O novo marco da securitização: letras de risco de seguro
Inovação ao mercado de seguros permitirá novas formas de transferência de riscos e obtenção de capacidade
Foi publicada, em 16 de março de 2022, a Medida Provisória (MP) nº 1.103, de 15 de março de 2022, que cria as Letras de Risco de Seguro (LRSs) a serem emitidas por Sociedades Seguradoras de Propósito Específico (SSPEs) para financiamento e transferência de riscos de seguros e resseguros a investidores do mercado de capitais.
A MP traz relevante inovação ao mercado de seguros e de resseguros brasileiro ao criar o marco legal de um título de crédito nominativo, transferível e de livre negociação, representativo de promessa de pagamento em dinheiro, vinculado especificamente a riscos de seguros e resseguros, após a criação infralegal dos Instrumentos Ligados a Seguro (ILS) pela Resolução CNSP nº 396, de 11 de dezembro de 2020.
Os títulos de crédito vinculados a riscos de seguros e resseguros já movimentam bilhões no mercado internacional e permitirão que parcelas desses recursos possam ser direcionadas ao Brasil, gerando mais capacidade para o mercado de (res)seguro nacional.
SSPEs
As SSPEs são as sociedades seguradoras com finalidade exclusiva de realizar operações de aceitação de riscos de seguros, previdência complementar, saúde suplementar, resseguro e retrocessão, originadas por contrapartes do mercado de (res)seguros, mediante emissão de LRSs para financiar referidas operações no âmbito do mercado de capitais.
Os recursos captados pelas SSPEs, em conjunto com o prêmio recebido, deverão corresponder, no mínimo, ao valor total da perda máxima possível dos riscos de seguros e resseguros vinculados às LRSs, incluindo outras despesas das SSPEs, devendo tais ativos ser utilizados exclusivamente para a cobertura desses riscos.
Entre as contrapartes que poderão ceder riscos às SSPEs, estão seguradoras, resseguradoras, entidades de previdência complementar, operadoras de saúde suplementar, entre outras, podendo inclusive estar sediadas fora do Brasil.
De acordo com a MP, as SSPEs não responderão diretamente perante o segurado, participante, beneficiário ou assistido quando tais contrapartes forem sociedade seguradora, resseguradora, entidade de previdência complementar ou operadora de saúde suplementar. As contrapartes permanecerão como únicas responsáveis pela indenização ou cobertura cabível, salvo quando houver insolvência, decretação de liquidação ou de falência, hipóteses em que a indenização poderá ser paga diretamente pelas SSPEs ao segurado, participante, beneficiário ou assistido, desde que o pagamento de referido montante já não tenha sido realizado pela ou para a contraparte.
LRSs
Emitidas por SSPEs, as LRSs são títulos de crédito nominativos, transferíveis e de livre negociação, representativos de promessa de pagamento em dinheiro, vinculados a riscos de seguro e resseguro. Assim como debêntures e notas promissórias, são consideradas títulos executivos extrajudiciais.
As obrigações representadas pelas LRSs se tornarão extintas pela inexistência de riscos a decorrer, sinistros a pagar e recursos a serem devolvidos aos seus titulares.
Os contratos de transferência de risco da contraparte para a SSPE, assim como as LRSs deverão garantir que a transferência de risco seja efetiva em todas as circunstâncias. Nesse contexto, os direitos dos investidores titulares das LRSs estarão subordinados às obrigações decorrentes do contrato de cessão de riscos à SSPE.
Independência patrimonial
Cada operação de aceitação de riscos de seguros e resseguros e consequente financiamento por LRS terá independência patrimonial em relação às demais operações efetuadas pela mesma SSPE e à própria SSPE.
Dessa forma, o patrimônio de cada operação, que incluirá a parcela do prêmio repassado pela contraparte e não destinado à remuneração da SSPE, não poderá ser utilizado para o pagamento de obrigações relativas a outras operações da SSPE e deve ser destinado exclusivamente à liquidação das LRSs a que estiver afetado e ao pagamento de sinistros, custos de administração e obrigações fiscais.
Regulamentação
Embora tenha havido a publicação da MP, que já está em vigor, ainda há providências futuras para viabilizar, em caráter definitivo, o financiamento e a transferência de riscos de seguros por meio das LRSs, entre elas, a edição de normas pelo CNSP e pela Susep, bem como pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), no que tange a esta última, relativamente à distribuição pública e oferta das LRSs.
Impactos da publicação da MP
A publicação da MP é extremamente positiva para os mercados de seguros e de capitais, já que a emissão das LRSs viabiliza alternativas de transferência e pulverização de riscos no mercado de seguros, resseguros, previdência privada e saúde.
Para os investidores, esse tipo de investimento diferenciado poderá ser uma alternativa com risco-retorno atraente, considerando-se que os riscos subjacentes não são diretamente correlacionados a variáveis macroeconômicas.
O novo instrumento aproximará ainda mais os mercados de seguros e de capitais e permitirá uma atuação conjunta dos respectivos reguladores, o que colocará o Brasil, no que tange a esse aspecto, no mesmo patamar dos mercados internacionais mais modernos.
Para mais informações sobre o tema, conheça as práticas de Financiamento e Dívida e Seguros, Resseguros e Previdência privada do Mattos Filho.