

Metaverso e música: oportunidades e desafios para a execução pública
Com avanço das tecnologias disruptivas e o crescimento das performances no metaverso, surgem grandes oportunidades para a indústria musical, mas também desafios jurídicos
O MTV Video Music Awards (VMA), uma das maiores premiações de música que reconhece os melhores videoclipes do ano, ocorreu em agosto de 2022. O evento, que foi criado em 1984, trouxe uma novidade neste ano: a criação da categoria “Melhor Performance no Metaverso”. A categoria específica surge em um contexto de expansão de curiosidade e interesse coletivo sobre as novas formas de apresentações musicais em diferentes plataformas de metaversos.
Nos últimos anos, diversos artistas passaram a investir em shows e performances em metaversos. Chama atenção no crescimento dessas performances e representações o alcance das transmissões, em especial após a pandemia de Covid-19, que acelerou o processo de digitalização da indústria do entretenimento. O grupo musical BLACKPINK, por exemplo, alcançou um público superior a 10 milhões de espectadores, os quais acompanharam na plataforma Pubg Mobile a performance de lançamento da música “Ready for love“, vencedora da nova categoria do VMA.
Por sua vez, o rapper Travis Scott realizou, em 2020, uma performance na plataforma Fortnite que foi acompanhada por 28 milhões de avatares virtuais. Logo após o concerto, o rapper teve um crescimento de 1,8 milhões de seguidores em suas redes sociais e diversos produtos licenciados com a imagem do cantor foram desenvolvidos.
A gamificação de experiências musicais pode ajudar na democratização do acesso a performances artísticas e a expandir o alcance de artistas iniciantes e consolidados, seja pela redução do valor cobrado para acesso ao conteúdo ou pela inexistência de barreiras físicas que usualmente impedem que ouvintes compareçam a determinados concertos.
A indústria da música também tem crescentes possibilidades pautadas na criação de NFTs (non fungible tokens). Concertos, performances, capas de álbuns e mesmo entrevistas exclusivas podem ser eternizados por meios de tokens digitais criptografados, que funcionam como itens colecionáveis e que aproximam fãs de seus ídolos. Os artistas têm também a possibilidade de lançar suas próprias moedas e tokens, o que pode auxiliar no financiamento de shows e garantir comunicação direta com seu público.
Novos desafios jurídicos
Além de oferecer diversas oportunidades criativas e econômicas, o metaverso tende a causar mudanças no modelo de negócio do mercado musical, obrigando players do mercado a redescobrir seus papéis em negociações virtuais. Nesse sentido, se o surgimento do streaming nos anos 2000 alterou a lógica da indústria musical e o conceito de execução pública – definido no artigo 68, parágrafo 2º, da Lei nº 9.610/1998, a Lei de Direitos Autorais Brasileira (LDA), como “a utilização de composições musicais ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de freqüência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica” –, as plataformas de metaversos provocarão mudanças similares, já que a veiculação de músicas em ambientes descentralizados gera grandes desafios para a arrecadação de direitos autorais e conexos de artistas.
A virtualização de situações rotineiras do mundo físico se desdobra não apenas a execução de músicas em concertos virtuais, mas também streams, criações e compartilhamentos de conteúdos musicais entre usuários. Assim, diversos artistas passam a contar com mais uma fonte de receita, já que o ambiente virtual não isenta seus usuários e respectivas plataformas da observância às normas de direitos autorais e o dever de remunerar os autores ou titulares de direitos autorais e conexos.
Soluções já conhecidas, mas adaptadas
Considerando a contemporaneidade do tema e a ausência de dispositivos legais que sejam capazes de suficientemente regular questões relacionadas a direitos autorais no metaverso, a celebração de instrumentos contratuais que formalizem as negociações musicais é a medida mais segura e recomendável atualmente.
Questões como a determinação da jurisdição competente para dirimir conflitos transfronteiriços envolvendo direitos autorais, o recolhimento de royalties pela execução de músicas em plataformas e os limites de responsabilização de plataforma frente a conteúdos carregados por usuários devem ser endereçadas por meio de termos de serviço ou contratos de licenciamento e cessão de direitos com cláusulas adaptadas ao contexto virtual e descentralizado.
Apesar das incertezas, a inovação em tecnologias e serviços na Web 3.0 também será acompanhada pela inovação em torno dos modelos de licenciamento e arrecadação de royalties musicais. Enquanto isso, resguardar-se contratualmente, como hoje fazem os atores da indústria musical, é a melhor forma de evitar conflitos. Caso tais contratos sejam executados na blockchain, pode-se garantir mais segurança e agilidade nas transações, já que smart contracts possibilitam que direitos autorais e conexos sejam rapidamente recolhidos e até mesmo distribuídos para os respectivos titulares.
Para mais informações, acompanhe a série especial Propriedade Intelectual e Metaverso.
*Com a colaboração de Lorena de Freitas Pereira.