional.
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