Marco regulatório de softwares médicos entra em vigor
Nova norma define sistema de uso tanto médico quanto odontológica ou laboratorial, destinado à prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação ou anticoncepção de doenças
Assuntos
A RDC Anvisa nº 657/2022, em vigor a partir de 01 de julho de 2022, estabelece requisitos específicos para a regularização de softwares como dispositivos médicos (Software as a Medical Device – SaMD). O marco regulatório é resultado da Consulta Pública nº 1.035/2021, encerrada em junho de 2021, que contou com mais de 440 contribuições, sendo 22 delas aceitas e 68 parcialmente aceitas.
Antes da nova resolução, os SaMDs já eram regulados pela agência na categoria de produto para a saúde, estando sujeitos à concessão de uma notificação ou registro antes da sua comercialização com base na RDC Anvisa nº 185/2001.
Anvisa e a regulação antes da Resolução nº 657/2022
A iniciativa é resultado de uma Análise de Impacto Regulatório (AIR) do tema, disponível na íntegra no site da Anvisa, na qual a Agência declarou que as regulações vigentes possuem requisitos inviáveis de serem cumpridos pelos desenvolvedores de softwares, o que dificulta sua aplicação, considerando que foram pensados para bens tangíveis. Igualmente, outras informações relevantes para o monitoramento sanitário desses produtos, como arquitetura de software e cybersegurança e formas de atualização, não possuíam previsão de obrigatoriedade.
A criação de um ato normativo específico às necessidades dos softwares médicos também é consistente com a prática de autoridades sanitárias internacionais e o Fórum Internacional de Dispositivos Médicos (International Medical Device Regulators Forum – IMDRF), do qual o Brasil é signatário juntamente com a União Europeia, além de países como Estados Unidos, Canadá e Austrália, cujos regramentos foram analisados pelo corpo técnico da Anvisa no processo de elaboração da nova norma.
Requisitos gerais da nova resolução
A nova norma define SaMD como o sistema de uso ou aplicação médica, odontológica ou laboratorial, destinado à prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação ou anticoncepção e que não utiliza meio farmacológico, imunológico ou metabólico para realizar sua principal função em seres humanos – considerando a definição de dispositivo médico trazida pela RDC Anvisa nº 185/2001. O SaMD poderá ser de diagnóstico in vitro (IVD) ou não, ou ainda assinatura e hospedado centralmente (Software as a Service), desde que destinado a uma ou mais das indicações acima sem fazer parte de hardware de dispositivo médico.
Ficam excluídos da definição de SaMD, softwares que sejam:
- Embarcados em dispositivo médico já regulado pela Anvisa;
- Utilizados exclusivamente para gerenciamento administrativo e financeiro em serviço de saúde;
- Relacionados em lista de produtos não regulados, conforme disponibilizado pela Anvisa;
- Utilizados para bem-estar – ou seja, aqueles destinados a encorajar e manter o bem-estar dos indivíduos, incluindo atividades saudáveis como exercícios físicos, ou encorajar e manter o controle da saúde e um estilo de vida saudável que não seja destinado à prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação ou anticoncepção;
- Que processam dados médicos demográficos e epidemiológicos, sem qualquer finalidade clínica diagnóstica ou terapêutica.
O SaMD desenvolvido exclusivamente para uso interno (in house) de um serviço de saúde, por meio de sua matriz ou filiais, e que atenda às classes de risco I e II não será passível de regularização na Anvisa, desde que estes não interfiram no funcionamento de dispositivos médicos passíveis de regularização. No entanto, essas aplicações in house deverão ser validadas documentalmente até julho de 2024 e não poderão ser doadas ou comercializadas.
Requisitos e instruções de uso e rotulagem dos SaMD
De acordo com a RDC aprovada, as instruções de uso e rotulagem devem observar, além das disposições previstas na RDC Anvisa nº 185/2001 e na RDC Anvisa nº 431/2020, a inclusão das seguintes informações:
- Especificações de interoperabilidade, indicação de compatibilidades e incompatibilidades de software, hardware e ambiente tecnológico;
- Procedimentos para atualização do SaMD;
- Alertas e advertências;
- Requisitos mínimos de hardware e software;
- Informações de cibersegurança;
- Princípio de funcionamento, incluindo descrições genéricas dos algoritmos, rotinas e fórmulas utilizadas para gerar o processamento clínico (prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação ou anticoncepção) e suas associações clínicas válidas.
Caso a distribuição do software seja feita de forma virtual, a empresa está dispensada da apresentação física do rótulo e das instruções de uso. Ainda, os menus dos SaMD devem utilizar preferencialmente a língua portuguesa, podendo estar em inglês ou espanhol desde que:
- Seja descrita nas instruções de uso a necessidade do nível de fluência no idioma como um dos pré-requisitos para os operadores;
- Essa abordagem seja considerada risco aceitável no gerenciamento de risco da empresa;
- Seja explicado nas instruções de uso, em língua portuguesa, o significado de cada item do menu e comandos;
- Não seja destinado ao uso por leigos ou em ambiente doméstico.
Alterações pós-regularização dos SaMD
Os requisitos da RDC Anvisa nº 340/2020 devem ser observados em caso de alterações de informações de um SaMD. Além disso, a nova norma traz a necessidade de peticionamento de alteração pós-regularização, quando houver as seguintes modificações:
- Alteração significativa das funcionalidades clínicas, de segurança e eficácia clínicas ou de desempenho associadas às finalidades previstas anteriormente;
- Criação de novas funcionalidades ou indicações de uso clínicas;
- Descaracterização da identidade visual, de forma que não
seja mais reconhecível o softwareperante as imagens encaminhadas para a Anvisa.
Modificações simples não estão sujeitas ao peticionamento perante a Anvisa, entre elas, correções de erros, revisões na programação, mudanças que não alterem a identidade visual ou apenas modificações de segurança da informação que não afetem as indicações de uso, a eficácia do SaMD ou outro aspecto de segurança do paciente.
Processos de regularização de SaMD concedidos anteriormente à vigência da RDC Anvisa nº 657/2022 devem ser adequados ou complementados nos atos de suas futuras alterações.
Para mais informações sobre softwares médicos, conheça a prática de Life Sciences e Saúde do Mattos Filho.