Por Adriana Mattos | Valor
SÃO PAULO – A relação entre os controladores da General Shopping e a israelense Gazit-Globe azedou após desentendimentos em relação ao Internacional Shopping Guarulhos, um dos maiores centros comerciais da região metropolitana de São Paulo. A Gazit abriu processo contra empresas da família Veronezi, dona da General Shopping, por desrespeito à cláusula do acordo de compra e venda do shopping, avaliado em R$ 1,3 bilhão.
As discordâncias foram parar na assembleia de condôminos do shopping, em 17 de maio, com as duas partes divergindo sobre investimentos programados para o empreendimento. O Internacional é considerado a joia da coroa da General Shopping e de seus controladores, a família Veronezi, natural de Guarulhos.
Segundo acordo anunciado no fim de 2017, a Gazit pagou R$ 937 milhões por 70% dos 90% de participação que a General Shopping tinha no Internacional Guarulhos. Foi a maior transação do setor no ano passado. O acordo previa que a Gazit teria preferência para comprar mais 10,1% do empreendimento até 31 de dezembro deste ano. A Gazit alega que a General Shopping desrespeitou essa preferência, tendo negociado parte desse percentual sem que ela tivesse sido comunicada.
De acordo com o processo, ajuizado no fim de maio na 4 Vara Cível do Forum de Guarulhos, o grupo israelense alega que a Levian Participações, controlada direta da General, vendeu para a Nessun Dorma Empreendimentos, outra empresa da família, 0,3% do Internacional Guarulhos por R$ 4,5 milhões.
A Nessun Dorma, segundo cadastro nacional das empresas, é sócia da Poli Shopping Center Administradora — esta controlada pela própria Levian.
A Gazit alega que deveria ter exercido o seu direito de preferência na compra dos 0,3%, como determinado no contrato de 2017.
Já a General, presidida por Alessandro Veronezi, diz que o direito foi respeitado, e que uma notificação questionando o interesse na fatia foi encaminhada à Gazit no início de abril.
Os israelenses negam o recebimento do documento e dizem que tomaram conhecimento da venda da participação em maio, quando a Nessun Dorma comunicou a Gazit que era a nova sócia.
“Diante do decurso do prazo de 30 dias do recebimento da notificação, sem manifestação [da Gazit] operou-se a renúncia tácita à aquisição da nova fração”, informa a Justiça, ao resumir a posição da defesa da General no processo.
A Gazit é representada pelo advogado Eduardo Damião Gonçalves, sócio do escritório Mattos Filho. Já a Levian, por Carlos Albuquerque Braga, do Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados. Os escritórios e as empresas não se pronunciaram.
Na prática, a questão não está em torno da fatia de 0,3%, pouco relevante considerando que a Gazit já controla o imóvel. O Valor apurou que os israelenses temem que a General se negue a vender a posição restante em que cabe o direito de compra. E alegue que parte da fatia já foi vendida sem interesse do sócio, diz uma fonte próxima ao caso. Se isso ocorresse, a General poderia buscar outro comprador para a participação.
Quando vendeu os 70%, a maior parte dos R$ 937 milhões foi usada pela General para pagar uma dívida com o Banco Itaú, apurou o Valor.
A pedido da Gazit, a juíza da 4 Vara Civil, Beatriz Cabezas, decidiu bloquear parcialmente as matrículas do shopping. Segundo fonte, a empresa quer impedir eventuais negociações de novas fatias.
O Valor apurou que os sócios também têm discordâncias sobre investimentos no Internacional Guarulhos. E essas divergências também foram parar na Justiça.
Em assembleia de condôminos em 17 de maio — portanto, quando já considerava processar a General — a Gazit votou de forma favorável à realização de investimentos de R$ 1,2 milhão no shopping. Na ata da assembleia, a empresa menciona o risco de “consequências desastrosas ao condomíno”, com “risco iminente de eventos de segurança” caso o valor não fosse aplicado.
A General, por meio da Levian, e seu outro sócio no empreendimento, o fundo IRB, votaram contra, em razão da necessidade de “avaliar melhor os itens”, segundo a ata. Decidiu-se reduzir os gastos e fazer um investimento inicial de R$ 670 mil, que foi aprovado por maioria. A Gazit só conseguiu a aprovação porque, pelo estatuto, para valores abaixo de R$ 750 mil, a votação é por maioria. Com 70% das ações, o grupo israelense acabou definindo a votação.
Na mesma reunião, a Gazit tentou votar a saída da empresa que administra o estacionamento do shopping. “A atual administradora não representa os melhores interesses do condomínio”, diz na ata a Gazit. Não houve acordo e o assunto foi retirado da pauta.
A questão é que, após a assembleia, a General, por meio da Levian, entrou, em maio, com pedido de liminar para invalidar as decisões da reunião. O processo está na mesma 4 Vara Civil do Forum de Guarulhos. A General fala em “irregularidades” na assembleia, e diz que desde que vendeu os 70% à Gazit, a companhia passou a agir de forma “unilateral e intransigente”.
Afirma, por exemplo, que os investimentos foram propostos em uma apresentação “rasa e insuficiente”. A Gazit nega as acusações. A liminar não foi concedida.
A General Shopping enfrenta fase difícil, pressionada por uma alavancagem financeira, decorrente da escalada do dólar, que não tem efeito caixa, mas tem efeito contábil. A General é a empresa aberta de shopping mais endividada em dólar no país, com efeito negativo sobre os números. De janeiro a junho, o prejuízo cresceu 320%, para R$ 288 milhões.