

Mattos Filho alerta entidades filantrópicas contra o fim da imunidade fiscal
Com o objetivo de aumentar as receitas do governo, Proposta de Emenda Constitucional buscava retomar as contribuições previdenciárias das entidades que atuam na área de educação
A Constituição de 1988 estabeleceu em seu artigo 195 o regime de imunidade a impostos para entidades sem fins lucrativos que realizassem atividades nas áreas de assistência social e educação. A imunidade (chamada pelo texto constitucional de isenção) tinha como objetivo reconhecer a importância das atividades sociais desenvolvidas por essas entidades, com o objetivo de construir uma sociedade democrática, livre, justa e solidária.
Recentemente, diante de um quadro de grave crise fiscal que paralisa o orçamento do Governo Federal, o Congresso Nacional aprovou a reforma da Previdência. O texto final aprovado, porém, sofreu uma série de ajustes pelos deputados e senadores durante as votações, e a economia esperada com as mudanças nas regras de aposentadoria foi reduzida.
Uma saída encontrada pelos parlamentares para encontrar novas fontes de receita foi criar a Proposta de Emenda Constitucional 133/2019, apelidada de “PEC Paralela”, de autoria do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), com pontos que não entraram no texto-base da reforma. Entre as medidas, estava a previsão de acabar com a imunidade às contribuições para a seguridade social para as entidades filantrópicas.
O retorno das cobranças das contribuições previdenciárias das entidades filantrópicas, porém, não é uma novidade. Em 2017, durante a discussão da proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo anterior, o relator deputado Arthur Maia (Cidadania – BA) trouxe para o debate previsão semelhante. À época, entretanto, todo o setor de filantropia no país se mobilizou, através do Fórum Nacional das Instituições Filantrópicas, e essa proposta foi retirada.
Dessa vez, a redação da PEC Paralela proposta pelo senador Tasso Jereissati restringiu o fim dessa imunidade especificamente às entidades filantrópicas que atuam na área da educação. As práticas de Relações governamentais e de Organizações da sociedade civil, Negócios sociais e Direitos humanos do nosso escritório alertaram as instituições desse setor, que não haviam percebido ou entendido os impactos dessa nova PEC em suas atividades.
Brasília e São Paulo: trabalho conjunto de alerta aos clientes
O trabalho do nosso escritório foi conduzido em duas frentes. Em Brasília, a advogada Mariana Guimarães Borborema, da prática de Relações governamentais, monitorou o tema de dentro do Congresso para preparar dossiês sobre a situação da PEC Paralela e mapear os principais stakeholders aos clientes.
Em São Paulo, a sócia Flavia Oliveira e os advogados da prática de Organizações da sociedade civil, Negócios sociais e Direito humanos realizaram um trabalho para despertar a consciência das entidades educacionais e tentar formar uma coalizão para se posicionar contrariamente à medida.
“Fizemos um mapeamento de tudo o que tinha sido discutido em termos de filantropia no Congresso, mapeamos quem tinha sido contra ou a favor, até para identificar quais parlamentares seriam nossos possíveis aliados, para convencer seus pares de que essa medida não podia passar”, afirma Mariana.
Junto aos clientes, a maior dificuldade foi explicar de que maneira a nova redação da PEC Paralela afetava suas atividades. Foi preciso explicar ponto a ponto as mudanças propostas, inclusive para os departamentos jurídicos de diferentes empresas.
Para Flavia Oliveira, o governo perde mais do que ganha quando sugere retirar a imunidade fiscal das filantrópicas. De acordo com o estudo “A contrapartida do Setor Filantrópico para o Brasil”, publicado pelo Fórum Nacional das Instituições Filantrópicas (Fonif), as entidades beneficentes educacionais retornam para a sociedade 3,66 vezes mais em serviços de qualidade os valores que lhes são concedidos pela imunidade. “O setor aporta, ainda, valores tangíveis (empregos diretos) e intangíveis (conhecimento) para a sociedade”, afirma Flavia.
Pressão das filantrópicas e retirada da PEC
Após uma forte mobilização das entidades filantrópicas, o relator da PEC Paralela, senador Tasso Jereissati, decidiu retirar o fim da imunidade dessas instituições do texto. Por outro lado, Tasso sinalizou que irá tratar das filantrópicas à parte, em um projeto de lei complementar.
Para Mariana, estabelecer uma nova regulamentação via lei complementar traz um novo e grande desafio às entidades do setor e ao nosso escritório, uma vez que sua aprovação é mais simples do que uma PEC. “Além disso, o relator destacou ter identificado no setor educacional indícios de fraudes, o que certamente será endereçado no projeto de lei. Quanto à área da saúde, não está claro qual será o critério: apenas Santas Casas ou a manutenção da atual sistemática”, ressalta a advogada de Relações governamentais.
Juliana Furini complementa que a retirada das filantrópicas da PEC Paralela pode ser interpretada como uma forma de facilitar sua viabilização no congresso ou acelerar a retirada das isenções para determinados setores. “A PEC Paralela ainda tem um trâmite longo e traz outros pontos polêmicos”, afirma.