Embora a lei preveja que, havendo testamento, o processo de inventário e partilha de bens deverá ser feito judicialmente, a Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, desde 2016, e também os respectivos Tribunais do Rio de Janeiro e do Paraná, passaram a permitir o inventário pela via extrajudicial (por escritura pública perante os Tabelionatos de Notas) mesmo havendo testamento, desde que o testamento deixado pelo falecido tenha sido validado judicialmente e que todos os interessados sejam maiores, capazes e concordes com a partilha dos bens.
Na linha dessa crescente tendência, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 8655/2017, cujo objeto é justamente a alteração da lei para que se passe a permitir o inventário extrajudicial quando houver testamento registrado judicialmente e caso todos os beneficiários sejam capazes e concordes.
No entanto, se, por um lado, esse procedimento tem sido de grande relevância para desafogar e desburocratizar o Judiciário, bem como é, em regra, mais célere e menos custoso do que um processo judicial, por outro, eventual demora no processo de validação do testamento passou a acarretar na incidência de multa no recolhimento Imposto de Transmissão Causa Mortis – ITCMD, devido pelos herdeiros em razão da transmissão dos bens.
Explica-se: em regra, o procedimento de inventário deve ser iniciado no prazo de 60 dias (ou 2 meses) a contar da data do falecimento. No estado de São Paulo, se o inventário for aberto após esse prazo e antes de 180 dias, haverá a incidência da multa de 10% sobre o valor do imposto e, se for requerido após o prazo de 180 dias, a multa será de 20%. Na esfera judicial, não é comum haver grandes dificuldades para se cumprir esse prazo, já que uma simples petição já vale como a abertura do inventário, e as informações relevantes podem ser trazidas pelos herdeiros no decorrer do processo. No âmbito extrajudicial, contudo, não existe uma peça de abertura, já que a escritura pública de inventario é um documento único, que deve englobar a totalidade das informações necessárias para a transmissão dos bens (qualificação completa dos herdeiros, relação de bens inventariados com todos os documentos, partilha final etc.).
O problema, então, foi que, ao final de 2014, o sistema eletrônico da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo passou a dar o mesmo tratamento para o inventário judicial e extrajudicial, entendendo que a lavratura da escritura pública se equipararia à abertura do inventario, aplicando automaticamente a multa em razão de suposto atraso na formalização do ato. Ou seja, mesmo que os herdeiros estivessem agindo para a conclusão do inventário – seja para a obtenção da validação do testamento pela via judicial, seja na obtenção da documentação relativa aos bens a serem inventariados – se a escritura pública de inventário e partilha não fosse lavrada no prazo previsto em lei de 60 dias da morte, tais herdeiros seriam surpreendidos com a incidência da multa de 10% sobre o valor do imposto.
Diante desse polêmico posicionamento e em razão da inexistência de previsão legal expressa para tal imposição, foram propostas diversas demandas judiciais contra a Fazenda Estadual, a fim de evitar a cobrança de referida multa, e viabilizar a efetiva finalização dos inventários pela via extrajudicial.
Apesar de todo o transtorno ocorrido, o inventário extrajudicial, presente em nossa legislação desde 2007, de fato tem se mostrado mais eficiente e financeiramente vantajoso às partes do que o processo judicial.
Assim, mesmo diante da existência de testamento deixado pelo falecido, é interessante que os herdeiros – desde que maiores e concordes – busquem orientação jurídica para adotar as medidas de flexibilização do prazo para a lavratura da escritura pública de inventário e partilha, evitando a cobrança abusiva de multa no recolhimento do ITCMD e garantindo, consequentemente, um procedimento mais eficiente e menos oneroso.