Afinal, que mudanças trouxe o novo decreto sobre cavidades?
O Decreto Federal nº 10.935/2022 já teve parte de seus dispositivos suspensos pelo STF
Em janeiro, foi publicado o Decreto Federal No. 10.935/22, que altera os critérios para intervenção em cavidades subterrâneas, revogando a norma que fixava esses parâmetros (Decreto nº 99.556/90).
A exploração de atividades ou empreendimentos em cavidades subterrâneas é realizada a partir da análise do “grau de relevância”, isto é, dos atributos ambientais (ecológicos, geológicos, cênicos e outros) avaliados sob enfoque regional e local (Art. 1º), que conferem à formação rochosa a classificação máxima, alta, média ou baixa ante às demais. Além das cavidades, poderá ser utilizado seu entorno, denominado “áreas de interesse”.
O decreto traz significativas mudanças quanto ao uso das cavidades subterrâneas e áreas de interesse. Quanto às cavidades, autoriza a intervenção com “impactos negativos irreversíveis” em cavidades identificadas com grau de relevância máxima, modalidade de intervenção vedada anteriormente, desde que observadas as seguintes condições (Art. 4º):
- Que os impactos decorrem de atividade ou de empreendimento de utilidade pública, nos termos do disposto no Art. 3º da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (Art. 4º, I);
- A inexistência de alternativa técnica e locacional viável ao empreendimento ou à atividade proposta (Art. 4º, II);
- A viabilidade do cumprimento da medida compensatória de que trata o § 1º (Art. 4º, III);
- Que os impactos negativos irreversíveis não gerarão a extinção de espécie que conste na cavidade impactada (Art. 4º, IV).
Ademais, o decreto dispensa a análise do grau de relevância para instalar empreendimento ou atividade localizados na área de influência da cavidade (Art. 6º).
Cumpre destacar que, também, foi alterada a sistemática para fixação dos critérios técnicos relativos à metodologia de classificação do grau de relevância das cavidades naturais, que contará com a participação do Ministério de Minas e Energia, além dos órgãos ambientais competentes – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), bem como para fixação das regras de compensação espeleológica, sendo prevista a possibilidade de “outras formas de compensação”, que serão analisadas a título extraordinário, pois não previstas no Decreto (Art. 8º).
Controvérsia acerca do decreto
A Rede Sustentabilidade ajuizou no STF uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 935), em 17 de janeiro de 2022, requerendo a imediata suspensão dos efeitos do decreto (em sede de medida liminar), com a retomada dos efeitos da norma anterior (Decreto 99.556/1990) e, no mérito, que seja reconhecida a incompatibilidade do decreto com preceitos fundamentais da Constituição Federal, com a consequente retomada da produção de efeitos da norma revogada, bem como a declaração de inconstitucionalidade do decreto.
Em seguida, o ministro do STF Ricardo Lewandowski e relator da ADPF 935 determinou a suspensão parcial do decreto que flexibilizou a proteção das cavernas brasileiras, em 24 de janeiro. Assim, ficam suspensos os efeitos dos artigos 4º e 6º, citados acima, até que o plenário do STF julgue definitivamente o caso.
Com a liminar parcialmente concedida em decisão monocrática por Lewandowski, volta a valer o artigo 3º do Decreto nº 99.556/1990, com a redação dada pelo Decreto nº 6.640/2008, que estabelece que uma “cavidade natural subterrânea com grau de relevância máximo e sua área de influência não podem ser objeto de impactos negativos irreversíveis, sendo que sua utilização deve fazer-se somente dentro de condições que assegurem sua integridade física e a manutenção do seu equilíbrio ecológico”.
O decreto já havia sido questionado por meio de uma Ação Popular em trâmite na 13º Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal , em 14 de janeiro de 2022, na qual também foi requerida a suspensão imediata dos efeitos do decreto (em sede liminar) e a declaração de nulidade por violação ao Art. 225, §1º, III da Constituição Federal, que trata da proteção ao meio ambiente, ofensa aos princípios constitucionais da legalidade (reserva de lei) e da vedação ao retrocesso ambiental (proibição de diminuição e regressão da tutela ao meio ambiente). Ainda não foi proferida decisão, tendo o juízo determinado a intimação do Ministério Público Federal e da União Federal, para que se manifestem acerca do pedido de tutela de urgência formulado.
Em sede legislativa, parlamentares já se manifestaram no sentido de que intencionam apresentar propostas contrárias ao teor do decreto.
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