

Hidrogênio é incluído no Plano Decenal de Expansão de Energia 2031
Objetivo do documento é auxiliar decisões relacionadas à política energética do país
Assuntos
O Ministério de Minas e Energia (MME) publicou a Consulta Pública nº 119/2022 com a finalidade de coletar contribuições para o aprimoramento do Plano Decenal de Expansão de Energia 2031 (PDE 2031). O PDE 2031 é elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) com o apoio das Secretarias de Planejamento e Desenvolvimento Energético e de Petróleo e do MME. Os interessados poderão enviar suas contribuições ao PDE 2031 até o dia 23 de fevereiro de 2022, por meio do site do MME.
O objetivo do PDE 2031 é um documento informativo, contendo as perspectivas de expansão futura do setor de energia sob a ótica do governo no horizonte de dez anos, ou seja, no período de 2022 a 2031. Nesse sentido, os estudos presentes no plano podem ser utilizados para embasar as decisões relacionadas à política energética do país e fornecem para o mercado informações relevantes sobre o desenvolvimento do sistema elétrico.
A minuta inicial do PDE 2031 incluiu, pela primeira vez, um capítulo específico sobre o hidrogênio e seu potencial papel na matriz energética brasileira, o que representa um importante marco para o setor.
Conheça, a seguir, os principais pontos e ações abordados no PDE 2031 sobre o potencial papel do hidrogênio na matriz energética brasileira.
Uso do hidrogênio para o setor elétrico
- É esperado que o Brasil se destaque como potencial supridor internacional de hidrogênio verde, uma vez que há um evidente avanço na demanda mundial por energia limpa;
- É possível que haja concorrência pelos recursos renováveis para produção de eletricidade entre a indústria de processamento do hidrogênio verde e o Sistema Interligado Nacional (SIN). Como consequência, a demanda impulsionará ainda mais a expansão das fontes eólica e fotovoltaica;
- A viabilidade da indústria do hidrogênio verde está associada à escala de produção e ao custo de transporte (seja na forma pura, seja na forma de amônia ou outros derivados), do Brasil até os mercados consumidores, com destaque, principalmente, para a Europa;
- Uma possível função para o hidrogênio na geração centralizada seria a de armazenamento de energia para maior aproveitamento das fontes renováveis não controláveis. Desta forma, em momentos de excesso de produção renovável, seria possível destinar parte da eletricidade para a produção do hidrogênio, que poderia então ser armazenado e utilizado na geração elétrica em momentos de escassez, contribuindo para maior flexibilidade do sistema elétrico;
- Atualmente, estima-se que o custo do hidrogênio verde (produzido a partir de eletrólise da água, com uso de fontes renováveis) estaria entre 3,0 e 8,0 US$/kg no mercado internacional (IEA, 2021), enquanto no Brasil, o custo estaria entre 2,2 e 5,2 US$/kg se considerada a energia de usinas eólicas ou fotovoltaicas (DKTI, 2021);
- Espera-se que o mercado de hidrogênio tenha reflexos significativos no mercado de energia elétrica, seja por impulsionar novos projetos de geração renovável, seja como vetor energético para armazenamento e geração.
Produção de hidrogênio a partir de gás natural como estratégia para o Brasil
Além da produção de H2 verde para exportação e atendimento de uma demanda global de baixo carbono, a EPE traz a produção de hidrogênio a partir do gás natural como uma possível estratégia para o Brasil, contendo análises sobre o H2 cinza, azul e turquesa.
- A produção de H2 a partir da reforma a vapor de gás natural, sem captura e armazenamento de CO2, constitui a rota tecnológica mais empregada atualmente para produção de H2 (cerca de 70%), sendo seu produto chamado de “hidrogênio cinza”. Essa modalidade de produção de hidrogênio é caracterizada pela eficiência energética e sofrerá influência da variação do preço do gás natural;
- O principal desafio em relação ao hidrogênio cinza está associado às emissões de CO2 que ocorrem durante o processo, já que é pouco provável que a obtenção de hidrogênio por esta rota ainda tenha espaço relevante no longo prazo, em um futuro de baixo carbono;
- As estimativas de custos de produção do hidrogênio cinza ficaram entre 9 e 25 US$/MMBtu (de US$ 1,02 a 3,36/kg H2). Caso seja considerado o custo de 6 US$/MMBtu para o gás natural, o custo de produção de H2 seria entre 12 e 16 US$/MMBtu (de US$ 1,37 a 2,15/kg H2);
- O “hidrogênio azul” – obtido a partir da queima de combustíveis fósseis quando em seguida há a captura e o armazenamento de carbono emitido no processo (CCUS) – tem maior compatibilidade com a obtenção de hidrogênio de baixo carbono. Destaca-se que esta tecnologia, embora ainda não esteja amplamente difundida, já apresenta projetos em atividade mundialmente;
- Nos estudos com participação da EPE, para o cenário brasileiro, foi levantada a possibilidade de aproveitamento de plataformas offshore para a instalação de plantas de produção de hidrogênio, a fim de facilitar o acesso ao gás natural do pré-sal e armazenar o CO2 em rochas naquele ambiente;
- Com relação ao “hidrogênio turquesa” – produzido por pirólise do metano com produção de carbono sólido e, consequentemente, sem emissão de CO2 no processo – sua produção envolve uma tecnologia ainda em evolução. Entretanto, estudos teóricos já mostram que pode se tornar viável econômica e ambientalmente, a depender do valor agregado do carbono e da capacidade do mercado de absorver este produto;
- O custo de produção de hidrogênio turquesa foi calculado utilizando-se como premissas o preço do gás natural igual a 6 US$/MMBtu e o preço de venda do negro de fumo igual a 0,20 US$/kg, obtendo-se o custo de produção de hidrogênio igual a 19,3 US$/MMBtu (de US$ 2,20 a 2,60/kg, dependendo do poder calorífico utilizado), verificando-se que a produção e venda de negro de fumo reduzem o custo líquido de hidrogênio por esta rota;
- As rotas de produção do hidrogênio azul e turquesa têm potencial para gerar uma fonte limpa de energia a partir do gás natural. Essas rotas abrem oportunidades para a cadeia do gás desempenhar papel essencial na energia e na indústria de baixo carbono, expandindo a função de combustível do gás natural.
Hidrogênio natural, branco ou geológico
Além das rotas tecnológicas acima, há também grandes expectativas acerca da competitividade do hidrogênio natural ou geológico (estima-se que seja mais barato do que os de rotas de combustíveis fósseis e de eletrólise), sobretudo quando disponível em mistura com o gás hélio.
- As campanhas exploratórias preliminares realizadas em vários estados da federação mostraram potenciais significativos em hidrogênio. Pesquisas apontam que o Brasil pode dispor de potencial de hidrogênio natural ou geológico relevante em pelo menos quatro Estados: Ceará, Roraima, Tocantins e Minas Gerais;
- Diversas áreas estudadas mostraram a presença de hidrogênio no solo e poços profundos da Bacia do São Francisco, que constataram altas concentrações de hidrogênio em reservatórios profundos, atestando assim a existência de sistemas ativos de hidrogênio nessas regiões;
- Apesar desses estudos iniciais, o potencial deste recurso no Brasil ainda é desconhecido. Em estudo referenciado pela EPE, estimou-se uma emissão de 140 t/dia (51,1 kt/ano) de hidrogênio, em três áreas identificadas na Bacia do São Francisco, cenário considerado otimista.
Dinâmica da cadeia do hidrogênio e mercado atual
- A cadeia de H2 no Brasil já se encontra estabelecida. O estudo da GIZ (2021) mapeou os principais atores atuantes na futura na cadeia produtiva de hidrogênio no Brasil, tendo identificado 203 atores entre empresas produtoras, consumidoras, fornecedoras de tecnologia, prestadores de serviços, representações setoriais, universidades e centros de P&D;
- Entretanto, aponta-se que a oferta de hidrogênio nesse mercado existente é quase exclusivamente baseada em fontes fósseis (cerca de 95%) e a demanda é quase toda para fins industriais (uso como matéria-prima), em especial para indústrias de fertilizantes (50%), refino (37%), químico (8%) e metalurgia/alimentos (4%);
- Em termos de custo de produção de H2 no Brasil, o refino de petróleo é o principal meio de produção. Em 2020 foram produzidas 325 mil toneladas de hidrogênio puro em refinarias nacionais, sendo a maioria deste volume utilizada para consumo interno das refinarias nos processos de hidrotratamento. Assim, a maior parte do hidrogênio produzido é precificada com base em transferências internas de preços ou contratos bilaterais;
- Segundo estimativa apresentada no PDE, os preços dos diferentes tipos de hidrogênio apresentam uma considerável diferença entre os custos de produção por meio da utilização de gás natural, frente o H2 verde a partir de fontes renováveis, conforme disposto abaixo:
Mercado potencial
- O Brasil pode se tornar um grande exportador de hidrogênio no futuro, sendo um país muito competitivo em fontes renováveis, com recursos hídricos significativos, infraestrutura robusta, com um setor energético de porte e moderno, e capital humano nacional para desenvolver um mercado de hidrogênio importante, bem como exportar para o mercado global;
- Segundo indicado pela EPE, a estimativa de produção anual de hidrogênio a partir do saldo dos recursos energéticos disponíveis para a produção de hidrogênio no horizonte de 2050 é da ordem de 1.850 Mt/ano, com os recursos renováveis offshore se destacando com um enorme potencial técnico de produção de hidrogênio;
- Existem diferentes rotas tecnológicas e insumos para a produção de hidrogênio, proporcionando oportunidades para as indústrias de óleo e gás, renováveis, biocombustíveis, nuclear, elétrica e outras energéticas. Além disso, o H2 de custo competitivo pode ser utilizado em diferentes atividades econômicas, como transporte, geração e armazenamento de energia, fertilizantes, siderúrgicas, refino e biorefino, além de existir um mercado global em desenvolvimento e com demanda, em especial para hidrogênio verde, azul e turquesa;
- O hidrogênio renovável e livre de carbono terá três papéis fundamentais na transição energética: descarbonizar os segmentos de difícil abatimento de emissões, como o setor de transportes pesados de longo-curso (caminhões, trens e embarcações), setor aéreo e indústria (fertilizantes, siderurgia e cimento, por exemplo); facilitar o armazenamento de energia das fontes renováveis variáveis como a eólica e a solar; e permitir o acoplamento entre os mercados elétrico, transporte e industrial;
- Especificamente no setor elétrico, espera-se que a competividade do hidrogênio nacional tenha impacto tanto na demanda de energia elétrica – a ser utilizada na produção de hidrogênio verde – quanto na expansão da geração, com foco em renováveis, com consequente impacto também na transmissão, estando a competitividade do hidrogênio verde nacional diretamente ligada ao preço da eletricidade, que pode representar cerca de 70% do custo de produção do hidrogênio no caso da eletrólise;
- Assim, ainda que o H2 verde tenha papel importante no desenvolvimento do mercado doméstico e global, outros tipos de hidrogênio de baixo carbono também terão papel importante, sendo necessário utilizar as diferentes rotas tecnológicas de produção para desenvolvimento do mercado;
- Os principais projetos de hidrogênio de baixo carbono anunciados no Brasil em 2021 são:
- Ainda existem desafios para o desenvolvimento do mercado, entre eles, o principal é o custo de produção do hidrogênio, em especial o hidrogênio verde e de baixo carbono. Para aproveitar as oportunidades será preciso:
- Investir em P&DI, de modo a reduzir custos, como os custos relacionados à produção do hidrogênio verde, por exemplo, que ainda não são competitivos quando comparados com os custos do hidrogênio produzido de origem fóssil;
- Aperfeiçoar estruturas institucionais, legais e regulatórias para dar estabilidade, previsibilidade e confiança a investidores;
- Reduzir a assimetria de informações sobre disponibilidade e custos de recursos energéticos, como por exemplo o Pacto Energético do Hidrogênio, apresentado pelo Brasil;
- Melhorar as condições para atração de investimentos em hidrogênio de baixo carbono, identificando potencial de mercado e questões relacionadas a demanda.
Para mais informações, conheça a prática de Infraestrutura e Energia do Mattos Filho.