Covid-19: medidas trabalhistas para atenuar a crise
Além dos dispositivos previstos na MP 927, empresas podem optar por negociação coletiva para garantir segurança jurídica
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Na tentativa de conter a crise provocada pela pandemia do coronavírus, empresas de todo Brasil têm buscado alternativas para lidar com o cenário de calamidade pública. O governo, por um lado, propõe uma série de medidas com objetivo de atenuar os efeitos do Covid-19 na economia. Por outro lado, empresários estão recorrendo aos sindicatos para viabilizar negociações coletivas. Essa medida, segundo nossos sócios da área Trabalhista, tem sido a mais eficaz quando se trata de segurança jurídica.
“A negociação coletiva é, neste momento, muito importante para que a empresa tenha algum tipo de segurança jurídica. Sendo adotada pelas empresas, a negociação vai robustecer qualquer tese jurídica que possa ser apresentada no futuro. Essa robustez é necessária para defender as medidas que as empresas querem tomar durante o período de pandemia”, explica o sócio Cleber Venditti.
Além de estabelecer as condições para o trabalho durante o enfrentamento ao coronavírus, como redução de jornada de trabalho, a negociação coletiva é fundamental para firmar acordos sobre a remuneração variável, por exemplo. “É o momento de olhar para essas questões e pensar nas possibilidades, como o fato de as empresas não serem obrigadas a pagar PLR no momento em que estão mais sendo afetadas pela crise”, destacou Cleber Venditti.
O sócio Sólon Cunha, também da área Trabalhista, completa: “Cada situação tem que ser analisada individualmente. No segundo semestre, imaginamos que teremos um cenário um pouco melhor, e uma possibilidade pode ser a criação de um plano de participação de resultados para esse período ou que vá até o ano que vem, com estabelecimento de metas”.
MP 927: do teletrabalho à antecipação de feriados
A MP 927, de 22 de março de 2020, prevê uma série de medidas trabalhistas relevante para o enfrentamento do estado de calamidade pública. Veja as principais ações:
Teletrabalho
- O empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância e determinar o retorno ao regime de trabalho presencial, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho. A notificação ao empregado para o teletrabalho deve ser, no mínimo, de 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico;
- A responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho e ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de 30 dias, contado da data da mudança do regime de trabalho;
- Caso o empregado não tenha equipamentos tecnológicos e a infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho, o empregador pode fornecer o equipamento por regime de comodato e pagar os serviços de infraestrutura, que não caracteriza verba de natureza salarial. Ou na impossibilidade do oferecimento do regime de comodato, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador.
Antecipação de férias individuais
- O empregador informará ao empregado sobre a antecipação de suas férias com antecedência de, no mínimo, 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do período a ser gozado pelo empregado;
- As férias não poderão ser gozadas em períodos inferiores a cinco dias corridos; e poderão ser concedidas por ato do empregador, ainda que o período aquisitivo a elas relativo não tenha transcorrido;
- Adicionalmente, empregado e empregador poderão negociar a antecipação de períodos futuros de férias, mediante acordo individual escrito;
- Os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do coronavírus (covid-19) serão priorizados para o gozo de férias, individuais ou coletivas;
- Durante o estado de calamidade pública, o empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas dos profissionais da área de saúde ou daqueles que desempenhem funções essenciais, mediante comunicação formal da decisão ao trabalhador, por escrito ou por meio eletrônico, preferencialmente com antecedência de 48 horas;
- Para as férias concedidas durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º, o empregador poderá optar por efetuar o pagamento do adicional de um terço de férias após sua concessão, até a data em que é devida a gratificação natalina prevista no art. 1º da Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965;
- O pagamento da remuneração das férias concedidas em razão do estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º poderá ser efetuado até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias, não aplicável o disposto no art. 145 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943;
- Na hipótese de dispensa do empregado, o empregador pagará, juntamente com o pagamento dos haveres rescisórios, os valores ainda não adimplidos relativos às férias.
Concessão de férias coletivas
- O empregador poderá, a seu critério, conceder férias coletivas e deverá notificar o conjunto de empregados afetados com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, não aplicáveis o limite máximo de períodos anuais e o limite mínimo de dias corridos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943.
- Ficam dispensadas a comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação aos sindicatos representativos da categoria profissional, de que trata o art. 139 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943.
Feriados
- Os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais e deverão notificar, por escrito ou por meio eletrônico, o conjunto de empregados beneficiados com antecedência de, no mínimo, 48 horas, mediante indicação expressa dos feriados aproveitados;
- Os feriados poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas;
- O aproveitamento de feriados religiosos dependerá de concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito.
Banco de Horas
- Ficam autorizadas a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em favor do empregador ou do empregado, estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual formal, para a compensação no prazo de até 18 meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.
- A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, que não poderá exceder dez horas diárias.
- A compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador independentemente de convenção coletiva ou acordo individual ou coletivo.
FGTS
- Fica suspensa a exigibilidade do recolhimento do FGTS pelos empregadores, referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente;
- Os empregadores poderão fazer uso da prerrogativa independentemente do número de empregados, do regime de tributação, da natureza jurídica, do ramo de atividade econômica e da adesão prévia.
Isolamento e quarentena: entenda as diferenças
No âmbito trabalhista, a Lei 13.979/2020 estipula que a quarentena e o isolamento podem ser determinados, de forma mandatória, pelo empregador em duas situações: caso o empregado manifeste sintomas da doença ou seja diagnosticado com coronavírus, mesmo sem apresentar sintomas (isolamento) ou na hipótese de suspeita da doença, mesmo sem confirmação (quarentena).
Nos dois casos, as empresas podem pedir aos empregados que fiquem afastados do trabalho pelo período mínimo de 14 dias. Se o funcionário se recusar a cumprir as determinações e continuar expondo outras pessoas ao risco de contágio, ele pode sofrer sanções administrativas aplicadas pela companhia, como advertências, suspenções e, em casos mais graves, até rescisão contratual por justa causa.
No período de isolamento ou quarentena, a nova lei determina ainda que a ausência deverá ser considerada falta justificada ao trabalho e que a empresa não poderá descontar o dia do empregado, nem considerar as horas não trabalhadas para debater do banco de horas. “O racional é mais ou menos o mesmo de uma pessoa que precisa ir ao médico e apresenta um atestado médico. É uma ausência justificada, que não pode ser descontada”, explica Cleber Venditti.
Durante os 15 primeiros dias de afastamento, o salário deve ser pago integralmente pelo empregador. A partir do 16º dia, a empresa pode encaminhar o funcionário ao INSS, que vai receber o benefício auxílio-doença, caso precise se ausentar por mais de 15 dias. Isso vale para isolamento e quarentena, caso o empregado não esteja apto a prestar serviços.
Clique aqui para ouvir o Podcast com os sócios Cleber Venditti e Sólon Cunha sobre o tema.
*As informações acima disponibilizadas refletem o cenário da data de realização deste podcast.