CFM suspende norma que atualizava regras sobre o uso de canabidiol para fins medicinais
Após críticas à nova resolução, autoridade suspende temporariamente os efeitos da norma e reabre consulta pública para receber sugestões da sociedade
Assuntos
Após decisão tomada em sessão plenária, no dia 25 de outubro de 2022, o Conselho Federal de Medicina (CFM) suspendeu temporariamente os efeitos da recém-publicada Resolução CFM n° 2.324/2022, que atualizava os critérios para prescrição terapêutica de canabidiol (CBD), um dos componentes da Cannabis sativa. A autoridade médica também já havia decidido abrir uma nova consulta pública para receber contribuições sobre o tema. Os interessados em participar terão até 23 de dezembro de 2022 para apresentar suas sugestões através de uma plataforma eletrônica do CFM.
A norma suspensa foi publicada em 14 de outubro de 2022 e revogava integralmente a Resolução CFM n° 2.113/2014, restringindo as possibilidades de uso do componente, permitindo ao médico a prescrição de CBD apenas para tratamento de epilepsias refratárias às terapias convencionais em pacientes crianças e adolescentes com Síndrome de Dravet, Síndrome de Lennox Gastaut e Complexo de Esclerose Tuberosa. A única exceção prevista para outras indicações terapêuticas passa a ser no âmbito de estudos clínicos autorizados pelo Sistema CEP/CONEP. Até então, o uso compassivo de CDB era autorizado de forma mais ampla para especialidades de neurologia, neurocirurgia e psiquiatria.
A nova resolução manteve a proibição para prescrição da cannabis in natura, bem como quaisquer outros derivados da planta, reforçando que aspectos técnicos destes produtos, como grau de pureza e forma de apresentação, estarão sujeitos à análise e aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Outra alteração diz respeito à vedação expressa aos(às) médicos(as) para realização de palestras e cursos sobre uso do canabidiol e/ou produtos derivados de Cannabis fora do ambiente científico – ou seja, fora de congresso nacional realizado por sociedade de especialidade vinculada à Associação Médica Brasileira (AMB). Também, permanece proibida a divulgação publicitária desses produtos, em linha com as regras de publicidade instituídas pela Anvisa através da RDC ANVISA n° 327/2019, que dispõe sobre os procedimentos para a concessão da Autorização Sanitária para a fabricação, importação, comercialização, prescrição, dispensação, monitoramento e fiscalização de produtos de Cannabis para fins medicinais.
Além disso, a nova resolução reforça que os(as) pacientes submetidos(as) ao tratamento com CBD devem ser esclarecidos sobre todos os riscos e benefícios associados ao tratamento a partir da assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) específico.
A norma deixa de exigir o cadastro específico no Sistema CRM/CFM de pacientes submetidos ao tratamento com canabidiol e dos médicos prescritores. Por fim, está previsto um prazo de 3 anos (ou seja, outubro de 2025) para revisão da Resolução CFM n° 2.324/2022 a partir da literatura científica disponível.
Discussões acerca do tema
Após a edição da Resolução CFM n° 2.324/2022, o Ministério Público Federal (MPF), instaurou um Procedimento Preparatório (PP) com o objetivo de averiguar a compatibilidade da normativa com o direito fundamental à saúde assegurado pela Constituição Federal, considerando a potencial restrição para uso terapêutico do canabidiol. No âmbito legislativo, o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) n° 359/2022 e PDL n° 361/2022 foram iniciados com a finalidade de retirar os efeitos da nova resolução publicada pelo CFM.
No âmbito da Anvisa, a RDC ANVISA n° 327/2019 disciplina os procedimentos para importação, comercialização, monitoramento, fiscalização, prescrição e dispensação de produtos industrializados contendo como ativos derivados vegetais ou fitofármacos da Cannabis sativa, denominados produtos de Cannabis para fins medicinais. De forma mais ampla, a normativa destaca que os produtos de Cannabis devem ser prescritos exclusivamente por profissionais médicos devidamente registrados no CFM e nas hipóteses em que estiverem esgotadas outras opções terapêuticas disponíveis no mercado brasileiro. Desde o início da vigência da RDC ANVISA nº 327/2019, foram regularizados cerca de 18 produtos de Cannabis perante a agência, sendo oito à base de extratos de Cannabis sativa e dez do fitofármaco canabidiol. Esta regulação também se encontra em fase de revisão por parte da Anvisa, e espera-se que uma nova proposta de texto normativo seja publicada para consulta pública e comentários pela sociedade em geral.
Além dessa normativa, desde 2015, a Anvisa possui um regramento específico que dispõe sobre os critérios e os procedimentos para a importação de produtos derivados de Cannabis, por pessoa física, para uso próprio e com fim terapêutico, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado (atual RDC ANVISA n° 660/2022).
Para saber mais sobre o tema, conheça a prática de Life Sciences e Saúde do Mattos Filho.