Negócio Jurídico Processual
Cassio Gama Amaral
Os artigos 190 e 191 do Novo Código de Processo Civil disciplinam o chamado negócio jurídico processual, ou seja, o acordo de vontades
celebrado entre pessoas capazes, antes ou depois de instaurado o processo judicial, com o objetivo de modificar as regras procedimentais
dispostas em lei e de convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, desde que os direitos em disputa admitam
autocomposição.
Ao juiz caberá, apenas, controlar a validade de tais convenções, recusandolhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva
em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.
Além disso, instaurado o processo, poderão as partes, em conjunto com o juiz, fixar um calendário próprio para a prática de atos processuais, o qual
só poderá ser modificado em casos excepcionais, devidamente justificados, dispensandose a intimação das partes para a prática de ato processual
ou a realização de audiência cujas datas tiverem sido designadas em tal calendário.
Desde que não ofenda regras de ordem pública, tais como os princípios do contraditório e da ampla defesa, as partes poderão modificar, prescindir
ou criar ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, amoldando a relação processual às especificidades do conflito instaurado e/ou do
negócio entabulado. Nesse sentido, elas poderão dispor, por exemplo, sobre pacto de impenhorabilidade, acordo para ampliação ou redução de
prazos, rateio de despesas, dispensa de assistente técnico, renúncia a recursos ou ao seu efeito suspensivo, acordo para não promover execução
provisória, julgamento antecipado da lide convencional, delimitação de provas, etc.
Por tudo isso, o negócio jurídico processual será um importante instrumento para se imprimir maior celeridade aos processos judiciais, bem como
para obtenção de decisões mais técnicas, coerentes, previsíveis e socialmente aceitas.
No que tange aos contratos de seguro e às respectivas demandas judiciais, a aplicação do instituto será de enorme valia, embora seja necessário
redobrar a atenção na construção das convenções, tendo em vista que o contrato de seguro é de adesão e, quando existente relação de consumo, o
proponente/segurado pode eventualmente ser considerado vulnerável.
Nesse sentido, poderão as partes do contrato de seguro, além das hipóteses citadas acima e de uma infinidade de outras, por exemplo, (i) estipular
que o laudo ou parecer do perito ou advogado que regulou o sinistro seja obrigatoriamente considerado pelo juiz da causa como prova pericial,
renunciando, ainda, ao direito de nomear assistentes; (ii) dispor sobre a renúncia ao direito do segurado de denunciar a seguradora da lide,
especialmente nas demandas de responsabilidade civil ou, de outra forma, indicar a seguradora como litisconsorte necessário; (iii) fixar regra de
impenhorabilidade das reservas das seguradoras ou de ativos importantes de tomadores ou terceiros envolvidos no contrato de seguro; (iv) fixar, no
contrato de contragarantia, procedimento objetivo, eficiente e célere para substituição ou reforço de garantias.
Espera-se, assim, que o negócio jurídico processual possa contribuir, de um lado, para reduzir a litigiosidade das relações securitárias e, de outro,
para inspirar maior confiança no jurisdicionado acerca da atuação do judiciário nas demandas envolvendo (re)seguros, estimulando, pois, a
melhoria do ambiente de negócios.