Comissão de Educação aprova marco legal de instituições comunitárias de ensino
Projeto segue para apreciação pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania
Assuntos
A Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) do Senado aprovou, em fevereiro de 2022, o Projeto de Lei nº 5.884/2019, de iniciativa da Senadora Daniella Ribeiro (PP/PB), que regulamenta o art. 213 da Constituição Federal (CF), tratando das Instituições Comunitárias de Educação Básica (Iceb). A matéria, agora, aguarda designação de relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Se aprovado, o PL representará uma importante oportunidade para entidades sem fins lucrativos atuantes na educação básica que contam com representantes da comunidade na sua mantenedora, por permitir o repasse de recursos públicos àquelas que atendam aos requisitos legais para qualificação como Iceb.
O que são as Icebs?
Mencionadas pelo art. 213 da CF como possíveis destinatárias de recursos públicos, as escolas comunitárias são pessoas jurídicas de direito privado, sem finalidade lucrativa, que atuam na educação básica e aplicam seus eventuais resultados financeiros em suas atividades, além de garantir a destinação de patrimônio a outra escola comunitária ou ao Poder Público, em caso de dissolução.
Tanto o art. 213 da CF como o art. 19, inciso III da Lei nº 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB) mencionam que as instituições comunitárias seriam disciplinadas por lei. De um lado, existe a Lei nº 12.881/2013, que regulamenta as Instituições Comunitárias de Ensino Superior (ICES), mas é omisso sobre aquelas de nível básico. Logo, o PL busca justamente preencher essa lacuna ao estabelecer o marco legal das Iceb, a exemplo do que já existe para as ICES.
O art. 1º do PL define as Iceb como organizações da sociedade civil (OSCs), que deverão atender, cumulativamente, a uma série de requisitos elencados nos seus incisos:
- Formação coletiva por grupos de pessoas físicas ou jurídicas, com representação da comunidade local na entidade mantenedora;
- Constituição na forma de associação ou fundação;
- Patrimônio próprio (de entidade da sociedade civil) e/ou pertencente ao Poder Público;
- Cumprimento do art. 14 do Código Tributário Nacional (CTN), ou seja, em linhas gerais: ausência de distribuição de seu patrimônio, aplicação integral dos seus recursos em seu objeto social e no território nacional e manutenção de escrituração contábil;
- Observância ao dever de transparência;
- Destinação de seu patrimônio a uma instituição pública ou congênere, no caso de extinção.
As Icebs também terão o dever de prestar serviços educacionais à população gratuitamente, de forma complementar à rede estatal e proporcionalmente ao financiamento público recebido. Ademais, deverão realizar ações comunitárias para o desenvolvimento dos alunos e da sociedade, focando na extensão.
Qualificação como Iceb e suas prerrogativas
O art. 3º elenca as exigências estatutárias para obter a qualificação de Iceb, visando a assegurar boas práticas de governança, tais como adoção de práticas de gestão administrativa que evitem desvios de finalidade, existência de conselho fiscal ou equivalente, assim como previsão, em seus documentos constitutivos, de normas para a prestação de contas e publicidade de informações financeiras.
Ao cumprir todos os requisitos legais, as OSCs receberão a qualificação de Iceb, desde que formulem requerimento ao órgão competente nos termos de regulamento que será editado oportunamente. Para tanto, será preciso apresentar os documentos do art. 4º, a saber: estatuto social registrado, balanço patrimonial, declaração de regular funcionamento, relatório de responsabilidade social e inscrição no CNPJ.
Uma vez obtida a referida qualificação, as Icebs passam a contar com as prerrogativas previstas no art. 2º, como o acesso a editais de órgãos governamentais direcionados às instituições públicas, o recebimento de recursos orçamentários de origem pública e a celebração de instrumentos de parceria para prestação de serviços públicos junto ao poder público ou de forma supletiva, como detalhado adiante.
Termo de parceria
O capítulo II do PL prevê a possibilidade de celebração do termo de parceria entre as instituições comunitárias e o poder público, visando à cooperação entre as partes na prestação de serviços educacionais, sendo precedida de uma consulta aos conselhos de políticas públicas da área educacional.
O art. 6º, parágrafo 2º, estabelece as cláusulas obrigatórias do termo de parceria, dentre elas o seu objeto, metas a serem cumpridas, cronograma da execução das propostas, critérios e indicadores de avaliação do desempenho, previsão de receitas e despesas e obrigações da Iceb. Na prática, como não poderia deixar de ser, ele se assemelha muito aos instrumentos previstos na lei 13.019/2014, que organiza o “regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as OSC”.
Vale destacar que a Iceb estará submetida à apresentação de relatório comparativo das metas e prestação de contas ao poder público ao fim de cada exercício. Nesse contexto, a execução do termo de parceria será objeto de fiscalização pelo Conselho da Iceb, pelo órgão público responsável, bem como pelo conselho de política pública educacional correspondente, entidade essa que não foi tratada no PL e possivelmente será criada por regulamento. O PL também determina que a comissão de avaliação, a ser composta de comum acordo pelo órgão público parceiro e Iceb, avaliará os resultados alcançados e encaminhará relatório à autoridade competente.
Oportunidades para entidades comunitárias do ensino básico
A regulamentação da matéria proporcionará novas oportunidades às entidades comunitárias do ensino básico. Ao terem sua atuação reconhecida por meio da qualificação específica, as organizações estarão aptas a receber recursos públicos, com o diferencial de terem acesso aos editais de órgãos governamentais de fomento direcionados às instituições públicas. Assim, poderão auxiliar o Estado no atingimento de metas ligadas à educação básica, suprindo suas deficiências no oferecimento de ensino básico de qualidade.
Ao aprovar o PL, a CE reforçou o papel que as Icebs podem ter para atuar de maneira supletiva na oferta de vagas de creche, por exemplo, já que a falta de vagas no nível de escolaridade infantil tem se revelado um dos maiores gargalos no âmbito dos munícipios. Além disso, o relator destacou a vantagem de ampliação das linhas de cooperação dessas entidades com o setor público, em benefício de toda a sociedade.
Agora, a matéria segue para apreciação da CCJ, que designará um relator e analisará o tema durante as próximas semanas. Considerando o caráter terminativo da decisão que será tomada pela CCJ, se aprovado novamente, o texto será encaminhado à Câmara dos Deputados para deliberação pelo plenário da casa.
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*Com a colaboração de Grazielly Rocha de Arruda e Luísa Gomes Gonçalves.