A evolução do entendimento do Fisco sobre tributação federal de benefícios fiscais de ICMS
A Solução de Consulta Cosit nº 145/2020 reinaugurou controvérsia sobre subvenções para custeio ou investimento
Assuntos
O tratamento tributário das subvenções governamentais para fins de incidência do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) tradicionalmente esteve associado à qualificação do benefício fiscal enquanto subvenção para custeio ou investimento. O Fisco já manifestou seu entendimento sobre o tema em algumas ocasiões, adotando orientações antagônicas ao longo do tempo.
A visão histórica do Fisco sobre o assunto
Inicialmente, por meio do Parecer Normativo nº 112/78 da Coordenação do Sistema de Tributação (CST) da Receita Federal do Brasil (RFB), o Fisco esclareceu que apenas os benefícios fiscais de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) concedidos em contrapartida à aplicação da subvenção “nos investimentos previstos na implantação ou expansão do empreendimento econômico projetado” é que poderiam ser afastados da incidência de IRPJ e CSLL.
Ou seja, para a Fazenda, apenas benefícios fiscais classificados como subvenções de investimentos é que poderiam ser afastados da tributação federal, ao passo em que os benefícios fiscais concedidos sem exigência de contrapartida dos contribuintes (subvenções de custeio) seriam tributados.
A primeira alteração de entendimento do Fisco
Com a publicação da Lei Complementar nº 160/2017, a legislação equiparou os benefícios fiscais de ICMS convalidados perante o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) à categoria das subvenções para investimento.
A equiparação prevista na lei complementar levou a RFB a editar a Solução de Consulta Cosit nº 11, de 04 de março de 2020, pela qual o Fisco alterou seu entendimento em relação à distinção entre os tipos de subvenções expresso no Parecer Normativo nº 112/78/CST.
Nos termos da Solução de Consulta Cosit nº 11/2020, “consideram-se como subvenções para investimento os incentivos e benefícios fiscais ou financeiros-fiscais relativos ao ICMS concedidos por Estados e Distrito Federal”, nada tendo sido dito sobre a finalidade do benefício.
Neste momento, houve a primeira alteração de entendimento do Fisco: por meio da Solução de Consulta Cosit nº 11/2020, a RFB entendeu ser possível o afastamento da tributação federal sobre os benefícios fiscais de ICMS, independentemente de terem sido concedidos com ou sem contrapartida pelo contribuinte.
A segunda alteração de entendimento do Fisco
Contudo, em dezembro de 2020, a RFB editou a Solução de Consulta Cosit nº 145/2020, pela qual retomou seu entendimento de que apenas os benefícios fiscais de ICMS que “tenham sido concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos” é que poderiam ser afastados da tributação federal.
Com a Solução de Consulta Cosit nº 145/2020, o Fisco, em contrariedade ao artigo 30, § 4º, da Lei nº 12.973/14, retomou seu entendimento de que apenas as subvenções para investimento é que poderiam deixar de ser computadas na apuração do lucro real.
Com isso, houve nova alteração de entendimento. Em um intervalo inferior a um ano, o Fisco abandonou a orientação vinculante da Solução de Consulta Cosit nº 11/2020 e voltou a defender a distinção do tratamento tributário de benefício fiscais de ICMS concedidos com ou sem exigência de contrapartida do contribuinte, como previa o Parecer Normativo nº 112/78/CST.
O entendimento manifestado na Solução de Consulta Cosit nº 145/2020 foi reiterado nas Soluções de Consulta Cosit nº 12/2022 e nº 15/2022 e é o posicionamento atual do Fisco.
O recorte temporal da visão do Fisco e seus efeitos ao contribuinte
O art. 33 da Instrução Normativa (IN) nº 2.058/2021 da RFB determina que as soluções de consulta Cosit possuem efeito vinculante no âmbito da RFB e “respaldam o sujeito passivo que as aplicar, ainda que não seja o respectivo consulente”. Portanto, após a publicação da Solução de Consulta Cosit nº 11/2020, o contribuinte passou a possuir a legítima expectativa de que todos os benefícios fiscais de ICMS poderiam ser afastados da tributação federal, ainda que não fossem concedidos mediante contrapartidas.
Ao reformar o entendimento da Solução de Consulta Cosit nº 11/2020, é possível defender que a Solução de Consulta Cosit nº 145/2020 somente poderia surtir efeitos para os fatos geradores ocorridos após sua publicação, para todos os contribuintes e não apenas para o consulente, em homenagem ao princípio da segurança jurídica, da proteção da confiança e ao art. 33 da IN nº 2.058/2021.
Portanto, ainda que venha a prevalecer a visão do Fisco que exige destinação específica dos benefícios fiscais de ICMS para que não estejam sujeitos à tributação pelo IRPJ e CSLL, ao analisar o contexto, tal entendimento apenas poderia surtir efeitos após a publicação da Solução de Consulta Cosit nº 145/2020.
Para mais informações sobre os benefícios fiscais, acompanhe a série especial ‘A tributação federal de benefícios fiscais de ICMS‘.