![STF declara inconstitucional lei do Pará sobre exploração de recursos hídricos](https://www.mattosfilho.com.br/wp-content/uploads/2022/02/hands-4903050-1920-1024x681.jpg)
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STF declara inconstitucional lei do Pará sobre exploração de recursos hídricos
Julgamento reflete posicionamentos anteriores sobre taxas de fiscalização considerando o custo-benefício das atividades estatais
Em 24 de fevereiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5374, ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) contra a Lei nº 8.091/2014 do Estado do Pará. A Corte, por unanimidade, seguiu o entendimento do Ministro Luis Roberto Barroso e declarou inconstitucional a Lei.
A Lei Paraense instituiu a Taxa de Controle, Acompanhamento e Fiscalização de Atividades de Exploração e Aproveitamento de Recursos Hídricos (TFRH), fixando em 0,2 da Unidade Padrão Fiscal do Estado do Pará por metro cúbico de recurso hídrico utilizado e, nos casos de utilização para fins de aproveitamento hidroenergético, esse valor foi fixado em 0,5 da Unidade Padrão Fiscal por 1000 m³.
A CNI alegou na inicial da ADI que a Lei Paraense padecia de inconstitucionalidade formal pelo fato de os Estados não possuírem competência para legislar sobre fontes hídricas que não pertencessem ao seu domínio. O Governo do Estado do Pará alegou que a competência concorrente estabelecida pelo art. 23, inc. XI da Constituição Federal (CF) seria limitada ao controle das concessões de exploração de recursos hídricos, de forma que não seria possível ao Estado disciplinar a fiscalização dos próprios recursos.
Ademais, a CNI também suscitou a inconstitucionalidade material da norma, pelo fato de que o critério quantitativo estabelecido não guarda razoável equivalência com o custo da atividade estatal que seria desempenhada como contrapartida.
Em 13 de dezembro de 2018 o Ministro Barroso já havia concedido a medida cautelar para suspender os efeitos da Lei Paraense por entender que o violaria o princípio da capacidade contributiva a instituição de taxa de polícia ambiental que excederia flagrantemente os custos da atividade estatal. Tal medida foi referendada pelo plenário do STF em 26 de junho de 2020, à unanimidade, o que já deu os contornos sobre o julgamento de mérito da questão.
Julgamento do mérito da ADI
Como era esperado, o STF manteve a decisão de referendo e julgou procedente a ADI, mas reafirmou a competência dos estados para instituir referidas taxas, rechaçando a lei paraense apenas no que toca à proporcionalidade dos valores.
No que tange à competência para legislar sobre a matéria, o STF entendeu que, considerando a competência comum entre os entes federativos para proteção do meio ambiente (art. 23, inc. II, VI e VII da CF) e para registro, acompanhamento e fiscalização da exploração de recursos hídricos (Art. 23, inc. XI da CF), assim como a plena possibilidade que o Pará exerça a competência fiscalizadora que lhe é atribuída pela CF, é correto entender que o Estado também possui competência tributária legislativa para a instituição de taxa decorrente do poder de polícia ambiental sobre a exploração dos recursos hídricos (art. 145, inc. II da CF).
Quanto à inconstitucionalidade material da norma, o STF afirmou que é possível a fixação da base de cálculo do tributo com base no volume de recurso hídrico utilizado pelo contribuinte, uma vez que quanto maior o volume utilizado, maior será o impacto social e ambiental do empreendimento e, consequentemente, deverá ocorrer um maior controle e fiscalização por parte do Poder Público.
No entanto, quanto aos índices fixados pelo Estado do Pará, o STF entendeu que haveria violação ao princípio da capacidade contributiva, na dimensão do custo/benefício, “isso porque o valor de grandeza fixado pela lei estadual (1 m³ ou 1000 m³) em conjunto com o volume hídrico utilizado faz com que o tributo exceda desproporcionalmente o custo da atividade estatal de fiscalização” (palavras do Relator, Ministro Luis Roberto Barroso).
Em relação aos efeitos da decisão, é possível a oposição de embargos declaratórios pelo Estado do Pará para que sejam modulados os efeitos da inconstitucionalidade da referida lei, justamente para que o Estado não tenha que ressarcir os contribuintes que realizaram o recolhimento indevido da taxa.
Porém, sobre o deferimento da medida cautelar, o Estado do Pará já havia ingressado com embargos pedindo a modulação de efeitos e, na ocasião, o Ministro Barroso entendeu pela impossibilidade – o que já indica que deverão ser rejeitados embargos com esta finalidade, fazendo com que o Estado tenha que ressarcir os contribuintes que pleitearem a repetição do indébito, ressalvados os casos em que já tenha ocorrido a prescrição.
Discussão não é nova no STF
Em 4 de dezembro de 2019, o STF já havia apreciado a ADI 6211, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, que impugnava a Lei nº 2.388/2018, do Estado do Amapá, a qual criou a TFRH naquele Estado. Na ocasião, a Corte também entendeu que a instituição de taxa destituída de equivalência entre o valor exigido do contribuinte e os custos alusivos ao exercício do poder de polícia viola o princípio da proporcionalidade.
Foi julgada em conjunto com a ADI 5374/PA a ADI 5489/RJ, de relatoria também do Ministro Luis Roberto Barroso. A ADI foi ajuizada pela CNI e questionava a Lei nº 7.184/2015 do Estado do Rio de Janeiro, a qual criou a Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização Ambiental das Atividades de Geração, Transmissão e ou Distribuição de Energia Elétrica decorrente do aproveitamento de potenciais hídricos e térmicos, inclusive nuclear (TFGE). No julgamento, que foi unânime, o STF entendeu que o Estado possui competência para fixar a referida taxa, que pode ter como base de cálculo a energia elétrica gerada, mas, no caso concreto, os parâmetros utilizados pela Lei violaram a capacidade contributiva e a proporcionalidade, razão pela qual foi declarado inconstitucional o ato normativo.
Ademais, ainda pendem de julgamento perante o STF as ADIs 4.785/MG e 4.787/AP, que também questionam a constitucionalidade de leis que instituíram taxas de controle, monitoramento e fiscalização de recursos minerais nos estados de Minas Gerais e Amapá, respectivamente. Nas referidas ações diretas, que têm como autora a Confederação Nacional da Indústria, também se discute a competência do ente federativo, a base de cálculo utilizada para o cálculo (valor é calculado por tonelada de minério extraído) e a proporcionalidade do valor estipulado. Ambas ações foram incluídas em pauta de julgamento para o dia 14 de abril de 2021.
Com o posicionamento que vem sendo adotado pelo STF em todas as ações que discutem a constitucionalidade das taxas de fiscalização, há uma sinalização clara para os entes federativos no sentido de que é possível a instituição da taxa, pois eles são competentes para tanto, e a base de cálculo pode guardar relação com o recurso utilizado (no caso de taxa de fiscalização da atividade de exploração de recursos hídricos) ou com o produto produzido (no caso da energia elétrica). No entanto, os entes devem atentar-se para o custo-benefício, a fim de que o tributo seja proporcional ao custo da atividade estatal de fiscalização.
A instituição de taxa de fiscalização de maneira adequada, isto é, com o tributo respeitando o custo da atividade estatal de fiscalização, pode revelar uma medida extremamente eficiente com vistas ao aprimoramento das políticas públicas relacionadas à gestão dos recursos (hídricos, energéticos ou minerais).
Para mais informações sobre a taxa de fiscalização ambiental, conheça a prática de Ambiental do Mattos Filho
*Com colaboração de Henrique Ribeiro Junqueira Borges.