Dia de Doar: a importância das doações agora e para o futuro
Ação visa mobilizar sociedade no combate à pandemia e fortalecer a cultura de doar, a fim de perpetuar engajamento
Assuntos
Nesta terça-feira, dia 5 de maio, comemora-se o Dia de Doar Agora, um novo dia global para mobilizar doações, ações de solidariedade e celebrar o engajamento da sociedade no apoio ao enfrentamento da crise provocada pela Covid-19. O movimento é inspirado no Dia de Doar, já agendado para 01 de dezembro deste ano.
A contribuição sem precedentes dos mais diversos atores no combate à pandemia de Covid-19 e seus reflexos socioeconômicos ao redor do mundo, reforça o papel essencial das doações no desenvolvimento de atividades de interesse público, ensejando também a reflexão sobre como perpetuar esse engajamento.
As doações e a Covid-19 no Brasil
No Brasil, quase R$ 4 bilhões já foram doados para combate aos efeitos da pandemia de Covid-19, conforme monitor da Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR). Essas doações, realizadas mediante transferência de EPIs, cestas básicas, itens de higiene e outros – ou destinadas à sua aquisição – demonstram como a contribuição individual pode potencializar a solidariedade nesse momento emergencial e, também, apoiar a atuação dos órgãos públicos e as atividades desenvolvidas pelas Organizações da Sociedade Civil (OSCs) no Brasil.
As OSCs desempenham papel fundamental na implementação de políticas públicas e no atendimento às necessidades primordiais da população, especialmente da parcela mais vulnerável, atuando fortemente na linha de frente em saúde, educação, assistência social, cultura, esporte, meio ambiente, entre outros. Nesse momento de calamidade, evidencia-se ainda mais a relevância da expertise social e capilaridade das OSCs para o oferecimento de apoio eficiente e veloz à população.
A Covid-19 e os impactos à sustentabilidade financeira das OSCs
Apesar da evidente capacidade das OSCs em propor e executar soluções sociais, a sustentabilidade financeira do setor encontra-se ameaçada a médio e longo prazos pela pandemia de Covid-19. Este cenário se deve a diversos fatores, desde a necessidade de interrupção de atividades desenvolvidas no âmbito das comunidades ao redirecionamento das doações destinadas ao setor para o enfrentamento aos efeitos da pandemia. Cabe destacar que, atualmente, as principais fontes de recursos das OSCs são doações, projetos desenvolvidos mediante incentivos fiscais e parcerias com o poder público nos termos da Lei nº 13.019/2014.
Neste momento, as OSCs estão sendo desafiadas a refletir em como garantir recursos para o desenvolvimento das suas atividades a médio e longo prazos. Segundo levantamento feito em abril, dois terços das OSCs brasileiras entrevistadas sofreram uma queda de mais de 50% em suas arrecadações desde o início da pandemia, enfrentando, para os próximos meses, um cenário preocupante de escassez de recursos.
Nesse sentido, o Dia de Doar Agora oferece às organizações uma excelente oportunidade de arrecadação de recursos. Porém, a data também nos oportuniza, como membros da sociedade, a reflexão sobre a importância do fortalecimento da cultura de doações em nosso país, para que hoje – e, também, amanhã – as OSCs possam continuar atuando em prol da sociedade e do interesse público.
Mais do que incentivar o espírito da filantropia e da solidariedade, o Dia de Doar Agora permite-nos tecer reflexões sobre a importância do papel individual no cenário das doações, trazendo à tona a necessidade não só da construção de uma cultura de doar, mas também de uma fidelização de doadores e organização de campanhas de arrecadação permanentes. É importante compreender que a filantropia estratégica também compreende os pequenos valores, permitindo a participação e o engajamento de cidadãos das mais diversas camadas sociais, bem como de pessoas jurídicas de diversos portes.
Desafios jurídicos à construção de uma cultura de doação
O Dia de Doar Agora deve, também, estimular a reflexão sobre os desafios ao fortalecimento da cultura da doação no Brasil, inclusive sob perspectiva jurídica.
O regime tributário sobre doações destinadas às OSCs ainda difere muito das práticas internacionais, com restritas hipóteses de imunidade e isenção, conforme demonstra pesquisa realizada em 2019. Ademais, há pouco conhecimento sobre os incentivos fiscais disponíveis e como se dá o seu funcionamento, especialmente quanto aos procedimentos relacionados a projetos incentivados.
Ainda, a sustentabilidade financeira das OSCs depende do fluxo regular de recursos para os seus caixas. Com intuito de manter a perenidade de suas atividades, muitas entidades buscam formas criativas de captar, manter e multiplicar seus recursos.
Uma estratégia possível é a constituição de fundos patrimoniais ou endowments, onde são aportados recursos com intenção de perenidade, devidamente aplicados em investimentos financeiros e resgatados os seus rendimentos de forma regular e sem prejuízo ao valor principal. Embora a estratégia seja há anos adotada no Brasil, a ausência de um marco regulatório sobre o tema e a necessidade de uma arrecadação inicial de grande vulto afastam esta solução das discussões de estratégia financeira das OSCs de médio e pequeno porte.
Ainda nova no panorama jurídico brasileiro, a Lei nº 13.800/2019 trouxe inovações quanto aos fundos patrimoniais. A estrutura de governança mais robusta proposta pela lei pode trazer segurança para os doadores e instituições apoiadas, além de incentivar a transparência e profissionalismo para a gestão dos recursos doados. No entanto, em virtude das incertezas quanto às questões tributárias e à inexistência de um incentivo fiscal relevante para essa modalidade de fundo, este ainda é um modelo em construção.
O Dia de Doar Agora é, portanto, um momento para celebrar o poder individual de contribuir com ações de solidariedade e fortalecer uma cultura de doação em nosso país. Mas, mais do que doar hoje, a data nos traz uma reflexão essencial para o amanhã: a importância de fortalecer a sociedade civil organizada e garantir sua sustentabilidade financeira a longo prazo, para que continue desempenhando papel fundamental em nossa sociedade.