Incra regulamenta anuência para projetos em áreas de assentamento
Medida traz maior segurança e previsibilidade para o desenvolvimento de projetos de mineração, energia e infraestrutura
Assuntos
Foi publicada no Diário Oficial da União, no dia 22 de dezembro de 2021, a Instrução Normativa nº 112, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que trata sobre os procedimentos para anuência quanto ao uso de áreas em projetos de assentamento do instituto, para o desenvolvimento de atividades ou empreendimentos minerários, de energia e de infraestrutura. A instrução normativa entrará em vigor no dia 3 de janeiro de 2022.
Procedimento para anuência
A instrução normativa estabelece que, no caso de exploração minerária, incluindo pesquisa e lavra mineral, será exigida a anuência do Incra.
Os requerimentos de anuência devem ser protocolados na unidade regional responsável pelo projeto de assentamento, acompanhados por uma série de documentos, incluindo:
- O plano ou projeto das atividades pretendidas e sua área de influência no projeto de assentamento;
- Justificativa para a utilização do terreno considerando a atividade a realizar;
- Planta e memorial descritivo da área;
- Matriz de impactos do empreendimento ou atividade pretendida no projeto de assentamento, juntamente com obrigações a serem assumidas pela empresa.
Dependendo do projeto e sempre que necessário, devem também ser fornecidos documentos ambientais, tais como:
- Cópia da licença ambiental;
- Relatórios e planos de controle ambiental (RCA e PCA);
- Plano de recuperação de áreas degradadas (PRAD);
- Avaliação dos riscos aprovada pelo órgão ambiental licenciador.
Se a utilização da área envolver a construção e operação de uma barragem de rejeitos, o plano de segurança da barragem também deve ser apresentado.
Além disso, para os casos em que o uso de áreas do projeto de assentamento supere 2.500 hectares, também será necessária prévia aprovação do Congresso Nacional.
É interessante observar a previsão de que a documentação a ser apresentada pela empresa ao Incra não deve exceder os documentos exigidos pela autoridade ambiental no âmbito do processo de licenciamento, tampouco a documentação exigida pela Agência Nacional de Mineração (ANM), para os fins de obtenção da outorga da autorização de pesquisa ou concessão de lavra. Ao assim estabelecer, aparentemente a instrução tenta evitar uma “duplicação” do processo de licenciamento.
Na revisão do requerimento de anuência, o Incra deverá considerar, entre outros aspectos, a possibilidade de coexistência do projeto e do programa de assentamento, assim como a existência de alternativas de localização e dimensão da área pretendida para uso pelo empreendimento ou atividade minerária.
Contrapartidas pelo uso da terra
A instrução normativa estabeleceu, como condicionantes ao uso da área, que o empreendedor pode ser obrigado ao pagamento de:
- Contraprestação ao Incra pela utilização do terreno;
- Indenização pelos danos e prejuízos causados ao Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA), e aos assentados, individual ou coletivamente;
- Participação nos resultados da lavra, na forma da lei, a ser paga ao Incra.
Além disso, outras medidas que o empreendedor pode ser obrigado a implementar são, por exemplo:
- Reassentamento ou realocação das famílias afetadas;
- Implantação, melhoria ou manutenção de infraestrutura em favor do projeto de assentamento;
- Indenização por lucros cessantes dos assentados;
- Melhoria da atividade produtiva dos assentados;
- Viabilização de assistência técnica aos assentados;
- Construção de infraestrutura ou disponibilização de equipamentos que contribuam para o desenvolvimento sustentável dos projetos de assentamento;
- Apoio na regularização ambiental da área do projeto de assentamento e do seu entorno;
- Apoio ao Incra para atividades de monitoramento e fiscalização de todas as etapas do processo de execução das medidas contidas no instrumento de anuência.
Questões ambientais e sociais
A instrução normativa prevê, também, que as atividades empreendidas nos assentamentos fundiários devem respeitar não só as práticas de preservação ambiental e de utilização sustentável, mas também as obrigações assumidas no âmbito do processo de licenciamento ambiental, sempre observando o caráter social, cultural e o desenvolvimento econômico regional e os direitos dos assentados do PNRA.
Ademais, a realização de atividades só será permitida pelo Incra caso esteja em conformidade com os planos e projetos aprovados pelas autoridades competentes. À vista disso, para além da audiência pública que porventura seja realizada no processo de licenciamento ambiental, poderá ser necessária uma reunião para esclarecimentos gerais com os ocupantes do terreno em questão sobre o empreendimento.
Formalização
A anuência de uso da área de assentamento poderá ser formalizada pelo Incra por meio de uma escritura pública de servidão ou de contrato de concessão de uso onerosa. Para tanto, a própria instrução normativa apresentou os modelos de tais documentos como anexos, de uso obrigatório, de modo a facilitar a sua formalização.
Competência para a emissão da anuência
Uma vez analisado o requerimento de anuência e concluída a sua instrução, o superintendente regional do Incra consultará o Comitê de Decisão Regional (CDR) e emitirá sua manifestação conclusiva, a ser encaminhada e revista pela Diretoria de Desenvolvimento e Consolidação de Projetos de Assentamento. Na sequência, o presidente do Incra, autorizado pelo Conselho Diretor, emitirá a decisão sobre o pedido, cabendo-lhe, também, firmar os instrumentos que sejam necessários para implementação da decisão. Como se vê, o trâmite interno do pedido de anuência envolve diversos órgãos do Incra, havendo, portanto, certo receio de que a análise não ocorra de forma tão dinâmica como o esperado.
Nos casos de indeferimento do pedido de anuência, o requerente terá a possibilidade de apresentar pedido de reconsideração em até 30 dias. A decisão quanto ao pedido caberá ao Conselho Diretor, após análise técnica prévia da Diretoria de Desenvolvimento e Consolidação de Projetos de Assentamento e manifestação jurídica da Procuradoria Federal Especializada.
Implicações da nova regulamentação
Conforme mencionado acima, a Instrução Normativa nº 112 do Incra entrará em vigor no dia 3 de janeiro de 2022, podendo ser aplicada a situações envolvendo a necessidade de anuência, ou seja, tanto aos pedidos que já se encontrem em análise, quanto aos projetos que estejam em curso, mas pendentes de solicitação de anuência.
Com a regulamentação do assunto, que carecia de regramento específico até então, o Incra propicia maior segurança aos assentados e empresas, tendo em vista que muitos empreendimentos minerários, devido à sua rigidez locacional, podem depender necessariamente do uso de áreas dedicadas a assentamentos rurais.
Por outro lado, a instrução normativa parece ter sido concebida para empreendimentos em estágios mais avançados, ao passo que proporciona o mesmo tratamento aos projetos de infraestrutura, energia e mineração. Neste último caso, não parece considerar as particularidades e a baixa intervenção dos trabalhos de pesquisa mineral. Resta, portanto, avaliar como o Incra tratará dos projetos de pesquisa mineral, em estágios ainda iniciais e sem grande intervenção permanente na área.
Para mais informações sobre o tema, conheça a prática de Infraestrutura e Energia do Mattos Filho.
*Com a colaboração de Wellington de Carvalho.