Agência Nacional de Mineração regulamenta aproveitamento de rejeitos e estéreis
Além de otimizar a gestão ambiental, nova regulação traz mais segurança jurídica para operações envolvendo rejeitos e estéreis no país
Assuntos
A Resolução nº 85, que dispõe sobre o uso de rejeitos e estéreis, foi publicada no Diário Oficial da União, no dia 7 de dezembro de 2021, após aprovação pela Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Mineração (ANM), em 2 de dezembro de 2021. A nova resolução, fruto de um trabalho da ANM de quase dois anos, entra em vigor a partir de 3 de janeiro de 2022.
O principal propósito da resolução foi disciplinar uma atividade que já se tornou realidade em diversas operações mineiras no país e que, em termos práticos, revela maior eficiência em termos de aproveitamento mineral e na gestão ambiental de rejeitos e estéreis. Além disso, os avanços em novas tecnologias e as tendências globais para o setor representaram parâmetros importantes para que a ANM viesse a editar uma resolução sobre a matéria.
Disposições da resolução
A Resolução ANM 85 traz conceitos importantes, notadamente o de estéril (material in natura descartado diretamente na operação de lavra, antes do beneficiamento) e o de rejeito (material descartado durante e/ou após o processo de beneficiamento). O principal fundamento relacionado ao aproveitamento de estéreis e rejeitos estabelecido pela resolução é a premissa de que os mesmos constituem parte integrante da mina na qual foram gerados, mesmo se tiverem sido dispostos fora da área do direito minerário em questão (artigo 2º, que também prevê que essa disposição fora da área do direito minerário deve ser objeto de servidão minerária).
Além disso, o fato de a lavra porventura estar suspensa não afeta esse pressuposto, o que induz à conclusão de que, na vigência de um título de lavra, o aproveitamento de rejeitos estéreis (provenientes daquela mina) não depende da outorga de novo título de lavra (artigo 3º). A par do conceito de direito minerário usualmente empregado pelo setor mineral, a Resolução ANM 85 traz a definição de título autorizativo de lavra, a saber: a concessão de lavra, o registro de licença, a permissão de lavra garimpeira, o registro de extração e até mesmo a guia de utilização (observadas as limitações naturais inerentes a esse instrumento, que não configura um direito minerário autônomo).
Por outro lado, se os rejeitos e estéreis estiverem dispostos em áreas livres ou oneradas por terceiros e sem vinculação a um título de lavra vigente, o aproveitamento dependerá da outorga de novo título (artigo 5º). É interessante observar que as áreas em disponibilidade são consideradas, para fins da resolução, áreas oneradas, o que significa que seu futuro titular, ao obter um título de lavra, poderá realizar o aproveitamento dos rejeitos e estéreis dispostos no local (desde que esses rejeitos e estéreis não estejam vinculados a outro título de lavra em vigor, que é o fundamento da resolução).
Ao vincular o direito de realizar o aproveitamento de rejeitos e estéreis a um título de lavra em vigor, mesmo quando a disposição tiver ocorrido fora da área do direito minerário, a ANM buscou superar as discussões sobre o domínio dos rejeitos e estéreis, bem como sobre as situações envolvendo novos direitos minerários requeridos sobre áreas não oneradas em que haja a disposição de rejeitos e estéreis.
Alterações no Plano de Aproveitamento Econômico e aditamento de substância
Para o aproveitamento de rejeitos e estéreis, podem ser necessários ajustes ao Plano de Aproveitamento Econômico (PAE). Isso porque a Resolução ANM 85 determina expressamente que o PAE deve prever as estruturas que serão necessárias para a disposição desses de rejeitos e estéreis. Assim, se o aproveitamento não estiver contemplado no PAE em vigor, o titular deverá alterá-lo para detalhar as mudanças no processo produtivo ou na escala de produção previstos originalmente, mediante requerimento eletrônico à ANM. Na mesma linha, os relatórios anuais de lavra (RALs) devem trazer os dados sobre os rejeitos e estéreis.
Um aspecto que suscitava dúvidas até a edição da Resolução ANM 85 dizia respeito à possibilidade de aproveitamento de rejeitos e estéreis envolvendo substância distinta da(s) substância(s) objeto do título de lavra. Nesse caso, o titular deverá solicitar o aditamento do título para contemplar a nova substância, observando os elementos técnicos previstos no Anexo II da resolução. Ao assim determinar, eliminam-se incertezas envolvendo a forma tradicional de aditamento de substância mineral, que demandava a apresentação de um relatório de pesquisa da nova substância, o que nem sempre se ajustava às particularidades do aproveitamento de nova substância em rejeitos e estéreis.
Redução da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais
A reforma da legislação de Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), implementada pela Lei 13.540/2017, previa a possibilidade de redução de 50% da alíquota de CFEM no caso de aproveitamento de substâncias minerais associadas em estéreis e rejeitos, e que viessem a ser empregadas em outras cadeias produtivas (artigo 6º, §7º da Lei 7.990/1989, com a redação que lhe foi dada pela Lei 13.540/2017).
De forma a viabilizar tal redução, a Resolução ANM 85 determinou que, ao requerer o aditamento do título de lavra para incluir a nova substância associada, o titular precisa informar a cadeia produtiva a que tal substância se destina (artigo 3º, §4º, inciso IV).
Tal redução da alíquota de CFEM representa um estímulo financeiro ao aproveitamento de rejeitos e estéreis, otimizando assim a produção mineral associada à gestão ambiental.
Licenciamento ambiental
Uma das principais virtudes almejadas pela ANM com a edição da nova resolução são os benefícios ambientais advindos do aproveitamento dos rejeitos e estéreis. Por essa razão, há preocupação específica quanto à adequação da licença ambiental vigente que contemple a operação de aproveitamento de rejeitos e estéreis. Caso necessário, uma nova licença pode ter que ser requerida perante o órgão ambiental competente (Anexo I, item 7, alínea b, e Anexo II, item 5, alínea b).
Barragens de rejeitos
É recorrente a situação em que os rejeitos a serem objeto de aproveitamento tenham sido dispostos em uma barragem de rejeitos. Para esses casos, a solução exige que o interessado no aproveitamento observe a Polínica Nacional de Segurança de Barragens (Lei 12.334/2010) e as normas aplicáveis a barragens de mineração.
Além disso, a documentação técnica a ser apresentada pelo interessado deve trazer os detalhes da barragem em questão, com o volume, a quantidade de material contido, o teor médio, o dano potencial associado (DPA) da estrutura e a categoria de risco (CRI), a fim de que a ANM possa realizar a apreciação global do aproveitamento pretendido.
Avanços com a nova resolução
A possibilidade de realizar o aproveitamento de rejeitos e estéreis já era admitida em na legislação brasileira, mas a edição de uma resolução específica traz maior segurança jurídica quanto à dominialidade dos rejeitos e estéreis, além de esclarecer os conceitos básicos e os procedimentos necessários para o desenvolvimento da atividade. Igualmente importante é o fato de que, por essa resolução, a mineração brasileira apresenta claros sinais de modernização em sua regulação em termos de gestão ambiental e de resíduos, o que é plenamente aderente às preocupações com os pilares ESG que vêm orientando a mineração mundial.
Com a resolução, a ANM busca viabilizar maior acesso e uso de recursos minerais, aliando-os à gestão ambiental, o que acarreta a racionalização do aproveitamento de jazidas minerais, com benefícios ambientais que decorrem do aproveitamento de estéreis e rejeitos.
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