Congresso aprova regras para incorporação de tecnologias em saúde
Alterações impactam medicamentos e produtos para saúde, com potenciais efeitos nos sistemas de saúde pública e suplementar
Assuntos
Foi publicada no Diário Oficial da União, no dia 22 de março de 2022, a Lei nº 14.313/2022, que altera a Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/1990), para prever novas regras de incorporação de tecnologias ao Sistema Único de Saúde (SUS), bem como a utilização de medicamentos e produtos para saúde cuja indicação de uso seja distinta daquela aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A nova lei entrou em vigor na data de sua publicação.
Para contexto, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologia (Conitec) é o órgão de assessoramento do Ministério da Saúde responsável pela realização de avaliações econômico-financeiras e técnicas para incorporação, exclusão ou alteração de tecnologias em saúde no SUS, bem como para elaboração ou alteração de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas de doenças.
São dois os principais tópicos endereçados na Lei nº 14.313/2022. Primeiro, no que tange ao processo de incorporação pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, a nova lei estabelece que as metodologias empregadas na realização de avaliações econômicas por parte da Conitec deverão ser dispostas em regulamento expresso e amplamente divulgadas, inclusive com relação aos indicadores; e parâmetros de custo-efetividade considerados pela comissão em suas análises e o processo será distribuído de forma aleatória, respeitadas a especialização e a competência técnica requeridas para a análise da matéria, além da publicização dos atos processuais.
Originário do Projeto de Lei do Senado nº 415/2015, esse dispositivo busca promover maior transparência, previsibilidade e segurança jurídica ao processo de incorporação de novas tecnologias no âmbito do SUS, pleito esse comum e antigo dos agentes fornecedores dos produtos e tecnologias.
Segundo, a nova lei autoriza expressamente a dispensação, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de produtos, no âmbito do SUS, cuja indicação de uso seja distinta daquela aprovada no registro na Anvisa, desde que seu uso tenha sido recomendado pela Conitec, demonstradas as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança, e esteja padronizado em protocolo estabelecido pelo Ministério da Saúde.
Nesse ponto, observa-se uma inovação relevante inserida no processo de incorporação de tecnologias no SUS, na medida em que a Conitec assumiria maior protagonismo na recomendação de uso off-label de produtos. Isso porque o Decreto nº 8.077/2013 (Art. 21) já previa a possibilidade de uso off-label de produtos no âmbito do SUS, porém, mediante autorização prévia da Anvisa, órgão competente por avaliar a eficácia e segurança de medicamentos e produtos para saúde.
Limitação da competência da Anvisa
O novo dispositivo, portanto, afasta a ingerência da Anvisa em relação ao tema, o que de alguma forma conflitaria com o disposto no Decreto nº 8.077/2013. Potenciais efeitos dessa mudança ainda são incertos e desconhecidos já que é possível imaginar, até pelo posicionamento expressado pelas entidades representativas do setor farmacêutico especialmente (conteúdos na integra aqui) e da própria Anvisa, alguns desdobramentos e ações nas esferas administrativa e judicial contestando as alterações aprovadas pelo Congresso Nacional e sancionadas pelo presidente de República.
Em nota divulgada à imprensa, a Anvisa alertou que o uso off-label de medicamentos e produtos para saúde pode aumentar a frequência de eventos adversos não conhecidos e que a aplicação da novo normativo necessitará de ações robustas do Poder Público para mitigar os riscos aos pacientes. Além disso, a agência advertiu que desdobramentos legais referentes aos critérios de registro, responsabilização por danos e compensação para pacientes deverão ser avaliadas com cautela e que medidas regulamentares já estão sendo estudadas para garantir o monitoramento da referida atuação da Conitec, visando a proteção da saúde pública.
Vale ressaltar, ainda, que a Lei nº 14.313/2022 pode gerar efeitos também na esfera da saúde suplementar, tendo em vista que a Lei nº 14.307/2022, que alterou a Lei de Planos de Saúde (Lei nº 9.656/1998), prevê de que tecnologias avaliadas e recomendadas positivamente pela Conitec, cuja decisão de incorporação ao SUS já tenha sido publicada em Diário Oficial, deverão ser incluídas no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar (Rol/ANS) no prazo de até 60 dias.
Para saber mais sobre incorporação de tecnologias em saúde, conheça a prática de Life Sciences e Saúde do Mattos Filho.
*Com a colaboração de Ana Julia de Barros Villas Boas, Henryk Trelinski Alvarenga e Thais Cristina de Jesus.